30. Sadie

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Olhava para o homem à minha frente, me sentindo como em um julgamento cuja ré era eu, e ele, o juiz. De certa forma, era isso mesmo que estava acontecendo, pois o que eu dissesse nos próximos minutos definiria o meu destino e o de meus amigos.

O julgador se inclinou sobre a mesa, em uma postura de diretor de escola.

— Pronta para conversarmos?

Assenti com a cabeça.

— Nome? – perguntou como em uma entrevista de emprego.

— Sadie Ayo Jole.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Nome interessante – observou.

— Não tanto quanto o seu, Ray.

— Hau – corrigiu, não necessariamente chateado. – Mas entendo sua dificuldade. Nomes indígenas não são muito comuns por aqui.

O homem que nos salvou no metrô era do povo Maori – os indígenas nativos da Nova Zelândia. Quando nos contou isso, fiquei bem curiosa e com vontade de saber mais a respeito de sua história. Mas como éramos temporariamente suspeitos, tive que deixar a conversa para um momento mais apropriado.

A pele de Hau era da cor do mel tostado. Seu nariz era grande e seus olhos pequenos, com pupilas cinzentas como um céu tempestuoso. A cabeça era lisa como se nunca houvesse crescido um fio de cabelo sequer, e todo o seu corpo era poderosamente revestido com músculos.

No momento, estava usando uma camiseta polo azul e um relógio parecido com ouro, o que condizia menos com a imagem de guerreiro (e mais com a de um rico proprietário de campos de golfe, que cheirava cocaína nos fins de semana em sua banheira cheia de dinheiro).

— Tem certeza de que não é um irmão perdido do Dwayne Johnson? – perguntei mais para aliviar o clima.

— Dwayne...o lutador? – Sua risada indicava que minha pergunta tinha sido mais aleatória do que pensei.

— Sim. Você sabe... o "The Rock". Vocês têm até a mesma tatuagem no braço.

Hau tocou no desenho que cobria seu bíceps.

— Impossível. Nenhuma tatuagem Maori é exatamente igual à outra. Todas têm uma combinação única – informou, e eu achei aquela uma curiosidade muito interessante. – Mas deixemos essa conversa para mais tarde. Estou aqui para saber a verdade sobre você e seus amigos.

— Já teve essa mesma conversa com todos eles individualmente. Ainda não está convencido? – perguntei. – Aquele homem com máscara de palhaço tentou nos matar.

Hau abriu a gaveta de sua escrivaninha e de lá tirou uma arma. A arma que o stalker deixou no metrô.

Ele abriu o compartimento de capsulas e o mostrou para mim.

— Não tem balas – constatei, surpresa.

— Não – confirmou. – Significa que o objetivo daquela pessoa não era matar.

— Não naquele momento.

Ele suspirou e guardou a arma novamente.

— Mas respondendo à sua pergunta, Sadie: só acreditarei se até a última pessoa, no caso você, contar todos os fatos da mesma forma que os demais.

Cruzei os braços, me sentindo desafiada.

— Garanto que a menos que tenhamos vivido em realidades distintas, você vai ouvir a mesma história!

Decepção de verãoOnde histórias criam vida. Descubra agora