Sombras do passado

6 2 0
                                    

Kursk começou a abrir os olhos devagar, sua garganta doía, ardia parecia ter areia dentro dela. Seus olhos embaçados levaram um tempo pra se ajustar ao cenário. Estava em seu quarto, era dia, havia um aroma agradável de incenso floral e um leve toque de fumo. Um corpo alto estava na janela, de costas pra ele, um braço para trás, uma mão à frente parecendo tirar algo dos lábios.

- Como você se sente, irmão? – Dreyfus perguntou sem se virar. Então falou se virando pra encarar o amigo, caminhando até uma mesa e apagando o charuto no cinzeiro de prata: - Ah, sim. Claro. Você não pode falar.

Não havia sinal de deboche na voz dele, mas Kursk agora achava que tudo que Dreyfus falava era tentando debochar, espezinhar a dor dele pela perda de Rania. Ele franziu a sobrancelha e tentou se mexer na cama, louco pra dar um soco nele. Ele ainda se lembrava muito vividamente das marcas nas costas de Rania e sabia bem quem as causara.

- Não. – Dreyfus disse em seu tom dominador, colocou uma mão firme e forte no ombro de Kursk, mantendo-o firme na cama. – Você não pode se mover. Vai reabrir a ferida e minha Rania terá que vir salvar a merda da sua vida covarde de novo porque ninguém mais tem o poder tão grande que ela tem pra fazer isso. E se você acha que vou deixar minha namorada – agora sim a ênfase nas palavras tinha um tom de deboche e possessividade – se esgotar salvando você, nem mesmo tendo saído da cama ainda, você deve ser mais burro do que imaginei.

Kursk abriu e fechou a boca tentando pronunciar todos os palavrões que vinham à sua mente, ameaçar arrancar as mãos daquele idiota, mas nenhum som saiu, nada além de um grunhido irregular e baixo. Ele sabia que Dreyfus tinha razão. Seu ferimento era grave, ele percebeu mesmo antes de desmaiar, então ou ele morreria ou apenas alguém com um enorme poder de cura, maior até mesmo do que os dos magos e sacerdotisas, o salvaria. Claro, tinha Rania, mas ela era muito instável emocionalmente, era sensível demais à visão de sangue e nada dedicada à seu treinamento durante a vida toda. De alguma forma, de uma forma bem desgastante pelo que parecia, a jovem que ele amava o tinha trazido de volta ao mundo dos vivos. Ele não sabia que era possível, mas agora a amava mais ainda. Ele ficou quieto para não causar nenhum problema em seu ferimento, pois isso faria Rania ter que se desgastar mais usando sua magia nele. Dreyfus acompanhou a mudança no olhar de Kursk: raiva, confusão, admiração, gratidão, amor e de novo raiva. O único sentimento que ele sabia que era voltado à ele era a raiva. Os outros, ele sabia, eram pra Rania. Sua Rania. O ciúme corroeu Dreyfus por dentro. Ele estava ainda com a mão firmando o jovem Tiger na cama, seus olhos logo acima dos de Kursk, ambos os felinos se encarando como se pudessem fuzilar um ao outro só com os olhos.

- Pelo menos isso você entendeu. Vamos ver se entende o que vou dizer a seguir. – Dreyfus disse com um brilho mortal nos olhos. – Eu não quero você perto da minha namorada de novo. Se eu pegar você perto dela, cercando a minha garota com sua sonsidão de merda, eu mesmo mato você, Kursk. E nem a magia dela vai te salvar porque eu vou me certificar de que ela não venha de novo salvar sua bunda. Espero não precisar fazer isso, mas farei se necessário.

Dreyfus se virou e foi até a porta. Ele parou de repente, se virou para ele e disse: - Diferente de você, Kursk, eu não tenho medo de lutar pelo que eu quero. Eu te dei a chance de lutar por ela. Você foi um covarde de merda e sabe disso. Viva com isso e pare de lançar seus olhares nojentos pra minha namorada ou vou esquecer que somos amigos.

Dreyfus saiu chamando o mago que estava lá fora aguardando pra verificar o estado do príncipe quando acordasse.

Amigo... Belo amigo esse merda foi! Aproveite enquanto pode, Dreyfus. Vou tirar minha Rania de você. Custe o que custar. Kursk pensou e caiu de novo num sono turbulento.

Likastía IIOnde histórias criam vida. Descubra agora