19. Grey

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Após o preparo de um jantar nem tão complicado, nos reunimos na sala de estar com nossas tigelas de miojo no colo.

Khan contava em libras algumas de suas aventuras na Turquia, enquanto Luís e Miguel as traduziam para nós. Em uma delas, Khan fora andar de balão na Capadócia com alguns amigos. Enquanto o instrutor soltava as cordas que ancoravam o balão, os amigos de Khan foram rápidos em acender o anel de fogo. Assim, um grupo de adolescentes turcos flutuaram pelo céu sem instrutor, sem a mínima ideia de como aterrissar, e tão desesperados quanto náufragos.

Tessa se manteve trancada no quarto, mas sua sopa estava na porta – aguardando o momento em que a fome falaria mais alto.

Quando a meia-noite chegou, eu estava surpreendentemente mais acordado que antes. Tessa permaneceu no quarto de Luís. Como as meninas não quiserem forçar a barra, optaram por deixá-la sozinha e dormiram no quarto de Khan. Os colegas de Miguel disseram que não se incomodavam de passar a noite no sofá. Portanto, só restava a mim e Éric dormir no quarto do loiro.

Ao olhar no espelho quase não me reconheci. Havia olheiras escuras embaixo dos olhos e minha pele parecia mais clara que o normal. Agradeci mentalmente por minha mãe ter ligado, e não feito uma videochamada.

— Eu não estou entendendo nada, Greyson. Como você sai de manhã, passa o dia inteiro fora, e tarde da noite avisa que vai dormir em outro lugar? E com pessoas que não conheço?! – Dona Monica tinha sérias dúvidas que não seriam vencidas por simples respostas.

— Mãe, vou dormir na casa do Miguel. Estudamos na mesma escola, pode ficar tranquila – expliquei, já sabendo que aquela resposta não era suficiente.

— Não conheço esse menino. Onde está a mãe dele?

Meu deus. Será que minha mãe não tinha percebido ainda que eu tinha dezoito anos, e não oito?

— Ele mora sem os pais, mãe. Olha, pode ficar tranquila, okay? Sadie está aqui! E Lembra de Éric Vertes? Ele também está.

— O garoto que ganhou do seu irmão nas olimpíadas de matemática? – perguntou.

Escutei alguns ruídos e a voz do meu irmão surgiu no telefone:

— Como você pôde? – questionou.

— Ah não, Garnett.

Eu devia saber que a ligação estava no viva-voz.

Me encostei na parede de azulejo levemente úmida. Pelo vidro do chuveiro, podia-se ver a imagem embaçada de Éric tomando banho.

— Escuta, você dividiu o útero comigo. Ou seja, me deve lealdade eterna! Mas agora diz que está confraternizando com meu rival? – indignou-se Garnett.

— Cara, ele ganhou de você em uma olimpíada escolar! – lembrei, tentando deixar claro o quanto aquele motivo era ridículo.

— Por um décimo de ponto! – Garnett defendeu seu resultado. – Eu esperava mais de você, Greyson.

— Céus, você é tão dramático.

Papai tomou o controle do telefone. Disse para ignorar a mágoa do meu irmão e deixar que ele mesmo lidaria com minha mãe (que gritava ao fundo sobre como todos nós éramos irresponsáveis). Escutei Lisa berrar um "manda beijo para a Sadie" e meu pai me desejou uma boa noite. Nunca fiquei tão feliz em encerrar uma ligação.

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