Entre nós

Cap 13

Era segunda-feira às 10h, e eu já tinha trabalhado o equivalente a um dia inteiro. Ângela deveria ir para a próxima viagem com a Sarah, mas como ela tinha alguns compromissos inadiáveis agendados para a mesma data, a senhora Miller instruiu que eu fosse em seu lugar, me deixando um pouco mais nervosa do que eu já estava. Viajar com minha chefe não seria nenhum problema, se obviamente não tivesse acontecido todas as coisas que já aconteceram até aqui, e se atrelado a isso, não tivesse o agravante de eu estar completamente envolvida em seu charme, e inclinada a me deixar levar por seu magnetismo natural.

A viagem dessa vez seria para os Estados Unidos, mais especificamente para duas cidades da Flórida, e uma passada rápida na Geórgia. Eu já me sentia mais segura quanto às minhas responsabilidades referentes à viagem, já tinha resolvido todas as principais pendências, confirmado as reuniões e eventos, e decidido pessoalmente com a Sarah sobre as exigências dela quanto ao período que estaríamos fora do país. Eventos importantes estavam na lista, uma das festas mais esperadas do ramo da alta joalheria também, e eu iria no ateliê no final do expediente para provar as roupas, já que a viagem seria em menos de uma semana.

— Estamos bem. — Disse para Júlia que me encarava enquanto Shirley apertava o meu vestido marcando um pouco mais a cintura. — Eu entendi o lado dela, conversamos e nos acertamos.

— Esse decote poderia ser um pouco mais sensual, a festa é puro glamour, você tem alguma restrição?  — Neguei olhando nos olhos da Shirley, confiava completamente no bom gosto dela. Ela assentiu e saiu levando o vestido, e eu coloquei um roupão de seda aguardando ela voltar com a peça, já que tínhamos pouco tempo.

— E você prova mais uma vez que nasceu para ser trouxa, novidade nenhuma. — Encarei minha amiga e revirei os olhos frustrada.

— Você mesma confirmou que não aconteceu nada entre ela e a Polly. E no bar, foi apenas ciúmes. O que é normal, não? — Me sentei ao seu lado e tomei um pouco de água.

— Pense o que quiser, você é mais burra que uma porta, eu desisto de você! — Ignorei e me levantei quando Shirley apareceu terminando os ajustes das peças. 

A Paula não escondeu o incômodo ao saber que mais uma vez eu estaria indo viajar com a Sarah. Enquanto eu arrumava as minhas coisas, ela me lembrava mais uma vez sobre o dinheiro que minha chefe tem, e o quanto pessoas como ela tendem a usar do poder, para manipular e usar as pessoas a sua volta apenas pelo prazer. E eu realmente sei que de certa forma é verdade, sei que eu deveria fugir das investidas discretas da Sarah, eu só não sei se consigo.

Naquela noite transamos como há muito tempo não fazíamos. Paula dormia ao meu lado seminua, e eu sequer conseguia relaxar. Levantei da cama, tomei um banho quente e fiz um chá. Sentada na sala em silêncio, meus pensamentos vagavam sobre a viagem das próximas horas, o medo, a expectativa, e o frio na barriga, estavam mais vivos do que na primeira vez.

Um arrepio percorreu lentamente da minha nuca até o meio das minhas costas. Me encostei um pouco mais no sofá na intenção de relaxar, do que eu tanto tenho medo afinal? De descobrir que a Paula realmente tem razão? Ou que a Sarah seja mais intrigante do que parece? Aquele olhar... seus malditos olhos acinzentados como uma noite sombria de inverno, me fazem congelar inteira só de lembrar. Ela é completamente diferente de qualquer pessoa que eu já conheci na vida, ela é fogo e gelo em total sincronia, e eu não faço ideia de qual é sua principal versão.

Meus olhos pesaram um pouco para abrirem naquela manhã fria. Eu simplesmente dormi no sofá em meio a um turbilhão de pensamentos, enrolada em uma manta fina que sequer conseguia me cobrir completamente. Meu celular estava com alguns lembretes, cartão de confirmação de voo, agendas, horários, e tudo quanto é responsabilidade para os próximos dias.