“Se no momento em que fôsse esmagar uma formiga, ela unisse suas duas miseráveis patinhas numa prece a mim dirigida, eu me mostraria bondoso com ela. Por que então não há de Deus mostrar-se bondoso comigo?”
OS MISERÁVEIS, DE Victor Hugo
A noite estava estrelada.Havíamos passado cinco dias em Paris, e desde então nenhum inconveniente havia acontecido conosco, apenas algumas pessoas que nos olhavam de forma desprezível, mas provavelmente porque, de alguma forma, haviam descoberto sobre nós.
Eu andava nas ruas, meus sapatos grudando ao chão pela quantidade de lama e esterco, e o fedor de urina era demasiado forte, tanto que me fazia ter dificuldade de continuar seguindo a mulher que me serviria de alimento.
Ela parecia perceber, entrava em vielas e andava em ziguezagues, seu coração palpitava e podia sentir o suor escorrendo de seus poros.Cansei de segui-la, corri até seu corpo delgado e segurei seu braço, prensando-a contra uma parede de tijolos, em um lugar escuro demais para que ela enxergasse meu rosto. Acredito que apenas as luzes de meus olhos eram visíveis.
— Não grite. – Falei. Os feromônios faziam efeito. – O que você fez de tão terrível para correr até aqui?
Passei os polegares até sua testa. Pude ver claramente dentro de sua cabeça, há cinco horas, quando havia embebedado um bolo de milho com cianeto durante sua preparação, oferecendo gordas fatias para seus filhos e marido. Agora jaziam as crianças mortas em suas camas, como se estivessem dormindo como anjos trigêmeos, seu marido sentado à mesa, descansava sua cabeça com os olhos abertos inertes, como se ainda esperasse sua esposa voltar de uma compra na feira.— Ora, assassinou toda sua família. – Concluí. Ela chorava copiosamente. – Que pecado digno de morte, mulher.
— Eles não mereciam este futuro nojento que nos tomou com tamanha crueldade! Você sabe que as pessoas se tornaram diabos, nestes tempos de calamidade, são mais cruéis do que coisas como você. As mulheres e crianças estão sendo estupradas, homens estão morrendo aos milhares. Não me julgue antecipadamente.
— Não pretendo julgá-la. – Respondi. Escutei o barulho de seus pulmões implorando por ar. – O seu tempo está chegando. Logo você irá ser julgada no purgatório divino, não é? Também comeu o bolo envenenado.
— Por que então me escolheu? Não está fazendo o seu julgamento particular baseado em seus princípios? – Começou a abaixar, perdendo a força dos músculos e ossos.
— Isso não é um julgamento, apenas não me resta escolha nenhuma além de você. – Coloquei seus cabelos lisos para trás da orelha. – Mas não se preocupe você ainda terá chances de ser julgada e levada para o paraíso. Finalmente poderá conhecer o seu Deus.
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O Vampiro e o Romani - Livro O1 {CONCLUÍDO}
VampirOrfeo é um vampiro solitário, vaga pela terra há quase dois mil anos apenas com os próprios demônios, quando como em uma luz no fim do túnel, acaba conhecendo um humano enfermo á beira da morte. Sucumbido pelo egoísmo e pela dor de perder sua única...