5. Romã

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Despertou de um sono leve e desconfortável quando a luz da lua vinda do fim do corredor bateu em seus olhos. A porta estava aberta.

Lembrou-se, então, com um baque, do que acontecera nas últimas horas. Benji caiu em febre, o doutor não tinha diagnóstico, Raquel o sentenciou a lutar sozinho e Miho a enfurnou naquele cubículo minúsculo que era o armário, onde guardavam os produtos de limpeza quando o prédio ainda era um edifício comercial. Depois de tanto chorar, sem mais envergonhar-se, pegou no sono, em uma posição desconfortável naquele ambiente insalubre. Sentia insetos passarem sobre ela, mas, com o tempo, deixou de se importar. Adormeceu pensando que perderia Benji.

Agora, todavia, o ar circulava lá dentro outra vez. Ela fitou a silhueta escura de quem a libertara daquele lugar claustrofóbico, esperando partir para cima de Miho com apenas palavras duras que ela sabia que machucariam mais que qualquer coisa. Mas, por sua vez, teve certeza de quem era assim que ouviu sua respiração. Ele andou até ela e segurou em um de seus cotovelos, puxando-a para cima.

– Anda, Sam! – Andy murmurou. – Não temos muito tempo.

A feição da mulher contorceu-se em dúvida. Ela olhou em volta ao sair do armário; nenhum sinal de Miho.

– Espera, como conseguiu me tirar dali? Onde está Miho?

– Eu fiquei à espreita, olhando do escuro do quarto. Não deixei Benji, mas ele não acordou, Sam... – a voz de Andy soou como um arrastado lamento. – Vi Miho contorcer-se a cada vez que ouvia você chorar. Ele não aguentou o baque depois de um tempo e voltou pro andar dele. Aí, deixou a passagem livre.

– Obrigada. – Samira processou tudo. – Andy, preciso te pedir um favor.

– Manda.

– Preciso que me dê cobertura.

Para a surpresa da irmã mais velha, Andy debochou dela com um estalar de língua. Ele a puxou para o quarto dela, onde Benji estava instalado. O choque de ter que vê-lo daquele jeito quase fez Samira desentender o que o irmão do meio fazia. Assim que entraram no quarto, com cheiro de ar viciado e doente, ela viu Andy fechar a porta com cuidado e acender uma vela.

Samira esqueceu-se da pressa ao vê-lo. Benji estava deitado em seu colchão, exatamente como antes, tirando o fato de as manchas estarem espalhadas agora por seu rosto, também. A respiração era ritmada, mas fraca, e ele estava coberto por uma manta grossa, mesmo naquela noite quente.

– Sam – Andy chamou sua atenção. Finalmente olhou para o irmão do meio. Andy estava com um blusão preto de capuz e uma calça jeans escura. Estendia-lhe uma mochila enquanto colocava a outra nas costas. – Se troca, a gente tem que ir.

Samira balançou a cabeça quando entendeu.

– Não, Andy, de jeito nenhum! – Mesmo assim, ela tomou a mochila de suas mãos. – Você fica.

– Não vai me impedir de ir com você salvar a vida do Benji, Samira. – Andy cresceu para cima dela. Podia ser mais novo, mas era mais alto, e mais cabeça dura.

Ela soltou o ar com pesar.

– Eu pensei bastante, Andy... Sabe o que Raquel vai fazer com a gente quando voltarmos?

– Eu sei. Eu ajudei vocês a montarem os protocolos, lembra?

A mulher mordeu o lábio.

– Então sabe que ela vai nos expulsar daqui quando e se voltarmos.

– E mesmo assim você está indo. Qual sua ideia?

– Minha ideia é encontrar antibióticos para tratar meu irmãozinho. Medicamentos, quaisquer que sejam. Tentar barganhar nossa morada aqui com eles, apesar do come que vamos levar, inevitavelmente. Se não der certo, esperamos Carlos cuidar do Benji. E aí damos o fora daqui de cabeça erguida.

Olhos de CorvoOnde histórias criam vida. Descubra agora