26. Miguel e Sadie

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Nos filmes de terror, a pior coisa que pode acontecer é o grupo se separar. Então o que nós decidimos fazer? (acertou quem disse "se separar").

Mas levando em conta que tinha um grupo de gângsteres nos perseguindo e que cada um fugir para um lado poderia despistá-los, a ideia não pareceu tão idiota assim. Embora agora, enquanto era cruelmente castigado com uma dor desviada, a ideia me pareceu assustadoramente idiota. Droga de sedentarismo!

Não levou muito tempo para o ar começar a me faltar e os pulmões a derreter como vela. Não conseguiria ir muito longe, então decidi que precisava me esconder. Infelizmente, levando em conta que era tarde da noite em uma rua deserta, minhas opções não eram das mais variadas.

— Miguel! – Escutei a voz de Nez ecoar pela rua como um trovão.

Sem outra alternativa, me abaixei atrás de um carro. Para mim, Nez era uma piada de mau gosto ambulante, e ele vir à minha procura não me intimidava nem um pouco. Contudo, além daquele covarde ter se juntado com outro Death Angel, eles estavam me caçando com uma arma de fogo em mãos. Meus punhos não seriam muito eficientes nesse confronto.

— Estava muito valente lá atrás! – gritou o delinquente de algum lugar não tão distante. – Por que não mostra essa coragem agora, maldito?!

Olhando sobre o capô do carro consegui ver pessoas nas janelas de suas casas. A maioria só fechava as cortinas ou se afastavam para não ver o que iria acontecer comigo. Aparentemente, aquela região de Little Italy era território marcado pelos Death Angel, e as pessoas ali sabiam disso. Também sabiam que se quisessem continuar vivas, precisavam ficar fora do caminho.

Ou seja, ninguém iria me ajudar.

Encostei a cabeça no chão, conseguindo observar meus perseguidores pelo espaço entre o carro e o asfalto. Dois pares de pés vinham marchando pelo lado oposto da rua até decidirem atravessar, vindo em minha direção. Olhei em volta e percebi que estava em frente a um beco. Silenciosamente, me esgueirei para o seu interior, sendo engolido pela escuridão.

— Qual é, Miguel? Somos amigos ou não somos? Apareça! Só quero conversar – debochou o bandido de moicano.

Meus olhos não demoraram a se acostumar com o escuro. O beco era relativamente estreito, cercado por paredes de tijolos sem reboco, e com uma grade semelhante a rede de um pescador impedindo o avanço até os fundos. Poderia tentar escalá-la, mas o metal iria fazer barulho e meus inimigos fariam uma bala me atravessar antes que tivesse tempo de chegar ao topo.

— Inferno – sussurrei.

— Olha quem eu encontrei, Nez! – exclamou uma voz atrás de mim.

O garoto que eu desconhecia estava plantado na entrada do beco. Nez surgiu ao seu lado tropeçando nos próprios pés, como quem corre para ver um eclipse antes do final. Não precisei enxergar seu rosto para saber que ele abrira um sorriso satisfeito.

O garoto de cabelo verde veio em minha direção e o seu amigo o seguiu, mas pela forma que o desconhecido caminhava mais atrás concluí que havia um acordo entre eles: Nez lidaria comigo sozinho.

A sombra da arma no chão era tão grande quanto um lobo. Engoli em seco e recuei até minhas costas acertaram a grade.

— Miguelito, Miguelito. Não faz ideia do quanto desejei ter a chance de apontar um revólver para sua cabeça – revelou, tirando o casaco jeans como se não quisesse sujá-lo com meu sangue. – Sabe por que caras como você morrem cedo?

Não respondi.

— Eu ia dizer "porque não aprendem a calar a boca", mas parece que já está colocando isso em prática! – admirou. Ele parou à alguns centímetros de mim, transbordando soberba. – O que foi? O rato comeu sua língua?

Decepção de verãoOnde histórias criam vida. Descubra agora