Capítulo XLIII
A Véspera de Ano Novo chega, por mais que eu desejasse combater o tempo. Por mais que eu queira voltar para Montalcino, não consigo suportar a ideia de sair de perto da minha família mais uma vez.
Tento aproveitar cada segundo ao lado deles, quando percebo quão pouco falta para irmos embora. Decoramos a casa e cozinhamos juntos, mas já começo a sentir saudades. Eu e Romeu penduramos velas pela casa, com alguns ramos para decorar, enquanto minha mãe e Gabrielle cozinham as lentilhas, e Giuseppe limpa e tempera a linguiça cotechino. Quando tudo está pronto, vamos nos vestir e nos preparar para a noite de festividades. Minha mãe me mostra um de seus vestidos, um verde de mangas compridas. O vestido que eu sempre amei nela, e que sempre quis um igual. Ela o oferece a mim. Gaguejo, dizendo que não poderia aceitar, mas, por dentro, estou borbulhando de expectativa.
-Use, querida. Você vai ficar linda.
Eu aceito. Uso a pulseira que Giuseppe me deu. Arrumo o cabelo de Gabrielle, e ela me empresta suas maquiagens. Nos reunimos na sala, ao mesmo tempo em que Romeu está saindo de seu quarto. Ele sorri para nós.
-Vocês estão deslumbrantes - ele se aproxima e abraça Gemma. - Linda como sempre, mamãe.
Minha mãe sorri, e toca o rosto dele com carinho.
-Você é sempre tão gentil em suas palavras, querido.
Eu sinto o olhar de Giuseppe em mim. Olho em sua direção, mas ele parece estar ajeitando os botões de seu casaco. Mas assim que olho para longe, posso sentir seu olhar novamente. Gabrielle parece ter percebido também. Sempre brincalhona, ela me cutuca e provoca:
-Ah, Amélia, parece que Giuseppe não consegue parar de te admirar.
Romeu ri, e ergue uma sobrancelha na direção dele, que agora está com o rosto baixo, com um sorriso contido, e um rubor se espalhando.
-Bem, é verdade. Tinham que ver o jeito que o rosto dele mudou.
Giuseppe deixa escapar um riso pelo nariz. Ele finalmente ergue o olhar para mim, e eu sorrio para ele.
-Bem, se me permitem, as três estão muito elegantes e belas.
Minha mãe sorri para ele.
-Obrigada, queridos. Agora, o novo ano se aproxima, precisamos começar a dar as boas vindas para ele.
Nos agasalhamos, e deixamos a comida esquentando no forno enquanto caminhamos até a igreja. Lá, acendemos velas, ouvimos algumas canções e expressamos nossos desejos para o próximo ano. O clima nas ruas é de antecipação. Há muito pedimos pelo fim da guerra, e para que nos recuperemos do que o mundo vem vivendo, mas depois de aguentar cinco anos de conflito, acho que todos ficaram um pouco ansiosos, e sem saber o que esperar do que vem pela frente. Voltamos para casa a tempo de comermos e aproveitarmos. Posso sentir a antecipação e a reflexividade pairando no ar, assim como todos, mas também algo a mais. Minha família sempre foi um bando de esperançosos, inclusive eu, então, é do nosso feitio sempre esperar pelo melhor, e algo tão grande quanto a chegada do ano novo, não seria diferente.
Nos reunimos ao redor da mesa, nos servimos da comida preparada mais cedo, feita para trazer sorte e prosperidade para o ano que está por vir. A conversa flui livremente, e risadas se espalham pela mesa. O clima melhora conforme ouvimos músicas no rádio e passamos tempo juntos. As melodias suaves de canções românticas começam. Eu troco um olhar com Giuseppe, e ele já está estendendo a mão para mim. Eu a aceito com um sorriso, e ele me puxa para perto, nos fazendo balançar para lá e para cá pela sala, rindo. Ele beija o topo da minha cabeça, recostada contra seu ombro, e ele envolve minhas costas com seus braços, e continuamos balançando ao som lento da música. A melodia preguiçosa, e meu coração batendo com força no peito me impedem de notar que minha família deixou a sala. Só percebo quando eles retornam, pigarreando ao fim da música. Eu e Giuseppe nos afastamos, olhando para eles.
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Bella Ciao
RomanceAmélia tem uma paixão por cartas de amor, mesmo sem nunca ter recebido uma. Ela está acostumada ao trabalho e a vida pacata na pequena e tranquila villa italiana, que nem mesmo a guerra conseguiu agitar. Apesar da vida simples, ela é feliz no trabal...