Eu odiava essa cidade. Thunder Bay é o local onde nasci, onde meus pais nasceram e onde eu fui criada. Pelo menos até meus doze anos. Porém, nunca vi essa cidade como um lar ou senti que "pertencia a comunidade" e toda a porcaria que a maioria dos que viviam ali fingiam acreditar.
Densas nuvens de chuva nublam o céu e refletem meu humor naquele momento. O vento faz com que os pingos ricocheteiem na janela e se todos calassem a boca, aposto que seria possível ouvir o barulho que isso produzia. Eu costumava amar aquele barulho. Enquanto a maioria das pessoas, incluindo minha mãe, se assustava com a força do vento e da chuva, aquilo me fascinava.
A memória das vezes em que minha mãe aparecia com um guarda-chuva e me arrastava pelo braço de volta para casa me atinge e eu quase sorrio. Ela não fazia por maldade e sim por preocupação. Minha mãe nunca me machucou.
Claire Colbert sempre foi uma mãe dedicada e uma esposa que se esforçava para manter a fachada de família perfeita. Ela era curadora do Museu Menkin e amava seu trabalho. É por causa dela que me apaixonei pela arte e costumava frequentar exposições onde quer que eu estivesse. Existia muito mais além dos quadros e como eles me faziam sentir, mas ninguém sabia sobre isso. Nem mesmo ela, mas não a julgo.
Desde cedo e a partir do momento em que adquiri consciência sobre certas coisas, sempre tentei ser invisível e não um peso ou mais um incomodo para ela por saber o quanto minha mãe se esforçava para que tudo ficasse bem. Para que todos vissem o quão adorável era nossa família. Mesmo quando todos sabiam o quão podre era meu padrasto. Mesmo quando eu só me dirigia a ele por educação e quando estávamos na presença de outras pessoas. Evans Crist era um homem de negócios, um empresário de sucesso e também um grande filho da puta.
No entanto, ele era meu padrasto desde sempre e a única figura paterna que tive uma vez que eu não tinha memória alguma de meu pai e que Evans não demorou muito para casar com minha mãe depois que meu pai morreu.
Morreu, não. Foi morto.
Morto pelo cara que no momento está virando a cabeça de um lado para o outro enquanto conversa com minha tia. Não faço a menor ideia do que eles estão conversando ou do que se passa em sua mente, mas estou começando a ficar incomodada com o quanto seus olhos verdes parecem estar analisando cada detalhe meu.
Meu padrasto também está ali, mas não entendo sua real motivação. Ou talvez entenda. Talvez essa seja mais uma coisa que ele quer para ele apenas para incomodá-los. Uma disputa que ele quer ganhar dos cavaleiros de Thunder Bay. O problema é que a coisa que ele quer sou eu. Um ser humano que infelizmente ainda é menor de idade e que agora é uma órfã, por isso precisa de um lar até completar dezoito anos.
Cravo minhas unhas na palma de minhas mãos com toda a força que consigo para focar no ardor e não deixar nenhuma lágrima escapar, e depois vejo as marcas que elas deixaram enquanto assisto o sangue voltar.
Estou sentada em uma sala com várias pessoas que não me conhecem: Minha tia, o marido dela e o advogado deles, meu padrasto, o advogado do meu padrasto e o filho dele que não faço ideia do porquê está ali. Ao meu lado está uma assistente social muito paciente que assim como eu, se mantem em silêncio enquanto os outros discutem. Sei que tenho direito a opinar sobre onde devo passar os próximos dois anos, mas me mantenho quieta por não ter certeza do que fazer.
Se dependesse de mim, se me deixassem, eu voltaria para Paris e me manteria no internato em que passei os últimos quatro anos, e que já tinha me acostumado.
A chuva começa a parar e eu tento focar no que está sendo dito, e imediatamente ouço Michael Crist dizer ao pai que ele não seria capaz de cuidar de um cacto sem matá-lo e que eu estaria muito melhor sob os cuidados deles. A primeira parte era verdade, já a segunda, eu tinha certa desconfiança. O problema é que até agora eu não tinha conseguido entender por quê minha mãe sequer mencionaria minha tia em sua carta, uma vez que as duas nunca tinham tido contato algum.
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Runaway - A DEVIL'S NIGHT FANFICTION (PTBR + ENG)
RomancePT: NINI Eu estava em maus lençóis. Voltar para Thunder Bay não era seguro e eu sabia disso. Tinha ido embora há quatro anos e agora, de repente, estava sendo obrigada a voltar, mas dessa vez, para onde sempre fui proibida de ir. Eu sabia que eles...
