15. Detetive Van Dahl e doutora Sophie Seyfried

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Uns chamavam-lhe de "Cão de caça do Estado" por resolver inúmeros crimes outros mais invejosos de "bloco de gelo" por aparentar ter uma personalidade fria e distante. Embora ninguém fosse corajoso o suficiente para dizer isso cara a cara. A detetive, Valquíria Van Dahl, já tinha ouvido várias vezes esses boatos quando passava pelos corredores de piso linóleo do departamento de polícia de Nova Amsterdam.

Era complicada sua posição de detetive de homicídios, ainda mais, sendo ela, uma mulher de 33 anos - faria 34 naquele mesmo ano, só que daqui a alguns meses - bem-sucedida no que fazia. Já havia detectado vários tons de sarcasmo ou deboche de outros colegas, masculinos: "Mais um caso resolvido pela caçadora do Estado;" "La vai nosso cão de caça atrás de mais pistas;" "Será que ela é uma máquina viciada em trabalho?" "Ela encontrou o melhor osso." "Pode ser bonita, mas sem vida social, um cachorro solitário." Ela já havia se acostumado com esse cenário de guerra de vocábulos contra ela por ser a única mulher detetive no departamento de homicídios.

Ignorava cada um, o que acabara promovendo-lhe o título de: A Rainha do gelo. A pele como marfim, o vermelho berrante do batom num rosto oval. Poucas eram as mulheres que se arrumavam naquele ambiente de trabalho, com exceção dela e de outra funcionária legista, porém, qual detetive que usaria um batom tão vermelho assim? Seus olhos eram como lascas de gelo, frios, sérios, imponente, de um cinza claro quase se aproximava ao azul, enquanto que as orelhas estavam sempre atentas as coisas ao seu redor, como um gato, que ironia. Era uma mulher atraente, seus colegas não podiam questionar, foi transferida há seis anos atrás para a delegacia de homicídios da cidade de Nova Amsterdam, mas sua excentricidade intimidava seus colegas.

Valquíria era calma com o que fazia, aquele par de olhos frios, já haviam visto coisas cruéis, assassinatos brutais, suicídios provocados pelo maior companheiro do homem, a ansiedade. Ela, coletava provas como ninguém, revirava o cadáver a qualquer ângulo, embora não fosse sua função. Havia pago algumas matérias de anatomia quando estava na faculdade, daí sua habilidade em manusear os mortos. Priorizava saber de muitas coisas, isso a fazia uma detetive implacável, por vezes, acompanhava à fio o dissecamento dos peritos em necropsia. Precisava, sempre, resolver um crime.

Em outra parte do departamento de polícia, precisamente no vestiário feminino, a Doutora Sophie Seyfried, estava sozinha vestindo o seu uniforme de laboratório, estava fazendo aquela atividade com total meticulosidade, como sempre fazia todos os dias da semana, sem exceção, dobrando cuidadosamente a blusa e as calças sociais, guardando no seu armário metálico no qual continua seu sobrenome. Havia saído para comer um pouco em um restaurante qualquer e não ficaria com a mesma roupa de laboratório, nada faria com que ela ficasse. Já havia esquecido quantas horas estava ali dentro, uma certa detetive a impedia de cumprir seu horário habitual hoje. Então, já havia utilizado os dois uniformes de laboratório que sempre guardava em seu armário em caso de necessidade. Sentia-se como uma residente dentro daquele departamento de homicídios, mas ao invés de tratar dos vivos, ela cuidava dos mortos. Levantou-se e apertou os cordões das calças e começou a ajeitar seu cabelo sob à touca de algodão, ainda estava com um cheiro de lavanda. Ainda está suportável usar, pensou. Ela deixou o vestiário e seguiu para a sala de necropsia.

A Dra. Sophie Seyfried estava executando mais uma autópsia, havia se juntado a parte do instituto de medicina-legal de Nova Amsterdam quando o antigo legista se aposentou, assumindo sua posição. A doutora Seyfried comparecia a imprensa e tornou-se conhecida tanto pelos tribunais e nas manchetes quando era solicitada para testemunhar ou mesmo para dar algumas entrevistas, diferente da detetive que odiava os holofotes

Mais uma vez, a detetive Van Dahl era a razão de fazê-la sentir como uma residente naquele recinto. Utilizando sua touca e luvas. Deve ter se trocado no vestiário dos policiais, pensou novamente ao olhar a mulher a sua frente. A detetive estava de costas para ela, parecia atenta ao corpo. A doutora Seyfried já havia visto muitos horrores, muitos homens e mulheres em todas as idades, de idosos a crianças em todos os estágios de decomposição e por vários estilos de mortes, sejam carbonizados, torturados, desmembrados em ácido. Havia muita gente louca lá fora, ela sabia bem. Mas naquele laboratório, era só ela, aquele corpo e a detetive.

Segredos | Elliot HellsOnde histórias criam vida. Descubra agora