Capítulo 48. Bóris, o Cão de Pastoreio

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Que força pôde adstrita e embriões informes, Tua garganta estúpida arrancar Do segredo da célula ovular Para latir nas solidões enormes?

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Que força pôde adstrita e embriões informes,
Tua garganta estúpida arrancar
Do segredo da célula ovular
Para latir nas solidões enormes?

Esta obnóxia inconsciência, em que tu dormes,
Suficientíssima é, para provar
A incógnita alma, avoenga e elementar
Dos teus antepassados vemiformes.

Cão! - Alma do inferior rapsodo errante!
Resigna-a, ampara-a, arrima-a, afaga-a, acode-a
A escala dos latidos ancestrais...
E irás assim, pelos séculos adiante,
Latindo a esquisitíssima prosódia
Da angústia hereditária dos teus pais!

Augusto dos Anjos - Versos á um cão

Quando Brigitte morreu, Bóris também queria morrer.

Ele estava tocando aquele violino com tanto fervor e adoração na demonstração de sua raiva e indignação, o barulho das notas ricocheteando a parede e engolindo-o no caos.

Aquela pequena figura ruiva com lágrimas nos olhos azuis estava esfregando o arco da rabeca contra as cordas como se pudesse cortá-las, dançando sobre as asas coloridas das borboletas mergulhadas na bagunça de cacos de vidro e sangue dos pés cortados de Bóris.

Haviam dois motivos para ninguém se atrever a entrar naquele quarto. Todos estavam com medo do pequeno e belo príncipe Alexandrovich brandindo sua rabeca como uma arma e mostrando seus dentes para afastar os criados, e também tinham medo do Czar por ordenar mais cedo que ninguém deveria interromper o luto de Bóris, nem mesmo para lhe levar comida ou remédios.

- Deixem que ele implore por comida. - Disse o Czar naquela manhã.

Na verdade, os criados estavam mesmo com muito mais medo de Bóris do que de seu pai. Um pânico absoluto que lhes arrepiava a espinha, um pavor de tamanho incalculável que fazia todos se perguntarem o motivo daquele sentimento.

Era ridículo temer uma criança tão pequena, e Bóris queria isso, ele gostava do medo que estavam sentindo e de ser deixado sozinho por aqueles dois dias, vomitando toda sua angústia pelos dedos.

Mas havia alguém novo naquele palácio que não conhecia nada do lugar, não tinha medo de Bóris e, temendo que aquele menino morresse de fome porque todos se recusavam a entrar naquele cômodo quebrado e barulhento, sob o olhar covarde dos criados, levou-lhe uma bandeja de sopa verde fumegante composta de lentilhas e gengibre.

O assistente do novo cozinheiro era um menino engraçado quando se olhava para ele apenas por alguns segundos. Depois se percebia apenas uma face cansada ao observar por mais tempo seu rosto branco e corpo alto entrando no quarto segurando a bandeja com a mão direita, e nos dedos da outra mão com um pano, levava a alça quente de uma grande vasilha de prata.

Bóris parou de emitir aquela aura cruel quando percebeu as recentes cicatrizes escuras e rosadas na metade do rosto, pescoço e braço direito queimados de forma tão cruel daquele empregado. Havia uma faixa branca cobrindo seus olhos e parte de seu nariz por conta dos ferimentos dolorosos e feios.

O Vampiro e o Romani - Livro O1  {CONCLUÍDO}Onde histórias criam vida. Descubra agora