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Valéria começou a falar com um tom bem calmo:

_ Gillian, podemos conversar um minuto, estamos aqui com pessoas que você confia, seus pais, sua madrasta e seu namorado. Eles estão aqui por que querem saber como você está, você se lembra o que aconteceu?

_ Pouca coisa.

_ Você desmaiou na festa de reencontro com os seus amigos, e te trouxeram para cá. E agora estamos aqui com as pessoas que amam você para dizer a você o que está acontecendo.

_ Eu estou morrendo doutora, é isso o que está acontecendo.

_ Gillian preste atenção, eu sei que é um assunto delicado, mas estamos aqui para esclarecer qualquer dúvida que você possa ter, é um direito seu estar a par do que lhe acontece, isso é muito benéfico para nós médico e para você como paciente. Estamos aqui para ouvi-lo e trocar ideias também, o que queremos é estreitar o vínculo de confiança, tudo bem.

Ela deu uma pausa e como ele não manifestou em perguntar nada, ela continuou:

_ Nós estamos aqui com os seus exames e gostaríamos de falar um pouco com você sobre eles, se você quiser.

_ Eu quero saber tudo, quero saber de cada detalhe, fala logo o que precisa ser dito.

_ Muito bem Gillian, você já está ciente que é portador de ELA, uma doença degenerativa, e também está ciente das consequências da doença, fomos informados que você estava fazendo o uso da bengala, contudo na festa não estava com ela, é isso mesmo?

_ Sim.

_ Você estava ciente de que isso poderia acarretar em danos irreversíveis.

_ Sim.

_ Posso perguntar a razão pelo qual não estava usando a bengala Gillian?

_ Eu não queria aparecer diante do Jean e dos meus amigos como um doente, apenas uma noite eu queria voltar a ser um jovem normal.

Jean iria falar mais a psicóloga fez sinal para que ele permanecesse em silêncio:

_ Gillian, eu sei como se sente, acredite nada se compara ao que você sente nesse momento, mas você tem pessoas que o ama do seu lado, que irão te ajudar nessa fase mais difícil da doença.

_ Mais difícil... Fala, fala logo.

_ Você perdeu os movimentos inferiores Gillian.

_ Eu não irei mais andar?

_ Não Gillian, você não irá mais andar.

Gillian não gritou, não chorou, não esbravejou, ao contrário, estava calmo, conversando naturalmente, contudo depois os médicos assinaram a sua alta hospitalar.
Dentro do carro a caminho de sua casa no trajeto ele não abriu a boca, o levaram ao quarto assim que chegaram e seus pais, Jean e Gláucia tentou se aproximar, ele primeiro ficou uns cinco minutos em silêncio, sua mãe o beijou na testa, e ainda a permanecer em silêncio ele conduziu o olhar a Jean:

_ Pai, mãe, Gláucia, podem me dar um minuto a sós com o Jean, precisamos ter uma conversa.

Os três obedeceram em silêncio, mas dona Solange abraçou Jean pedindo:

_ Estarei aqui fora. Qualquer coisa me avisa imediatamente?

Concordando com um risco em seus traços faciais que poderia ser considerado um sorriso, Jean fechou a porta do quarto assim que eles saíram:

_ Estamos sozinho Gill.

_ O que faz aqui? _ Jean o que pensa que está fazendo, o que é que você faz aqui?

A pergunta saiu em um tom bem seco:

_ Estou aqui para ficar com você. Eu quero estar com você.

_ Eu estou morrendo Jean. Não posso te condenar a morrer junto comigo, vai embora, vai viver a sua vida.

_ Eu quero estar presente na sua vida, eu quero oferecer o que você precisa e não o que eu acho que você precisa tudo o que eu quero é que você viva até o último minuto, e eu quero compartilhar com você e comemorar esses minutos. Não me exclua da sua vida Gillian, por favor, não me exclua.

_ Você acabou de ouvir a doutora Jean, eu vou ficar para sempre em uma cadeira de rodas, e daqui para frente irá ser pior, acorda Jean eu estou morrendo, como posso te prometer que vamos compartilhar e comemorar bons momentos?

_ Ninguém é eterno Gill, todos um dia iremos partir, mas eu estou aqui para ouvi-lo, para amá-lo, para viver com você todos os momentos, pode ser dias, meses, anos, mas eu estarei aqui com você.

_ Como vai me escutar Jean, se em breve eu nem mesmo irei falar?

_ Eu não aceito que você viva como se já estivesse morto. Eu não vou te velar enquanto não chegar à hora, eu não vou te tratar como um doente, por que essa doença não define quem você é, e o que significa para mim.

_ Eu estou com medo Jean, eu tenho medo do que está por vir.

_ Eu sei que está com medo, e que tudo isso que tem enfrentado está o angustiando e fazendo com que se questione em vários aspectos, mas me permita encontrar as respostas que eu estou me questionando ao seu lado, se for para chorar, vamos chorar juntos, mas mesmo que me peças Gillian, eu não sairei de perto de você, eu não vou deixar que me excluas como fez há dois anos.

_ Eu nunca quis te excluir Jean, eu não fiquei feliz em terminar com você, tudo o que eu fiz foi pensando no seu bem.

_ Você é um bobo, se acha que ficarei bem sem você Gillian, por favor, eu sei que não podemos florear o que está acontecendo, que é algo sério, e que não podemos mudar, mas enquanto estiver aqui, eu juro que farei o possível e o impossível para que tenha uma vida sendo amado, cuidado e tranquilo.

_ Você está se ouvindo Jean, cuidado, eu precisarei de cuidado.

_ Todos nós precisamos de cuidado, de ser acarinhado, amar não é cuidar, não é caminhar lado á lado nos bons e maus momentos. Eu não estou pedindo algo surreal Gillian, tudo o que estou pedindo é que me deixe ficar ao seu lado, por que o amo, por que é o meu desejo.

Gillian começou a chorar:

_ Eu também te amo, amo demais, não é justo tudo isso, eu tinha tantos planos, tantos sonhos, e essa doença acabou com tudo, acabou Jean.

_ Não acabou, nós podemos viver esses sonhos juntos, fazer de cada minuto um sonho Gillian, eu estou aqui com você.

Jean se sentou ao lado dele na cama, debruçou-se a tocar seus lábios ao dele lentamente e ali os dois não aguentaram a emoção e choraram juntos:

_ Eu te amo Jean.

_ Eu também Gillian, também te amo.

Meu ex - O tempo não paraOnde histórias criam vida. Descubra agora