Capítulo 1

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Angel

Observo o carro fazer a curva na rodovia e sei que daqui a alguns minutos estarei no meu dormitório. É o começo de uma nova vida para mim. Eu finalmente vou estar fazendo as minhas próprias escolhas, sem pais, fofocas da cidade pequena ou os curiosos de plantão. Tudo isso ficou para trás.

— Eu ainda acho que você deveria ter esperado pelo menos um ano para começar a faculdade. — Minha mãe fala com o seu olhar hostil de sempre. Um dos motivos para eu ter decidido sair de casa tão cedo.

— Vai dar tudo certo. — falo, olhando pela janela do carro como se estivesse vendo o paraíso. Considerando a cidade minúscula aonde eu morava, isso aqui é realmente o paraíso. Até mesmo o trânsito perigoso, grita oportunidades novas. E o mar bem no começo da cidade, grita diversão.

— Apenas se lembre que você está aqui para estudar e não outra coisa. Qualquer deslize seu e vamos te arrastar de volta para casa. — Meu pai fala com a voz ríspida. Depois de crescer com ele, sei que o seu tom de ameaça não é por engano e isso é como um soco no estômago, mas volto a pensar que daqui a pouco ele e minha mãe vão estar bem longe de mim.

Quando o carro para, olho para o edifício velho com a adoração de um crente. Ao meu redor estão chegando pessoas de todos os lugares. Algumas tem o mesmo sonho que eu no olhar, outras tem a tristeza de estarem aqui por obrigação. Só consigo pensar em quantos amigos eu vou poder fazer aqui, afinal é uma cidade grande e eu era estranha demais para a cidade pequena.

— Nós vamos ir com você na recepção para conferir se está tudo certo.

— Não precisa! — respondo, quase de imediato para a minha mãe, fazendo a sua sombrancelha erguer com um olhar de reprovação. — Eu quero dizer que agora eu vou ter que aprender a fazer as coisas sozinhas. E também se alguma coisa estiver errada eu vou ligar para vocês.
— minto. Eu não pretendo ligar para os meus pais, só algumas vezes para eles saberem que estou viva, mas ao contrário disso vou resolver os meus próprios problemas. Eles nunca foram bons em resolver problemas mesmo, mas eram os melhores em criar, principalmente os desnecessários.

Me despeço da minha mãe e do meu pai. Guardo na mente a imagem dos dois sorrindo para mim com lágrimas nos olhos, enquanto eu me viro para ir embora. Sem berros, sem discussões e nem dores do passado. É dessa forma que eu vou me lembrar dos meus pais nessa vida nova.
Quando entro na recepção para os calouros, um garoto oferece ajuda com as minhas malas e eu aceito, ele parece mais velho, o que me leva a pensar que já está aqui a algum tempo e conhece todo o processo.

— Você sabe onde fica o seu quarto? — ele pergunta.

— Pavilhão B... A23. — falo, conferindo no papel que a moça da recepção me deu.

O quarto não é difícil de encontrar e durante o percurso vejo vários pais chorando e filhos também. Penso nos meus pais e por um milésimo segundo desejo que eles estivessem aqui para nós podermos fazer isso, mas então eu me lembro que eles provavelmente começariam a achar defeitos em todo lugar e a saudade passa.

— Chegamos... A23. — O menino anuncia, sorrindo para mim. — Você vai dividir o quarto com uma amiga minha. Ela é bem divertida, acho que você vai gostar. — Ele pisca e vai embora logo depois que eu agradeço pela ajuda.

Abro a porta do meu quarto com as mãos tremendo. Não sei ao certo o que vou encontrar, mas com certeza vai ser melhor do que tudo que eu tenha vivido nesses últimos dezoito anos.
Vejo então uma garota de pele amarela, olhos puxados, cabelos negros e corpo miúdo esparramada na cama.

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