Capítulo IX
Já haviam três dias em que eu tentava falar com ele. Mas Antônio me evitava a todo custo. Ele fugia de mim como o diabo foge da cruz.
-Psst, Antônio - chamei baixo, quando ele passou pela minha bancada, com uma caixa vazia apoiada nas costas.
Antônio virou o rosto para o outro lado e seguiu caminho. Bufei.
Eu não tinha raiva dele. Talvez um pouco. Mas eu sabia que ele não fizera por mal. Sempre que passava por mim, seu queixo tremia e ele parecia culpado.
Estar em casa me deixava nervosa. Eu temia que Henrico soubesse o que tinha acontecido e se chateasse.
Naquela mesma noite, enquanto eu cozinhava, ele chegou inesperadamente, me dando um abraço, e meu corpo tremeu, assustando-se. Ele riu.
-Você está bem?
Eu forcei um sorriso.
-Claro, querido.
Em minha mente, milhões de pensamentos me atingiam. Será que ele sabia? Como eu vou me justificar para ele, lhe dizer que não fiz nada, que não sabia que Antônio faria aquilo? Será que era um teste para saber se eu lhe diria a verdade? Será que...
-Ah, droga! - disse alto, ao sentir uma dor aguda na mão esquerda.
Enrolei meu dedo em um pano, enquanto corria até a pia para lavar o sangue.
-O que disse? - ouvi a voz de Henrico. Ele erguera o rosto do jornal, e tinha a cabeça virada de leve em minha direção, e uma sobrancelha erguida.
-Desculpe, querido, cortei meu dedo - lhe expliquei, falando alto para que ele me ouvisse, do outro lado da cozinha.
-Hum - ele murmurou, distraído, e percebi que ele bebia um gole de cerveja, novamente lendo o jornal - O jantar está bem?
******
Enquanto escrevíamos uma carta para a noiva de Giuseppe, ele tinha o rosto tenso. Suas sobrancelhas estavam franzidas, e ele segurava o rosto com uma das mãos, enquanto a outra estava apoiada na mesa, mas não da maneira tranquila que ele costumava ficar, com as palmas para cima. Ele segurava a mesa até os nós dos dedos ficarem brancos.
Eu já tinha lhe perguntado o que estava acontecendo, mas ele não quis responder, disse que estava tudo bem, e me pediu para adicionar mais alguma coisa em sua carta.
Enquanto eu apertava as teclas da máquina, os olhos dele iam de um lugar ao outro, e cada vez que alguém deixava algo cair, ou uma cadeira arrastava, ele parecia se encolher.
-Ah, droga... - ele murmurou, passando as mãos pelo cabelo. Eu apertei mais algumas teclas e ele se ergueu de supetão, fazendo algumas pessoas olharem em nossa direção - Eu não me sinto bem...
Antes que eu pudesse perguntar o que estava acontecendo, ou lhe pedir para sentar novamente, ele saiu em direção a porta.
-O que...?
Eu corri atrás dele, e o Sr Luigi, notando a agitação, se adiantou atrás de nós.
Quando o alcancei, do lado de fora, Giuseppe estava apoiado nos joelhos, pálido, tentando recuperar o fôlego.
-Você está b... Oh!
Antes que eu pudesse terminar, ele vomitou. No mesmo momento, o Sr Luigi chegou. Ele nos olhou, e seu rosto geralmente bondoso e simpático parecia chocado, e irritado. Ele me puxou para trás e se aproximou de Giuseppe, que agora ia se colocando de pé aos poucos.
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Bella Ciao
RomanceAmélia tem uma paixão por cartas de amor, mesmo sem nunca ter recebido uma. Ela está acostumada ao trabalho e a vida pacata na pequena e tranquila villa italiana, que nem mesmo a guerra conseguiu agitar. Apesar da vida simples, ela é feliz no trabal...