Capítulo XLI

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Capítulo XLI

Quando acordo, uma mistura interessante de emoções borbulha em meu peito. Primeiro, sinto o cheiro do perfume da minha mãe, e dou um sorriso, acalentada pela familiaridade. Meu sorriso vacila. Espera, minha mãe? Temo, por um momento, acordar e ver que foi só um sonho, mas basta piscar os olhos, espantando sono, e olhar ao redor para confirmar onde estou. Essa não é a casa da minha infância, claro, senão estaríamos ainda em Montalcino, mas é a casa onde minha família vive há quase cinco anos, então também me é, de certa forma, familiar.

Eu me espreguiço, devagar. Me permito aproveitar cada momento com calma. Calço as pantufas e me enrolo no robe macio e quentinho. À luz da manhã, e depois de todas as emoções do reencontro já terem sido exploradas, noto mais detalhes da casa. As decorações de Natal, simples, com velas, enfeites caseiros, e arranjos de flores e ramos de pinheiro. As fotos em molduras, com toda a certeza, são o que mais chamam a atenção. Não me lembrava de que as tínhamos. Claro, me recordo de posar para uma ou duas, mas elas sempre foram - e ainda são - tão caras e de difícil acesso. Mas lá estão. Além de imagens de mamãe, Romeu e Gabrielle, vejo meu pai, Agnes e Matteo, e é bom saber que jamais me esqueci de seus traços, que seus sorrisos e olhares ainda são familiares. Seguro um dos porta-retratos, a última foto em que estava a família toda, e traço com o dedo as feições daqueles que não estão mais aqui. Meu peito aperta com a saudade, mas, como minha mãe tinha dito, nós continuamos vivendo.

Exploro mais as fotos, e vejo meu próprio sorriso em alguns retratos, o que me desperta uma surpresa. Quem eu vejo nas fotos tem meu rosto, mas é diferente. Não só por ser mais jovem. Tão viva e inocente. Uma vida toda antes de Henrico, antes de saber o que era se sentir machucada e confinada. Tantas lembranças felizes e marcantes, tantos sentimentos bons. Tudo o que deixei que ele tirasse de mim. Risadas ecoam em meus ouvidos, me despertando, e não sei diferenciar se são memórias, ou se são reais, vindas da cozinha. Na dúvida, vou até lá.

Ainda estão todos de pijama, e Giuseppe está de pé, recostado à bancada, com uma xícara de café nas mãos, rindo e sorrindo enquanto conversa com minha família. Ele me vê, e uma sensação quente se espalha pelo meu peito. Ele. Foi ele quem me trouxe até aqui. Giuseppe me reuniu à minha família. Eu devo isso a ele. Seu braço se estica, me convidando para seu abraço. Eu aceito, me aconchegando enquanto ouço os "bom dia" de todos. A sensação no meu peito se torna mais forte, se espalhando mais ainda, como se corresse pelas minhas veias. É boa, familiar, natural. Como se eu sempre tivesse pertencido àquele abraço.

Giuseppe se inclina e sussurra ao meu ouvido:

-Bom dia, meu amor.

Eu dou um sorriso, sentindo um arrepio bom se espalhar pela minha pele. Me sento à mesa, aceitando a xícara que Gabrielle me oferece. Romeu corta uma fatia de pão e me passa a manteiga.

É tudo tão insano que quase faz minha cabeça girar. Há quatro anos estou ausente de todos os momentos importantes e felizes da minha família. Há três anos eu não os via. A última vez que estivemos juntos, foi para velar meu pobre irmão. Nenhum de nós comeu muito durante a semana que levou para que Matteo falecesse, e no dia do velório, então, não comemos nada. Chegou a hora, e tive que voltar para minha vida em Montalcino. Perdi aniversários, festas, feriados. Perdi tudo. Até mesmo dias comuns, dias não tão bons, mas que eu deveria estar presente, como a primeira paixão de Gabrielle, e seu coração partido. Tudo isso, me escapou pelos dedos, como areia.

Mas bastou uma tarde, e tudo isso pareceu ficar para trás.

Minha mãe decidiu que seria bom decorar uma pequena árvore para o Natal, então todos concordamos e ajudamos. Vamos ao mercado, comprar mais comida para a noite, já que minha mãe e meus irmãos não contavam com duas pessoas a mais. Dou uma escapada para comprar presentes para minha mãe e meus irmãos. Precisei improvisar, dadas as circunstâncias, e implorar em uma joalheria que fizessem meu pedido de última hora. Eu já tinha perdido o suficiente, não iria perder a oportunidade de presentear minha família.

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