Capítulo 44 - Tarde clichê

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Olho meu reflexo nada agradável, estampando no espaçoso espelho a minha frente. Meu rosto abatido e olheiras fundas revelam meu cansaço.

Pensar em minha fuga com Fernán tem arrancado de mim meu apetite, energia e sono. Sinto-me numa corrida enfadonha. Cada hora que passa, caminha para um dia mais próximo, agora faltam sete.

Não me esforço para me desfazer de meu moletom, embora eu pareça muito mais desengonçada dentro dele, porém, é confortável e o dia hoje está chuvoso e frio.

Contento-me apenas em prender meu cabelo desgrenhado fazendo um coque no topo de minha cabeça, junto a uma base na região inferior de meus olhos e um blush em minhas bochechas. Não quero que Rafi note que há algo errado.

Forço um sorriso para o espelho e está ótimo! Acho que agora meu semblante exausto é imperceptível.

Deixo o banheiro, pegando com cuidado a lace wig que usei no jantar e agora higienizei e penteei bem.

Vou até à sala a procura de Rafi, sentindo a familiar dor em meu peito ao vê-lo, que tem se tornando constante desde suas últimas palavras proferidas a mim. Mas, não interessa, tudo que preciso agora é focar na única pessoa que se importa comigo, Bruno. Eu preciso salvá-lo.

— O que é isso? — Ele pergunta desviando rapidamente para os longos cabelos pretos, postos ao seu lado no braço do sofá, mas logo volta sua atenção a tela do laptop aberto sobre seu colo.

— A peruca... Ou disfarce... Como preferir chamar.

— E por que pensa que eu a quero?

— Quero que a doe. Acho que não terei a oportunidade de usá-la novamente.

— Achou certo. Mas, para quem devo doar?

Dou de ombros me sentindo um pouco triste, mas seria querer demais que o jantar se repetisse.

— Alguma organização ou hospital de câncer. Eles ficarão muito gratos em receber.

Falo me auto confortando com as últimas palavras. Ao menos alguém sairá feliz disso tudo.

— Claro.

— Prometa. — Peço o fazendo erguer os olhos curiosos para mim. Ela foi muito cara e será muito válida para quem precisa. Não suportaria que fosse descartada de qualquer forma quando eu fugir.

— Prometo. — Diz com um leve sorriso que eu correspondo aliviada.

Na verdade, acho que é a primeira vez que nos olhamos novamente, desde minha confusão devido à ressaca.

Agradeço-lhe antes de lhe dar as costas para me retirar, até ouvi-lo chamar meu nome.

— Anália... Não quer se juntar para um filme?

Viro-me confusa, deslizando meus olhos dele para a grande TV a sua frente na parede, voltando para ele novamente.

Seria uma ótima proposta nesse fim de tarde para dois amigos ou amantes, porém, não nos encaixamos em nenhum dos casos e a esta altura, nenhum de nós dois poderá reverter isso. É impossível para ele perdoar os inimigos do Henry; assim como desfazer o acordo com Fernán, para mim.

Noto também o copo de whisky inacabado a sua frente, sobre o vidro da mesinha de centro.

Abusando do álcool de novo!

— Não acho que sou uma boa companhia para você.

— Não precisa ser a melhor pessoa para acompanhar alguém durante um filme. Apenas basta olhar para a tela e fazer alguns comentários ocasionalmente.

Desejo PerigosoOnde histórias criam vida. Descubra agora