Capítulo 84 - Incompreensível

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Há meia hora estava sentada no chão frio, fitando a cama que parecia flutuar no vazio a minha frente, ao mesmo tempo que meu cérebro não conseguia pensar em nada.

A textura macia e gosto suave do beijo do Colin ficou em minha boca. Ou melhor: o beijo que eu roubei do Colin.

Bato impacientemente meus pés no chão, enquanto busco em minha mente qualquer justificativa plausível que explique o que fiz, mas a única que tenho é que talvez este isolamento tenha me deixado louca.

Por um momento, minha inquietação dá lugar a um calor intenso, que sobe até minhas bochechas e logo toma conta de todo meu rosto.

Como vou olhar em seus olhos novamente, meu Deus? Como posso me desculpar pelo que fiz? Eu preferia ter lhe bofeteado dez vezes a ter revelado sentimentos que eu própria desconheço, para ele.

O que a Carol me diria? O que a Émile me diria?

Forço-me a imaginar como elas me aconselhariam se estivessem aqui, mas não obtenho resposta.

Isto é esperado porque nunca estive em uma situação semelhante antes. Inciando por eu ser uma pessoa de poucos amigos e em uma determinada fase da minha vida, minha única companhia era a Émile. Finalizando com o fato que, a Anália que conhecia, jamais teria avançado o ponto.

Não sei se por ser muito sem graça, ou por ter uma amiga que roubava toda a cena para si, todo o tempo fui a garota invisível da turma. Os garotos normalmente não se aproximavam de mim, e quando faziam, tinham como intuito que eu fosse a ponte entre eles e a Émile.

Entretanto, isso não era um problema para mim. Era bom ficar em sua sombra e não chamar atenção. Nenhum daqueles meninos eufóricos com os hormônios da puberdade me interessavam, pelo contrário, me assustavam. Houve apenas um que despertou meu interesse em todo meu período colegial, Murilo, o filho da proprietária da lanchonete e minha futura patroa tirana, dona Soraia. No entanto, diferentemente dela, ele sempre foi um garoto quieto e gentil, porém, nunca se interessou por nenhuma de nós duas e com o tempo o sentimento passou.

Só uma única vez fui notada, aos meus quinze anos, por um metido a valentão do time de futebol da escola, mas essa parte não é boa de lembrar.

Além de tudo isso, para mim, amizades possuem uma linha respeitosa, porém, tênue e quando alguém a ultrapassa, seu rompimento pode trazer resultados desastrosos. É difícil construí-la novamente.

Não sei em qual momento essa constância se rompeu a aconteceu essa mudança dentro de mim.

Eu nunca havia visto o Colin de forma atraente, até agora. No entanto, confesso que uma parte de mim, gostou de estar em seu abraço firme, mas a outra bem maior, adormecida lá no fundo, desejou que fosse o Rafi em seu lugar...

Jogo a cabeça para trás e encho meus pulmões de ar, enquanto meu coração se despedaça por isso. Como posso aspirar por seu beijo? Como ainda posso querer aquelas mãos que tão meticulosamente me arrastaram como seu cachorrinho pelo quarto, para se vingar de mim?

Eu acreditei que ele me desejava e há muito tempo não me sentia tão insignificante como ele me fez sentir.

Coloco meu rosto entre os joelhos, tentando afastar a náusea que faz os móveis a minha frente, flutuarem.

Desejo PerigosoOnde histórias criam vida. Descubra agora