Olhos de Corvo

28. Infiltrar-se

Drica saiu batendo de porta em porta nas ruas do comércio do porto de Luso até encontrar a placa de:

precisa-se de colaborador (a), urgente!,

em um café de esquina e disponibilizar-se para a vaga. A gerente estava lá e a atendeu, por sorte, e Drica foi cativante o suficiente para a mulher dizer:

– Geralmente eu te ligaria, mas não consigo negar que você, Gabriela, é um raio de sol!

Que elogio horrível, Drica pensou, com um sorriso no rosto de orelha a orelha. Ela era o oposto daquilo. Bom, talvez Gabriela Lima fosse um raio de sol.

– A vaga é sua, querida! Consegue começar amanhã?

E ela com certeza concordou.

– A vista aqui é linda, dona Magda! – o raio de sol que Drica interpretava comentou, apenas para ser uma jogada travessa quando Magda percebesse, e se percebesse, que abrigara uma mulher de olhos-pacatos em sua loja. O que ela não disse, foi: "A vista aqui é linda, dona Magda! Dá para olhar perfeitamente para o porto de Luso, onde em questão de tempo eu vou roubar um barco e fugir para Nóvora, obrigada pela confiança!".

– É linda, sim, Gabi, mas o porto é um caos quando chove...

– A água fica muito agitada?

– Nos dias de tempestade a gente não consegue nem abrir a loja. O mar invade tudo aqui na rua.

Isso Drica anotou mentalmente.

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Com os outros, a história não foi tão imediatista, mas os ventos pareciam estar soprando a favor deles, pelo menos nos primeiros dias.

Choi Miho, sob a identidade de André Carvalho Almeida, não precisou mentir – muito – em seu currículo para que fosse facilmente aceito na segurança do metrô de Luso. De lá de dentro, conseguiriam dar mais um passo no plano bem estruturado dos sobreviventes.

Zoe Guerreiro, em questão de três dias, estava entregando panfletos de uma clínica dentária na rua do porto. Não precisa ser nada importante, Zoe, Louis lhe disse dias antes, só esteja próxima do porto.

Quanto a Eric, esse já tinha uma missão mais complicada.

– Não se mate por isso – David disse –, mas se conseguir um lugar em algum centro médico, Ferragni...

A frase ficou pendente. Era óbvio que seria imensuravelmente incrível para todos eles se Eric tivesse acesso a um centro médico, mas mentir em seu currículo era mais complicado.

O homem estudou incessantemente por dez anos, mas sabia que ser autodidata e ter realmente terminado a faculdade de medicina tinha abismos de distância.

Mas ele tentou mesmo assim. Na primeira semana, tudo o que fez foi andar de um lado para o outro à procura de hospitais e centros médicos que o aceitassem.

No currículo, Victor Rocha Lombardi era um enfermeiro formado por uma das três melhores universidades do país, e ele estudou de cabo a rabo tudo o que a internet disponibilizou para ele sobre a faculdade, o curso, as matérias, os professores, o campus, as provas. Tudo, tudo na ponta da língua.

Uma semana depois, ligaram para ele no celular pré-pago. Eric tinha uma entrevista para uma vaga de enfermeiro em um hospital de saúde privada. Caro, para dizer sem rodeios. O Hospital São Lucas Saldanha ficava localizado no centro de Luso, a alguns minutos andando do prédio da prefeitura.