05_ Quem é você?

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Depois de rolar por aquela cama tão macia, me levantei e olhei pelo quarto. Meus olhos pararam em um mural, notei uns recados pendurados em post-its e me aproximei para conseguir enxergar.

Haviam recados sobre estudar para provas de dias que já haviam passado, sobre comprar um presente de aniversário para o pai, que também já havia passado, sobre assistir a um filme da seção de tarde que me causaria nostalgia, que também já havia passado. O único recado que a data não havia passado, era um com a data de hoje:

Não esquecer de levar os cachorros quentes para a ação social do orfanato.

Fiquei confusa de cara, mas me lembrei sobre Isabela ter tido que eu costumo fazer caridade. Seria isso? Era sério?

Um sorriso me tomou novamente.

Eu iria ajudar um orfanato... Era tão especial quando algumas pessoas iam até o orfanato de Atlanta para doar coisas, as crianças ficavam tão felizes. Agora eu teria a oportunidade de fazer isso!

Saí do quarto, voltando ao andar debaixo e passei pela sala. Segui na direção de uma outra porta, deduzindo ser a cozinha, e acabei acertando. O cheiro de comida ali era maravilhoso. Haviam panelas no fogo que exalavam um cheiro tão bom que eu até perdi o foco por um momento.

Balancei a cabeça voltando a mim e abri a geladeira. Sorri ao ver que haviam mesmo muitos cachorros quentes embalados em papel alumínio ali dentro.

ㅡ Ui! ㅡ A mesma senhora apareceu na cozinha segurando uns tomates bem vermelhos. ㅡ Que susto, Ari! ㅡ Ela os colocou sobre a mesa e eu fechei a porta da geladeira.

A senhora se sentou na cadeira após colocar uma tábua de cortar carne sobre a mesa. Ali ela começou a fatiar os tomates.

ㅡ Onde está o meu pai? ㅡ Perguntei sem pensar muito. É claro que eu deveria ter pensado, afinal, eu me lembraria de tudo sobre meu pai como mágica. Mas, fiquei ansiosa. Eu nunca tive um pai na vida e agora eu teria...

ㅡ Ora, no trabalho. ㅡ  Ela disse como algo óbvio. Assenti sentindo vergonha de minha pergunta, mas ela me observou com um olhar compreensivo deixando a faca de lado. ㅡ Eu sei que você queria que ele descansasse um pouco. A sua mãe ter morrido foi uma grande perda para ele. Pessoas vivem seus lutos de modos diferentes. Talvez o seu pai só esteja tentando se distrair para não sentir tanto a dor. ㅡ Ela me sorriu de maneira carinhosa e voltou a cortar os tomates.

Saí da cozinha pensando no quanto aquilo era ruim. Nem no meu clichê perfeito eu tinha uma mãe. Com certeza, isso faz parte de algo que Molly planejou, mas... Mesmo assim era ruim.

Na sala, notei uns porta retratos sobre as estantes. Peguei um deles e vi que era uma foto minha com um senhor. Ele era baixinho, meio barrudinho e calvo. Acabei rindo da minha própria descrição.

Era estranho ver uma foto minha com uma pessoa que eu nem conhecia. Mas... Não era desconfortável. Pelo contrário, eu sentia como se tivesse vivido aquele dia.

Estávamos em frente a casa. Parecíamos voltar de algum lugar, talvez de um dia bem legal. Eu vestia um vestido preto com flores brancas. Ele tinha uma fenda linda e discreta na perna esquerda. Nos pés eu tinha um all-star branco. Meus cabelos, que sempre foram ondulados e bem pretos, estavam soltos. Na verdade, parecia que o vento o estava jogando no meu rosto e por isso eu estava rindo.

Sorri sentindo a vibe boa daquela foto. A coloquei no lugar e decidi voltar ao meu quarto. Meu quarto...

Após subir as escadas e entrar novamente em meu quarto, ouvi algo que parecia um celular vibrando. Segui o som até chegar na gaveta da escrivaninha. A abri e ali estava um smartphone preto. Uma capinha verde água com detalhes lilás o enfeitava.

Sobrevivendo ao meu Clichê IOnde histórias criam vida. Descubra agora