Capítulo 34

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Benjamin

O plano de ser gentil foi por água abaixo da pior maneira possível. E todos os palavrões que eu evitei usar essa noite estão berrando dentro de mim. Eu apresso os meus passos até chegar ao jardim e grito. Porra, eu finalmente grito!
É como se eu pudesse sentir cada membro do meu corpo ardendo de ódio. É como se eu pudesse realmente voltar lá e matar aquele filha da puta!
Eu vi os olhares horrorizados que todos lançaram na minha direção. Eu sei que eles vão me julgar como se tivessem alguma moral para fazer isso, mas eu não me importo. Eu faria tudo de novo. Aquele merdinha vai se curar de todos os ferimentos daqui a alguns meses, mas a cena que eu tive que presenciar vai ficar para sempre na minha cabeça. E quanto a Angel? Eu nem sei como ela deve estar se sentindo. Isso com certeza vai ser um trauma para o resto da sua vida, e tudo isso porque um filha da puta não conseguiu manter o seu maldito pinto na sua maldita calça. A vontade de gritar vem a tona de novo, mas dessa vez eu não vou ficar aqui parado  gritando que nem um otário. Eu vou voltar lá dentro e terminar o que eu comecei. E não há nada e ninguém que possa me impe...

— Benjamin! — Escuto um grito atrás de mim. É ela. Eu sempre vou reconhecer a sua voz, não importa o lugar e nem a situação. Me viro para trás e vejo Angel com as mãos tremendo e os olhos arregalados me encarando. Não sei o que esperar dela ou o que falar. Me lembro de encontrar os olhos de Angel no meio da multidão horrorizada. O seu medo era nítido, e eu não a julgo, afinal ela teve que me presenciar quase matando uma pessoa, e apesar daquele lixo merecer estar morto, ainda é uma cena muito forte para se ver. Eu vou entender se ela me xingar, ou me pedir para nunca mais falar com ela, ou até mesmo fugir. Eu provavelmente vou chorar que nem um bebê, mas isso não importa.
— Você está bem? — De todas as perguntas que me passaram pela cabeça essa com certeza não foi uma delas. Ela literalmente acabou de ser atacada e quer saber se eu estou bem? Isso é empatia demais até mesmo para Angel.

— Você não acha que deveria se importar um pouco mais com o seu bem estar agora? — Ela olha para mim confusa como se o que eu estivesse falando não fizesse o menor sentido. Se fosse qualquer outra pessoa eu provavelmente já estaria gritando coisas como: você tem atraso mental ou o quê?

— Você não respondeu a minha pergunta.
Parece que ela está tentando me tirar do sério... Respiro fundo e decido que uma discussão é a última coisa que ela precisa nesse momento.
— Sim Angel, eu estou bem.

— Que bom. — É tudo o que ela fala. Eu não ganho uma resposta sobre como está a sua situação depois de todos esses acontecimentos infelizes. Eu vou surtar!

— E você, como está? — pergunto calmamente, escondendo o fato de que estou a ponto de explodir por dentro.
Ela olha para si mesma e solta um suspiro cansado, devo admitir que ele faz toda a raiva dentro de mim ser substituída por um sentimento de desolação.

— Eu vou ficar bem. — ela responde.
Sinto uma vontade insana de abraçá-la, mas permaneço imóvel. Os seus olhos ainda dilatados passam por todo o meu corpo. Não ouso olhar para baixo e ver o que é que Angel tanto encara, e não demora muito até eu começar a sentir dificuldade para respirar.
— Meu Deus, as suas mãos! — ela grita quando eu estou prestes a correr daqui. Não entendo o porquê da sua observação tão específica, até olhar para as minhas mãos e notar que elas estão cheias de sangue e machucados que mais tarde vão se tornar hematomas.

— Não estão doendo. — falo em uma tentiva de tentar acalmar Angel, que parece estar prestes a enlouquecer.

— Ainda assim você precisa cuidar delas. — Ela me puxa antes mesmo de eu ter a chance de falar qualquer coisa. Eu estaria mentindo se dissesse que não a acompanharia para qualquer lugar que ela fosse.
Quando entramos na casa novamente, a festa já parece ter esquecido de tudo. Angel me empurra para o banheiro no andar de baixo e tranca a porta. Ele é menor do que o banheiro no andar de cima e isso fica explícito no momento em que nós dois o adentramos. Acho que eu nunca senti tanto calor na minha vida...
— Senta ali. — Ela aponta para a privada. Eu a obedeço como um bom cãozinho adestrado. Nunca percebi que gostava de receber ordens de mulheres bonitas... Ou talvez eu só goste quando é Angel ordenando.
— Aí meu Deus, esses sapatos estão me matando! — ela resmunga, revirando os olhos e logo começa a tirá-los. Dou risada porque ela parece uma daquelas mulheres ricas e metidas enquanto reclama.
Alguns minutos depois, Angel inicia uma busca por alguma coisa no armário da pia. Eu a observo atentamente, me permitindo admirar o seu vestido. Por Deus, que vestido...
Ele foi um dos motivos pelos quais eu não consegui ignorar Angel essa noite. Afinal, eu tinha um plano: ser gentil com todos, mas principalmente com ela. Porém do começo ao fim, esse plano foi um fiasco. Toda vez que eu tentava me aproximar, Angel deixava bem claro o quanto queria distância de mim. Eu nunca vi alguém reagir tão mal ao meu sussurro no ouvido!
Eu entendi o recado, ela queria que eu me afastasse, então foi isso o que eu fiz, mas depois de passar quase duas horas longe de Angel eu percebi que estava tentando em vão mais uma vez.
— Achei! — ela diz com um pano branco na mão. Sorrio com a sua empolgação e com o fato de ela estar preocupada comigo. Angel começa a molhar o pano para lavar meus machucados e eu a admiro, enquanto tento inutilmente parar de sorrir. Eu poderia dizer para ela que eu já tive cuidar de inúmeros hematomas na infância e que duvido que ela seja melhor do que eu nesse quesito, mas decido não fazer isso, afinal, eu seria o único a sair perdendo.
— Se eu estiver te machucando, você me fala, tá bom? — ela avisa com uma gentileza majestosa. Concordo com a cabeça como uma criança. A criança mais feliz do mundo. Angel começa a lavar os machucados. Ela passa o pano pelas palmas das minhas mãos e pelas minhas falanges, checando a todo momento qualquer sinal de dor vindo de mim. Eu acho hilário o fato de ela não perceber o quanto eu adoro o seu toque. Não importa qual seja a condição da minha pele, eu simplesmente adoro ser tocado pela pele dela. Angel literalmente poderia estar me batendo e eu provavelmente agradeceria por isso.
— Então... — Ela deixa de se concentrar nas minhas mãos por um minuto e olha para mim — Você costuma brigar muito? — Não era uma pergunta que eu estava esperando, e com certeza não é uma pergunta que Angel está confortável em fazer. 

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