***Aviso de gatilho***
Esse capítulo possui conteúdo sensível
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Capítulo XIII
Na sexta-feira, eu estava anormalmente cansada e sonolenta. Eu mal podia prestar atenção no que os clientes diziam, muito menos no que acontecia ao meu redor. Eu tinha consciência de que Nicole e Cordelia continuavam trocando farpas durante o dia, mesmo que Cordelia estivesse mais quieta desde o dia anterior.
Algo em Nicole me inquietava. Ela provocava todas as moças, não só da Scrivano, mas da cidade toda, como eu vinha percebendo. Ela me provocara, no dia anterior, ao fazer a infame sugestão de que eu era adúltera.
Mas algo fazia com que eu não pudesse odiá-la. Não totalmente.
Eu dispensei meu cliente ao terminar o atendimento e fui ao banheiro. Eu também estava indo ao banheiro muitas vezes naquele dia. E eu nem estava bebendo tanta água assim.
Eu não tinha visto a família Sartori desde o dia da festa. Ainda não tinha entregado o recado e os pertences que Maria me entregara a Antônio. Maria. Ela também vinha perturbando meus pensamentos ultimamente. A imagem de seu corpinho encolhido e os olhos azuis chorosos e úmidos não saiam de minha mente. O modo como seu humor oscilava rapidamente, a preocupação estampada em todo seu rosto e seus gestos ariscos.
Eu suspirei e lavei o meu rosto com água gelada, vendo se o frio me faria ficar mais desperta, e então voltei ao trabalho. Aquela manhã pareceu passar muito lentamente.
-Eu me pergunto, Cordelia - olhei para trás e vi Nicole se inclinando na direção da mesa de Cordelia - Como você o convenceu a sair de casa todos os dias de noite, pra você poder levar o seu amante?
Novamente esse assunto. Ela não se cansava?
Observei Cordelia semicerrar os olhos, segurando-se para não devolver a provocação.
Nicole sorriu e voltou ao trabalho.
Eu admito, ela era cruel, mas era esperta. Há quanto tempo ela vinha nos observando, coletando informações? Quais seriam seus objetivos com isso?
-Amélia? Você está bem?
Eu me sobressaltei, olhando para frente e vendo Giuseppe me esperando, pacientemente. Ele estendeu uma mão e me ajudou a juntar minhas coisas antes de sairmos.
-Você está bem? - ele voltou a perguntar, depois que já estávamos do lado de fora.
-Sim, estou um pouco sonolenta hoje, não sei porque, mas estou bem, obrigada - eu garanti-lhe.
-Você entregou o colar para Antônio? - ele perguntou, de sobrancelhas erguidas, curioso.
Argh.
-Ainda não - eu resmunguei, tirando o relicário de dentro da minha bolsa. Ele estava dentro de um saquinho de cetim que eu o tinha colocado, junto ao dinheiro que Maria tinha me entregado.
Eu não a tinha visto durante todo o dia. Eu sabia que algo estava prestes a acontecer. Eu sentia isso em minha pele, tão palpável quanto as cartas misteriosas que ela e seu remetente, também misterioso, trocaram.
"Às 21 horas na estação".
Eu sacudi a cabeça e tentei deixar esse assunto de lado.
-Bem - Giuseppe suspirou, ao sentarmos na grama - Eu não estou com muita vontade de escrever hoje. Que tal escrevermos um pequeno recado e podemos ir até a casa para você ver como está ficando? Acho que Antônio está por lá.
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Bella Ciao
RomanceAmélia tem uma paixão por cartas de amor, mesmo sem nunca ter recebido uma. Ela está acostumada ao trabalho e a vida pacata na pequena e tranquila villa italiana, que nem mesmo a guerra conseguiu agitar. Apesar da vida simples, ela é feliz no trabal...