Capítulo XL
-Gabrielle! Romeu! - minha mãe grita, chamando meus irmãos. - Venham aqui!
Ouço o som dos passos no andar de cima, e então nas escadas. Levanto o rosto, e tento limpá-lo de todas as lágrimas. Minha mãe segura meu rosto, sorrindo para mim, e beija minha testa com carinho.
-Mãe? - chama Gabrielle.
-O que está fazendo aí? - ouço a voz de Romeu.
Os dois se aproximam, confusos, e quando me veem, Romeu parece congelar, mas Gabrielle se joga para cima de mim, me esmagando em um abraço apertado e nada delicado.
-Gabi... - digo, sem ar, e ela me solta, rindo.
Romeu me abraça levemente, parecendo ainda muito perplexo de que eu esteja lá.
-O que...? Como...? - ele tenta dizer, segurando meus braços, enquanto me olha.
-Amélia - minha mãe chama nossa atenção. - Não vai nos apresentar o rapaz?
Giuseppe. Percebo que o esqueci completamente, e meu peito se enche de culpa e vergonha. Romeu e Gabrielle também parecem reparar nele pela primeira vez.
Mas o General não parece se importar. Ele sorri alegremente, dando um passo para frente. Ele cumprimenta minha mãe e irmã com um beijo na mão, e um aperto de mão para Romeu.
-Muito prazer, senhora Fiore, senhorita Gabrielle, e você deve ser Romeu, muito prazer, meu nome é Giuseppe.
Nós entramos, pois está muito frio. Minha mãe acabou de fazer o almoço, e ela nos convida para comer, o que é ótimo, pois estava morrendo de fome. Eu ajudo Gabrielle a colocar a mesa, enquanto Giuseppe ajuda minha mãe a carregar a panela pesada, e Romeu traz a outra. Reparo na forma como ela coloca as mãos nas costas.
-Mãe? - chamo. - A senhora está bem?
Ela faz um gesto de descaso.
-Não é nada, querida.
-Mamãe teve uma torção - Gabrielle entrega, enquanto belisca uma batata. - Mas não quis ir ao médico.
-Gabrielle! - minha mãe reprime.
-Mãe!
Ela suspira.
-Não é nada, Amélia, querida. Não tem porque, logo vai passar, vamos comer.
Olho para Giuseppe, e ele sorri, como se me dissesse para me preocupar com isso depois. Nos sentamos à mesa, e nos servimos, revezando quem pega o quê. Minha mãe coloca mais uma colher de comida para Giuseppe, quando ele não está olhando.
-E Henrico, querida, por que não veio com você?
Por um momento, a comida parece ter um gosto ruim na minha boca. Preciso forçar para engolir, e bebo um gole demorado de água. A mesa fica silenciosa, esperando que eu responda. E Giuseppe deve me sentir tremer, pois coloca a mão sobre a minha, por baixo da mesa.
-Mãe... - eu digo, com a voz tão baixa que temo que ninguém consiga me ouvir, então tento de novo. - Mãe, e-eu preciso te contar uma coisa...
E então eu falo. Tudo. É difícil demais, e choro enquanto falo. Ninguém mais está comendo, não me interrompem, talvez sabendo o quão difícil é dizer tudo isso. Em alguns momentos, penso que não vou conseguir continuar, mas continuo mesmo assim. Giuseppe me ajuda a encontrar as palavras certas quando não consigo me expressar.
Conto tudo a eles. Sobre como Henrico nunca me amou, sobre como ele só se casou comigo porque pensava que eu estava grávida. Conto sobre como ele e a mãe me convenceram que o melhor seria vender a casa da minha família, onde vivemos por anos, construímos nossas memórias, pois assim poderíamos cuidar da mãe dele, mas que na verdade eles queriam o dinheiro da casa. Conto sobre como pensei que tudo estava bem, mas que na verdade eu vivia um pesadelo. Conto a eles sobre Cordélia, o hospital psiquiátrico - deixando, por hora, Giuseppe fora da história -, minha gravidez, e nesse momento minha mãe e Gabrielle engasgam, surpresas, como se quisessem dizer algo, mas não me interrompem. Conto sobre como tentamos reconstruir nossas vidas. Conto cada detalhe. Conto que Henrico logo voltou aos velhos hábitos. Conto sobre as noites que passei sozinha em casa, às vezes dormindo no sofá porque eles já tinham utilizado a cama. Conto sobre as ameaças, gritos, xingamentos, e até mesmo sobre todas as confissões: como ele não me amou, como me enganou, como utilizou o dinheiro de Cordélia para me mandar para longe. Conto-lhes sobre tudo, até chegar ao fatídico momento em que ele me agride, e eu perco o bebê.
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Bella Ciao
RomantikAmélia tem uma paixão por cartas de amor, mesmo sem nunca ter recebido uma. Ela está acostumada ao trabalho e a vida pacata na pequena e tranquila villa italiana, que nem mesmo a guerra conseguiu agitar. Apesar da vida simples, ela é feliz no trabal...