São Paulo saberia como lhe curar daquilo. Aquela cidade sempre sabia o que Marcela Mc Gowan precisava. Sempre foi assim e sempre seria.
A música alta faltava lhe estourar os tímpanos ao mesmo tempo em que parecia controlar cada movimento de seu corpo. Braços pra cima, aquela dancinha típica de Marcela Mc Gowan, em uma mão uma garrafa de algo que ela nem sabia o que era (e também não lhe interessava muito saber), e na outra um cigarro. Um trago, um gole, um trago, um gole. Aquela não era a primeira dose. Aquele não era o primeiro cigarro.
A batida saiu de um trap para um eletrônico no melhor “tum-tum-tum” existente. Ela se juntou a um grupo de garotas que pulava freneticamente na frente do palco e repetiu os movimentos. Pulou tanto, gritou tanto que quase ficou sem voz, sentiu-se ser abraçada por alguém, mas sua cabeça já estava leve demais para se importar com coisas do tipo “estou sendo agarrada, devo reagir”. Reagiu, mas não como uma pessoa sã o faria. Virou-se, viu uma menina esguia, cabelos escuros e repicados com uma expressão firme e decidida nos olhos.
Não carecia de palavras. Foi.
Beijou uma, duas, três vezes, a moça faltou lhe arrancar a roupa ali mesmo e Marcela também mantinha em seus movimentos a mesma voracidade dos dela. Amassos, apertos, interjeições, línguas, lábios e mais línguas. O gosto da vodca com limão, o aroma do álcool no hálito dela lhe embebedando ainda mais. Só pararam quando a menina foi puxada por alguém. Sumiu do campo de visão de Marcela sem nem dizer nada. Mas ok, palavras ali seriam desperdício de tempo.
Caminhou até o bar e a ordem foi clara. Queria o que havia de mais forte ali. Ou aplacava tudo o que havia dentro com álcool ou seria nocauteada pelos próprios pensamentos. E para evitar pensamentos insistentes, a melhor coisa a se fazer é não pensar. O álcool não te deixa pensar, ele te faz perder os sentidos e a noção. Marcela não precisava de noção. Precisava anestesiar.
Virou a dose de uma vez. Fez uma careta. Virou de novo, e de novo, e de novo... perdeu a conta. Pegou uma cerveja (ou sabe-se lá o que era aquilo) e saiu bebendo como quem tomava água. Voltou para a pista de dança. Mãos para cima, pulinhos, dancinhas desconexas, mais mãos em sua cintura, virou-se: um carinha. Ah, não. Podia não estar cem por cento sóbria (aliás, duvidava que estivesse ao menos dez por cento sóbria), mas não faria aquilo, não mesmo.
- Desculpa, mas eu gosto de peitos e o que vocês tem entre as pernas não me interessa nem um pouco – viu a surpresa no rosto dele e aproveitou-se da guarda baixa para se livrar em um safanão e sair para o outro lado. Encostou-se a uma coluna, fechou os olhos, respirou fundo, bebeu mais um gole (era cerveja, afinal), suspirou.
Gizelly.
Gizelly e Renata.
- Gigi? – Marcela piscou umas duas vezes para aprumar a vista. Viu uma cabeleira castanha passar para perto do bar. Não, não podia ser. Gizelly ela ficou na casa de Bia abrigada no abraço de Renata. Mas... Ah, foda-se. Não ficaria nas suposições. Virou o conteúdo da garrafa esvaziando-a (mais uma para a pilha que já colecionava) e se dirigiu até a mulher.
- Oi – falou ao ouvido dela, fazendo-a se virar. Não, não era Gizelly (ah, mas que droga! Por que você não está aqui, Gigi?), mas se parecia bastante com ela. Os cabelos, ok, não tinham cachos, mas ondas. Mas o tom de castanho era bem semelhante e os traços do rosto também – você é linda, sabia? – alteou a voz para se fazer ser ouvida sobre as batidas que ecoavam no ambiente.
- E você é bem atrevida – a moça respondeu, mas cedeu ao joguinho dela, Marcela percebeu. Riu mais aberto.
- você vem sempre aqui?
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MIL ACASOS
Fiksi PenggemarSinopse: O que acontece quando o tempo passa? Alguns aproveitam cada segundo, outros repensam o que viveram até ali e há os que simplesmente se arrependem de seus feitos e tentam reverter o ponteiro do relógio e recuperar tudo que lhe foi perdido. S...