Capítulo 66

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Angel

— Posso entrar?

Não tem nenhum espelho na minha frente, mas tenho certeza de que aparento ter visto um fantasma.

— Claro. — É o que digo quando as palavras voltam a fazer sentido na minha cabeça.

Benjamin adentra o meu quarto e a primeira coisa que faz é sentar na minha cama. Ele está claramente exausto, como se pudesse cair no chão a qualquer minuto. Mais algumas milhares de perguntas aparecem na minha cabeça.

— O que aconteceu? Você... — Penso em inúmeras coisas para perguntar sobre o seu estado: "Você bateu em alguém?", "Você bebeu?", "Voltou na escola e destruiu ela?" — O que aconteceu? — Mas decido insistir com essa até que ele tenha condições de responder todas as outras.

— O que aconteceu foi que aquele filha da puta bateu no meu irmão. — Benjamin não parece estar lúcido, mas apesar disso ainda não senti nenhum cheiro de bebida. O desespero de algumas horas atrás começa a aparecer de novo.

— Benjamin, você bebeu? — Se ele  pretende não fazer nenhum sentido, tenho ao menos o direito de saber com o que estou lidando. Dependendo da sua resposta, não vou me importar de virar uma garrafa de uísque inteira goela abaixo.

— Não anjo, eu não bebi. Eu só... — Ele suspira fundo e deixa a sua cabeça cair entre os joelhos, o seu ar de quem já não aguenta mais está claro como nunca. A cena me dá a sensação de que as duas perguntas que fiz soaram como um interrogatório nesse momento, e eu quero me desculpar inúmeras vezes por isso, mas apenas fico quieta, perdida na minha própria exaustão. — Deita aqui comigo, por favor. — Benjamin pede com tanto carinho que eu não poderia recusar nem mesmo se o odiasse, e nós dois sabemos que esse não é o caso aqui.

Caminho até a cama apreensiva, no entanto, é um alívio enorme saber que ainda posso tocá-lo, saber que ele ainda é meu. A luz escura do quarto só me permite ver o seu vulto, mas percebo que Benjamin está tirando as suas roupas. E apesar de o momento não ser o mais apropriado, não posso evitar pensar no seu corpo nú. Me deito ao seu lado, evitando ficar muito próxima, mas ele me puxa para o seu peito. Por um segundo, é como se nada tivesse acontecido. Somos apenas eu, ele, nós. Contorno as tatuagens espalhadas pelo seu corpo, sentido com a ponta do meus dedos todos os detalhes que eu já sei de cor. Posso escutar o seu coração lentamente se acalmando e a sua respiração voltando ao normal. Ainda não falamos nada, mas esse é um daqueles momentos que dispensam palavras.

— Nós levamos o Anthony para o hospital. — É a primeira coisa que Benjamin fala depois de 40 minutos em silêncio. Fico feliz que consegui uma explicação sem precisar pressioná-lo de novo. — Eu avisei os meus pais e aí a gente levou ele para o hospital.

— Os ferimentos são graves? — Não tem uma maneira sutil de fazer essa pergunta, então tento compensar por isso olhando em seus olhos.

— Não muito. O médico disse que o mais grave foi ele ter batido a cabeça quando caiu no chão.

Me deito no seu peito de novo, só que dessa vez tento procurar por resquícios de raiva no seu rosto. A parte boa, é que não encontro nenhum, a ruim, é que a mágoa está estampada por todo lugar.

— Ele já está em casa?

— Sim, chegou há alguma horas. Alguns dias de repouso e remédios, e ele já está pronto para voltar à ativa.

— Se ele precisar de uma babá, eu estou disponível, qualquer dia. — Tento deixar o mais claro possível, porque eu realmente não me incomodaria de largar tudo e ir cuidar do Anthony. A imagem do seu rostinho todo machucado ainda vai me atormentar por muito tempo, e  nem consigo imaginar o quão horrível deve ser estar na pele de Benjamin agora.

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