17. Éric

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Éric Vertes

Dois anos antes da aventura.

Quando meu chefe convocou a mim e os demais funcionários da lanchonete para uma reunião, imaginei que se trataria de mais um dilema sobre quem iria afastar os cachorros que sempre reviravam o nosso lixo. Contudo, o dono da Lanches Bay conseguiu nos surpreender com uma bronca sobre porque não estávamos cobrando pelos guardanapos.

— Estes são os melhores do mercado! Como vocês puderam oferecê-los aos clientes de graça? – questionou como se estivesse quase indo à falência por nossa causa.

Levantei a mão ainda me perguntando se aquilo se trataria de uma piada.

— Com todo o respeito, Sr. Cooper, mas quanto deveríamos cobrar por guardanapos? – Esperei que minha pergunta o fizesse perceber o quão boba era aquela reunião.

— Cinquenta centavos, Éric! É o preço do mercado! – respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. — Essa geração não valoriza o dinheiro! É por isso que a China está deixando os Estados Unidos comendo poeira!

Resolvi desistir da discussão. Além de Roger Cooper ser um fanático por dinheiro, ele ainda não havia entendido que eu vinha de família coreana, e não chinesa. Na verdade, Cooper era um daqueles homens tão iludidos em seus mundinhos ideais, que acreditava que pobres só eram pobres porque queriam.

Com mais algumas palavras de um discurso lunático, o nosso chefe nos liberou para que voltássemos às nossas funções. Retornei para meu lugar, atrás do balcão, e olhei sob o ombro para a minha amiga Raven.

— De tantos lugares em San Diego, você tinha que arrumar emprego para a gente logo aqui?

— Ei! Você queria um trabalho, certo? E querendo ou não, o Sirigueijo oferece um pagamento razoável! – se defendeu enquanto virava dois hambúrgueres gordurosos na chapa.

— Sirigueijo? – repeti.

— O Sr. Cooper é tão mesquinho quanto ele – justificou o apelido. — Ah! E eu sou o Bob Esponja e você o Lula Molusco!

Eu sabia que o seu tom exageradamente alegre era falso. Raven sempre foi a primeira na fila de pessoas que adorariam sentar-se com você para falar mal do Lanches Bay.

Acabei sorrindo.

— Ele paga bem ou nós que estamos muito desesperados por dinheiro. Fica aí a questão – levantei a hipótese.

Tenho certeza de que Raven ia fazer algum comentário ácido em resposta, mas seu celular tocou antes. Sem largar a espátula, atendeu e iniciou um diálogo em uma língua que não era o inglês. Eu soube que se tratava de alguém da sua família.

Meu nome é Éric Hae-Won Vertes.

Apesar do primeiro e último nome bem ocidentais, minha família materna veio da Coreia do Sul. Devo o sangue americano ao meu pai: um soldado californiano, superpatriota, que amava tanto seu país que poderia morrer por ele.

Nos Estados Unidos não é incomum vermos bairros divididos por raças. Pelo que fiquei sabendo, meu pai não se incomodou em mudar para um bairro coreano depois do casamento. Então, nasci e cresci com crianças, adultos e idosos que compartilhavam das mesmas tradições que minha mãe. Alguns mais liberais, outros nem tanto.

Decididamente, Hanna Hae-Won era do segundo time.

Na escola, meus colegas de classe pareciam confortáveis em ficar na média. Talvez fosse pela minha criação, mas eu detestava mediocridade. Se não pudesse tirar a melhor nota possível, preferia fingir uma gripe terrível que me impedira de comparecer à prova.

Decepção de verãoOnde histórias criam vida. Descubra agora