Capítulo I

98 3 5
                                    

Capítulo I

Existiam duas coisas que eu gostava muito: pães e cartas, mais especificamente cartas de amor.

Eu nunca havia recebido nenhuma, mas já tinha escrito milhares, e isso não é nenhum exagero. Milhares de cartas para milhares de pessoas. Não pessoas que eu amava.

Eu trabalhava como escrevente em uma pequena empresa chamada Luigi's Scrivano, ou seja, eu era alugada para escrever cartas para as pessoas. Minhas preferidas, como já disse, eram as cartas de amor. Meu momento preferido era receber as pessoas cujos corações palpitavam só de ouvir o nome da pessoa que amava, e ajudá-las a colocar em palavras aquele sentimento inexplicável. Mais maravilhoso ainda era receber as respostas daqueles que estavam longe, que eram objeto de desejo. No geral era um bom trabalho.

Eu acordava às 05:30 e às 06:30 estava lá, onde ficava até 12:30. A partir desse momento é que meu dia realmente começava. Eu precisava correr para chegar ao meu próximo trabalho. A vinícola Brunello di Montalcino, onde se produziam maravilhosos vinhos. Ao menos, eu imaginava que deveriam ser maravilhosos, nunca pude colocar uma gota deles na língua.

O trajeto até a vinícola levava em média uma hora de caminhada, que eu fazia enquanto engolia meu almoço. Normalmente levava menos de uma hora pois eu apressava o passo. Se não estivesse em meu posto às 13:00 horas, 13:15 ao máximo, seria meu fim. Eram patrões rígidos, e com ele não tinha muita conversa.

E era lá, na vinícola que eu trabalhava com a minha segunda paixão: pães. Pães caseiros, quentinhos e crocantes, que eram usados na degustação dos vinhos, ou vendidos junto aos mesmos, para uma melhor harmonização, acredito.

Para mim não importava o propósito, bastava poder fazer os pães, trabalhar com algo que eu amava e ainda ganhar com isso. Podia não ser muito dinheiro, mas já era alguma coisa.

Meus dias sempre eram iguais, mas eu amava cada uma das manhãs, tardes e noites, desde o momento de sentar e datilografar por horas na máquina, até cruzar os grandes e elegantes portões da vinícola, passando por todas as videiras, sentindo o cheiro maravilhoso das uvas, pouco antes de serem colhida. Passar horas adicionando e incorporando ingredientes, deixar a massa descansar, crescer e então assar. Formas e mais formas quentes de pão caseiro, um atrás do outro, num ritmo frenético sem parar até que fossem 20:30.

Então eu tinha uma carona para ficar mais perto de casa, onde eu deveria chegar por volta das nove, ou nove e meia, dependendo do dia.

E mesmo assim, ainda não era hora de descansar. Ainda precisava preparar o jantar para Henrico, meu marido, que já estaria em casa, me esperando.

Sempre que eu podia, arrancava pequenos pedaços da massa do pão e enfiava nos bolsos do meu avental de estopa. Pequenos pedaços por vez. Não era nada que faria falta a eles, mas que me salvavam nos meses difíceis, Assim, quando chegava em casa, eu poderia dividir e assar a massa pega escondida, e teria pequenas versões do mesmo pão da vinícola.

Quando cheguei em casa, podia sentir meus pés cansados reclamarem, mas os forcei a aguentar mais um pouco. Henrico estava cochilando em sua poltrona e eu não quis acordá-lo até o jantar estar pronto.

O mais rápido que pude, preparei o bolo de carne, a salada e a acquacotta, uma sopa cujo nome queria dizer água cozida. Consistia num caldo ralo, feito a base de água, obviamente, pão amanhecido, e sobras de vegetais, normalmente os que estivessem prestes a apodrecer na despensa, e com sorte um pedaço de carne. Os pães estavam quase prontos e eu comecei a pôr a mesa. Quando estava terminando, pude sentir dois braços fortes me segurando, e na mesma hora senti o coração disparar com o susto. Antes que eu pudesse gritar, Henrico disse:

Bella CiaoOnde histórias criam vida. Descubra agora