Quatro anos atrás...
— Professor, tem certeza que deveríamos estar fazendo isso? — pergunto coçando a cabeça. — Quer dizer, temos doze anos. Encenar uma peça onde dois adolescentes se matam não parece uma boa ideia...
Artie Forester ri abertamente do meu questionamento e circula entre as cadeiras do teatro da escola.
Não gosto dele. Não gosto que ele e Nini sejam amigos e muito menos que ele tenha colocado ela para ser a Julieta dessa peça ridícula que nem mesmo apresentaríamos, mas que como estávamos lendo o livro, ele queria que nos colocássemos no lugar dos personagens, contanto que fizéssemos escolhas melhores. Pelo menos, foi isso que ele disse. Além do mais, ele pode até disfarçar como quiser, mas sempre parece cheirar a maconha.
— Eu disse que poderia escalar outra pessoa para ser Romeu, sr. Torrance — ele me lembra. — O senhor que se voluntariou para isso.
Olho dele para Nini que está de costas, sentada no chão e pintando um pedaço de cenário. Ela também não estava gostando de ser o centro das atenções e ler aqueles diálogos enormes em voz alta, mas se recusava a dizer não para esse idiota, por acreditar que ele estava sendo bonzinho por não entregar nossa amizade para o padrasto.
E se ela não estava gostando, Mads muito menos, tendo sido colocado no papel de Mercúcio pelo professor, que achou engraçado por sermos primos.
Solto um suspiro resignado e pego minha cópia, abrindo e começando a ler em pé e de forma mecânica:
— Se a minha mão profana esse sacrário, pagarei docemente o meu pecado: Meus lábios, peregrinos temerários, o expiarão com um beijo delicado.
O professor bate com sua caneta na madeira do palco e Nini vira, assustada.
— Julieta — ele a chama.
Nini olha ao redor e parece perceber só agora que a aula tinha começado e que outras pessoas estavam ali. Quando estava focada em uma função que gostava, como pintar, ler ou desenhar, ela se desligava do mundo, mas rapidamente levanta e vai até sua mochila, pegando sua cópia e a abrindo, voltando para a mesma posição e ficando de costas enquanto lê.
— Bom peregrino, a mão que acusas tanto revela-me um respeito delicado; juntas, a mão do fiel e a mão do santo, palma com palma se terão beijado — declama mesmo que de forma tímida.
— Professor — eu o chamo — por acaso não existe uma versão mais atualizada que a gente possa usar? Quer dizer, ninguém mais fala assim hoje em dia, a não ser que seja realmente velho... ou doido.
A classe ri e o professor cruza os braços.
— Apenas leia, sr. Torrance.
Leio até o fim daquela cena em minha mente e uma ordem no fim da folha chama a minha atenção, por isso, começo a ir na direção de Nini de forma silenciosa, tentando não a assustar novamente, mas sei que agora ela está focada na aula.
— Os santos não têm lábios, mãos, sentidos? — pergunto, me ajoelhando ao seu lado.
— Ai, têm lábios apenas para a reza — ela continua, por um momento confusa pelo diálogo ultrapassado.
— Fiquem os lábios, com as mãos unidas; rezem também, que a fé não os despreza.
— Imóveis, eles ouvem os que choram.
— Santa, que eu colha o que os meus ais imploram — declamo em voz alta, a assustando de propósito e em seguida me aproximando de seu rosto, ao mesmo tempo em que ela olha na página, o que está escrito no fim da cena.
YOU ARE READING
Runaway - A DEVIL'S NIGHT FANFICTION (PTBR + ENG)
RomancePT: NINI Eu estava em maus lençóis. Voltar para Thunder Bay não era seguro e eu sabia disso. Tinha ido embora há quatro anos e agora, de repente, estava sendo obrigada a voltar, mas dessa vez, para onde sempre fui proibida de ir. Eu sabia que eles...
