60. Aline

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Quantas coisas não estão debaixo de nossos olhos, nesse exato momento, e não somos capazes de notar? Realmente, há muito para ignorar. Às vezes, isso é o melhor que podemos fazer.

Dia vinte e nove de janeiro de dois mil e vinte e três. O sol escaldante do meio-dia contemplava a mansão Tebet Thronicke, mas ainda assim, o dia ensolarado não parecia muito animado.

Simone está no closet, com o olhar perdido no espelho. Um sorriso fraco preenche seu rosto. Ano passado, ela mirou na presidência da República, e acertou no amor de sua vida.

Soraya se encontrava debaixo da água quente do chuveiro, cantando alguma música que Simone tinha certeza ser de autoria do Billy Joel.

Algumas horas antes, as duas haviam lido o resultado dos exames de Simone e de Murilo. Os dois haviam sido dopados.

— Talvez ele tenha se dopado depois de me dopar, pra que achássemos que ele é uma vítima... — Tebet conversava com o próprio reflexo no espelho oval. — Será?

E então, o mais famoso dos sons de iPhone ressoou pelo quarto. Simone se levantou, e foi até a origem do barulho. Não sabia se era o seu celular, ou o de Soraya até enxergar o aparelho.

— Elisa? — Simone atendeu a ligação da filha de seu ex-namorado, e caminhou até a varanda. — Tudo bem, querida?

Simone conseguia ouvir a respiração oscilante da jovem, que ainda não havia a cumprimentado, e nesse momento, ela já sabia que algo não estava certo.

— Simone, oi. — A voz da jovem parece trêmula em meio às fungadas. — Simone, será que... Será que você pode vir até a minha casa?

A mais velha respirou fundo e voltou seu olhar atento para a mansão ao lado.

— Aconteceu alguma coisa, Elisa?

Há alguns segundos de silêncio, até que quase como num fôlego só, Elisa falou exasperada:

— Liga pra polícia e não apareça aqui de jeito nenhum! Por favor, não venha!

Depois das palavras ditas em desespero, Simone perdeu o fôlego tanto quanto a jovem ao ouvir um barulho de pancada do outro lado da linha. A ligação foi encerrada antes que pudesse raciocinar.

Sem pensar duas vezes, Simone discou o número da polícia por meio de seu próprio celular, e correu em direção ao iPhone com a capinha repleta de imagens de Deusdete, para ligar para a segurança do condomínio.

Após ser atendida em ambos os telefones, ela explicou o ocorrido e a urgência. Querendo ou não, o instinto maternal fazia parte do coração de Simone, e ela correu em direção ao cofre, tirando de dentro dele, sua pistola favorita.

— Soraya — a professora chama quando vê a loira com a toalha enrolada na cabeça, indo em direção ao lugar que ela mesma estava há pouco —, eu acho que o Murilo está fazendo alguma coisa com a filha dele. Preciso ir até lá.

A morena explicou o que tinha acabado de ouvir pelo telefone. Ela pretendia ir até lá sem informar nada a Soraya, mas sabia que isso seria injusto.

— Simone? Você não vai até lá de jeito nenhum. Tá maluca? A própria Elisa disse isso pra você! — Soraya exclama indignada enquanto se veste às pressas. — Daqui a pouco a polícia vai aparecer.

Pela expressão que Soraya enxerga no rosto da esposa, ela sabe que não seria ouvida, e por isso, vai em direção à própria arma. Diferente de Simone, ela prefere manusear um revólver.

Simone não diz mais nada, e vai em direção às escadas. Ela aumenta o tom de voz para contar o que estava acontecendo a César, que se encontra fazendo suas misturas malucas no bar. Meio atordoado, é nesse momento que ele se dá conta que já havia quebrado a promessa que havia feito com Elisa, de não beber álcool, há muito tempo.

Musas de Direita - Simone e SorayaOnde histórias criam vida. Descubra agora