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Jean colocou o garotinho no banco de trás com todo o cuidado, e ocupou o banco do passageiro ao lado de Beto que sorriu surpreendendo o rapaz a puxar assunto:

_ Quando o Douglas me convidou para um jantar em sua casa, eu nunca imaginei te encontrar ali.

_ Eu também não imaginei te encontrar por lá.

_ Eu fiquei surpreso em ver o Gillian quando cheguei à casa do Douglas. Ele não me reconheceu de início, mas então eu o lembrei que havíamos nos visto ontem de manhã.

_ Tudo isso é muito novo para ele. Ele conheceu muitas pessoas de ontem para hoje, é natural que ele não tenha te reconhecido.

_ Me parece que ele já se adaptou.

_ Sim, aqui tem muitas pessoas mimando ele, criança são mais fácil de adaptarem aos lugares, nós adultos é que somos mais complicados.

_ Não está se adaptando ao lugar Jean?

_ Não é isso, eu cresci correndo nessas ruas, tenho muitas lembranças desse lugar, talvez seja esse o problema.

_ Está falando do seu namorado que morreu?

_ Em partes sim, as lembranças ainda são bem fortes.

_ Se não for muita intromissão, como foi que ele faleceu, algum acidente?

_ Por que imagina que seja acidente?

_ Por que pela foto que tem no sepulcro dele, percebe-se que ele era bem jovem.

_ Ele estava para completar 26 anos, e não, não foi acidente, ele morreu de ELA.

_ ELA?

_ Esclerose Lateral Amiotrófica. Uma doença que a medicina ainda não encontrou a cura, ela é degenerativa e progressiva.

_ Poxa tão novo. Eu sinto muito.

_ Faz dez anos.

Jean deu de ombro:

_ Então quando adotou o seu filho, ele já tinha falecido.

_ Sim..

_ Ainda assim disse a ele que o rapaz era o pai dele?

_ Era o nosso sonho adotar uma criança.

_ Compreendo, isso mostra claramente que era apaixonado por ele.

_ Sim, eu era mesmo apaixonado. Fomos felizes enquanto podemos.

Jean sentiu um olhar inquietante por parte dele:

_ Você é mesmo um rapaz intrigante Jean.

_ Eu intrigante? _ Por quê?

Beto moveu a cabeça hesitante:

_ Nada... Nada não.

_ Fala... O seu olhar não me parece um nada.

_ Tá certo, então eu vou falar, não me entenda mal, mas por que dizer ao menino que o pai dele morreu se o seu namorado nem chegou a conhecê-lo, desculpa, mas eu não entendo, eu imagino que tenha sido uma história muito bonita a de vocês, mas acha que é justo com o garoto?

_ Como assim não é justo com o garoto?

_ Ele é seu filho Jean... Você me parece ser um bom pai, e será a única referencia que ele tem, ainda que fale que o Gillian é o pai dele, que referencia o seu filho terá... Um pai morto?

_ Eu entendo que você pense assim, você não conheceu o Gillian.

_ Tem toda razão, eu não conheci.

Os dois ficaram em silêncio que foi quebrado por Beto:

_ Desculpa, eu não tenho nenhum direito de falar sobre isso.

_ Eu entendo que você pense dessa forma, o Gillian teria sido um pai incrível.

_ Eu não duvido disso. Baseando no que você me disse, sobre o motivo que o levou a dizer ao garoto que o Gillian é o seu pai, posso deduzir que você ainda não superou a morte dele?

_ Superar... Acho que jamais irei superar aceitar sim, eu aceito que ele descansou do sofrimento que estava vivendo, não é fácil para ninguém viver em uma cadeira de rodas, sem andar, sem falar, sem se mover, ainda mais para alguém tão jovem deveria ser angustiante para ele.

_ Com certeza era, mas e para você Jean, não é angustiante ficar preso a uma história que jamais poderá viver?

_ Não entendi, o que exatamente você quer dizer com isso?

_ O Gillian não está mais aqui, ele se foi, mas me parece que você se mantém nessa história durante esses 10 anos. Acredito que vocês dois se amaram muito, mas você não acha que precisa deixá-lo partir em paz?

Aquelas palavras o deixaram espantado, ninguém jamais havia dito isso a ele daquela maneira tão direta, todos diziam que ele tinha que seguir em frente, seguir a vida, mas Beto foi tão direto que o chocou:

_ Eu nunca neguei o fato de que ele partiu.

_ Durante esses 10 anos, por acaso se envolveu com outra pessoa, cogitou a ideia de dizer ao seu filho que ele tinha outro pai?

_ Outro pai? _ Não existe outro pai, não existe outra pessoa, o que eu vivi com ele não viverei com mais ninguém, eu fiquei com ele até o último minuto da vida dele.

_ Você cuidou dele até o último minuto da vida dele Jean, mas está na hora de deixar que alguém cuide de você... E do seu filho.

Jean nem percebeu que ele havia estacionado o carro, só percebeu quando ele enxugava suas lágrimas e aproximava os lábios dos seus iniciando um beijo, Jean retribuiu o beijo serpenteando a língua na boca dele, mas quando Jean se deu conta do que acabara de acontecer, empurrou Beto:

_ Por que fez isso, por que me beijou?

_ Eu não fiz isso sozinho Jean, nós dois nos beijamos.

_ Isso não podia ter acontecido, esse beijo não deveria ter acontecido. Eu agradeço a carona, mas posso seguir a pé.

_ Jean deixa disso, vai mesmo seguir nesse frio com o Gillian no colo?

Jean mordia o lábio inferior:

_ Tudo bem, mas que fique claro que esse beijo foi um erro.

_ Eu não vejo como erro, algo que nós dois estávamos querendo que acontecesse.

_ Por que acha que eu queria esse beijo?

_ Você está agindo assim por que acha que está traindo o Gillian, mas não está.

_ Você não tem o direito de bagunçar minha vida dessa forma.

_ Jean, olha para mim, me deixa cuidar de você, pare de usar o Gillian como subterfúgio.

_ De onde tirou a ideia que eu o uso como subterfúgio?

_ Olha para mim e diz que não gostou do nosso beijo.

_ É um teste, é isso o que está querendo provar, que o beijo foi bom?

_ Nega se for possível, você pode tentar fugir, mas não poderá negar.

Com cautela Beto levou as costas da mão a acariciar o rosto de Jean que fechou os olhos, logo Beto substituiu a mão pela boca beijando o rosto do rapaz, a tomar seus lábios novamente em um beijo lento que ganhava ritmo aos poucos, e entre o beijo ele pedia:

_ Vamos lá para minha casa, me deixa cuidar de você.

Meu ex - O tempo não paraOnde histórias criam vida. Descubra agora