Capítulo 17. A Árvore envenenada

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"Eu estava com raiva de meu amigo;
pus fora minha raiva, minha raiva se perdeu.
Eu estava com raiva de meu inimigo;
não falei nada, minha raiva cresceu.

E a agüei com medos,
noite e dia com meu pranto;
e a iluminei com sorrisos,
e com suave e astuto encanto.

E ela cresceu dia e noite,
até que uma vistosa maça nasceu
e meu inimigo viu seu brilho,
e soube que o dono era eu.

E entrou no meu pomar furtivamente
quando a noite tudo fez escuridão;
e de manhã, com alegria eu vi
meu inimigo estendido no chão."

William Blake

 
Seus punhos estavam cerrados, apertando o cabo da faca como se sua vida dependesse disso, afastando um passo a cada suspiro ofegante. Distanciou-se ainda mais de mim, escorando suas costas em um tronco de uma árvore em minha frente, com os olhos prestes a saltar das órbitas. Meu coração martelava no peito em movimentos imaginários, e mesmo que estivesse tremendo, mal sentia o frio.

Eu podia sentir o familiar calor de sua pele mesmo estando naquela longa distância. Queria tocá-lo, ter a certeza de que não estava alucinando ao ver seu rosto mais velho e recheado de novas cicatrizes. Mas não fiz nada disso, apenas suspirei pesadamente e apertei as unhas nas palmas das mãos.

Seu rosto virou bruscamente para o lado, e imaginei que não quisesse olhar para mim. Era compreensível sua raiva e desprezo, eu não poderia julgá-lo por esses sentimentos, mas depois percebi que passos batiam contra o chão ao longe, e por isso ele havia virado o rosto, ele tambem ouvira.

— Vá embora. - Apenas disse isso, virando o rosto novamente para mim. - Vamos, corra! Saia da floresta, sua mula teimosa!

— Correr? — Perguntei irritado.

Uma flecha voou em minha direção e nada pude fazer para interromper seu caminho reto, atingindo meu ombro esquerdo.

Bóris deixou a raiva mudar suas feições, tinha uma ruga no meio da testa a qual não me lembro de já ter visto antes. Não perguntou como eu havia chegado, não me olhou por mais de dez segundos e nem mesmo mencionou meu nome.

Apertei o braço e olhei o sangue derramar de dentro da ferida. Minhas pernas paralisaram quando a agonia arrepiou-me a espinha, tornando o breve movimento de todas as partes de meu corpo um sofrimento agonizante, jogando-me ao chão. 

— Ora, vejamos. Bóris pegou outro. - Um garoto de cabelos negros e lisos surgiu carregando um arco com a longa flecha armada em minha direção. Sorria como se ganhasse um prêmio inestimável. - A cada dia você se supera. Petrônio irá gostar.

Bóris surgiu detrás do homem, revirando os olhos para mim, balançando a cabeça negativamente e se virando para o outro lado. Voltei o olhar para o garoto de pele delgada. 

— Este parece ser de alta classe. O que podemos tirar dele? - Ameaçou chegar mais perto e mostrei as presas como uma serpente.

— Não se aproxime. — Sussurrei.

— Guarde esses dentes, Strigoi. - Ralhou o garoto e por acidente soltou a flecha, mas a peguei antes que se enterrasse em meu nariz. Bóris empurrou o ombro do cigano em repreensão. 

O Vampiro e o Romani - Livro O1  {CONCLUÍDO}Onde histórias criam vida. Descubra agora