Capítulo 3 - Todo artista precisa de uma musa

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- Boa noite, mamãe – Luisa suspirou e fechou os olhinhos. Gizelly ainda ficou um tempinho ali observando sua cria.

- Te amo, minha vida – disse baixinho, antes de sair e desligar a luz. Seu dia tinha sido longo e amanhã teria mais. Só queria conseguir sobreviver ao teste de resistência que a vida estava lhe impondo. E ele tinha um nariz lindo... 

Inspirar, expirar, inspirar, expirar. Era esse o exercício que Marcela mais vinha fazendo nos últimos tempos e naquela manhã não podia ser diferente. Sua cabeça latejava como se tivesse batendo um tambor dentro dela, seu corpo inteiro doía e seu estômago... esse talvez nem existisse mais. E lhe faltava ar. Lentamente, e com um esforço sobre humano, ela abriu os olhos, sentia como se tivesse a consistência de uma gelatina. Daquelas bem moles mesmo. Mas conseguiu se sentar. Ótimo, seu corpo ainda respondia aos comandos de seu cérebro.

Esfregou o rosto para tentar acordar, com um gemido arrastado, saiu da cama. No banheiro, ela colocou para fora tudo que vinha lhe causando mal-estar. A maior parte era álcool. Ainda gemendo, foi se arrastando para o box do chuveiro e quando a água gelada tocou sua pele, só não gritou porque nem forças tinha para isso. Nem sabe quanto tempo ficou lá embaixo, mas quando saiu de lá, ao menos já estava livre da tontura.

Colocou um moletom, uma camisa larga, seus chinelos e saiu se arrastando pela casa. Seu estômago deu uma cambalhota quando encontrou com Jossi sustentando uma expressão nada amigável, a postura impecável no sofá da sala. A mulher lhe analisou de cima a baixo e a cara que fez exprimiu puro desgosto. E cansaço.

- Pensei que ia ter que chamar os bombeiros pra te tirar daquele quarto. Ou a funerária.

Marcela deu mais três passos e se jogou no sofá, ainda gemendo. Michellen passou pela porta da cozinha levando uma bandeja com salada de frutas para Jossi.

- Meu Deus, Marcela... Você está acabada, menina – comentou – Eu vou pegar um remédio.

E retirou-se da sala. Marcela murmurou um “valeu, Mimi” e cobriu os olhos com as mãos. A claridade não estava lhe fazendo bem.

- Eu sabia que tinha algo errado... Quando vi a Bia e a Isa saindo daqui ontem, eu senti que você tinha feito besteira. Aliás, o pressentimento começou bem antes, quando eu te liguei seis vezes e você não atendeu uma sequer – Jossi começou dizendo – Marcela, minha filha, eu não acredito que vou ter que passar por tudo de novo. Assim não dá....

- Mãe, a senhora pode fala um pouquinho mais baixo? Minha cabeça está doendo.

- Eu falo da altura que eu quiser e você vai me ouvir! – Jossi alteou a voz de propósito – Marcela gemeu e se encolheu – Uma mulher de 25 anos, feita na vida, agindo como uma adolescente rebelde. Descontando na bebida, caindo pelos cantos... Eu me recuso a acreditar que você voltou pra isso.

- Eu não voltei pra isso e a senhora sabe muito bem – arranjou forças para rebater – Eu tive meus motivos.

- Ver sua ex com a família?

“Sua ex...” Marcela nem se deu ao trabalho de objetar. Jossi tinha razão. E Gizelly era sua ex por culpa dela mesma.

- Vai ser assim toda vez que encontrar a Gizelly? Vai beber até cair? Se acabar desse jeito? – Jossi continuou o sermão – Sete anos depois e as mesmas atitudes, eu realmente não consigo entender, Marcela. As pessoas, elas evoluem, mas você parece que dá um passo pra frente e dois pra trás.

- A senhora está me chamando de imatura? – Marcela se empertigou. Michellen entrou na sala trazendo o remédio e um copo de água.

- Madura que não é, né, Marcela – a mulher comentou. Marcela a mirou embasbacada.

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