56. Miguel e Grey

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Atenção: esse capitulo possui gatilhos de crise de ansiedade!

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Eu não conseguia respirar. Naquele momento, agradeci por ter encontrado um local silencioso e discreto para ler a carta, porque se estivesse rodeado de pessoas tudo seria mil vezes pior.

Danielle tinha falado com meus pais. Isso não podia ser real, podia? Eu nem ao menos sabia quem ela era no primeiro ano do ensino médio. Só tinha notado sua existência no terceiro, quando seu câncer foi diagnosticado. A fama se espalhou rápido e, com o tempo, todos os alunos de West Prince sabiam quem era a menina que havia desenvolvido leucemia. Aquele era seu apelido, "a menina com câncer", mas fora isso, nunca tive qualquer contato com a líder de torcida.

Sem perceber, meus dedos se fecharam em volta do papel, amassando-o de forma nada cuidadosa, como se assim pudesse destruir o conteúdo. Larguei a carta no chão e levei as mãos ao rosto, esfregando com força como se assim pudesse acordar de um pesadelo.

Meus pensamentos voltaram para aquela noite, quando tudo desmoronou diante de mim. Estava no quarto de hospedes – o quarto que eu ocupava desde que tinha mudado para o apartamento de Amelie –, sentado próximo a cabeceira da cama, encarando o livro de Física.

Amelie entrou. Usava um vestido cor de vinho combinando com seu batom, e os cabelos castanhos caíam pelos ombros. A florista veio até mim e se sentou na beirada do colchão.

— O que está fazendo? – perguntou em seu tom habitualmente doce.

— Estudando.

— Física? – leu a capa do livro. – Gosto dessa matéria.

Eu não soube identificar se havia segundas intenções naquela frase, mas provavelmente sim. Amelie era como uma raposa: sutil, porém determinada. Conseguia tudo que queria agindo de forma gradativa, calculista, e nada apressada.

Foi assim que ela te conseguiu, lembrou meu subconsciente, me fazendo morder o lábio.

Quando vim morar na Califórnia, Amelie me tratou muito bem. Cheguei a pensar que aquela desconfiança que tinha em relação a ela – pela forma que costumava me encarar quando passava na frente de sua floricultura – fosse bobagem de minha cabeça. Mas em um dia particularmente melancólico, a florista se aproximou sorrateiramente, com palavras ditas em um tom sensual, e conseguiu me roubar um beijo.

Me afastei imediatamente e corri em direção ao quarto, tentando compreender o que havia acabado de acontecer. Após vários minutos de reflexão, buscando assimilar o que tinha sentido, tive a pior ideia possível:

Eu quero ser hetero. Quero gostar de mulheres. Por que não tento agora?

Como uma criança criada na igreja, notar que sentia atração por garotos tinha sido uma descoberta assustadora. É triste admitir, mas eu me via como um monstro. Era diferente de todo mundo e as pessoas precisavam ficar longe de mim.

Decepção de verãoOnde histórias criam vida. Descubra agora