48. São Os Nossos

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Samira tropeçou, e só não caiu porque Benji a segurou. O escuro os engolia o suficiente para não terem visto o que estava estirado no meio da rua, mas ela tinha uma assustadora certeza de que seus pés bateram em um corpo.

Aquela noite tornava-se cada vez mais pavorosamente similar àquela dez anos antes, onde aniquilaram todos os olhos-pacatos, que uma ansiedade sufocante subia do estômago.

Um lado dela queria simplesmente surtar. Sentar no chão e deixar o destino cuidar do resto. O outro lado tinha consciência de que Benji segurava sua mão com tanta força que seria desastroso qualquer sina que não a segurança dos irmãos.

À sua frente, Andy andava com as próprias pernas, apoiado em Eric, mas cambaleava como se suas últimas forças estivessem sendo usadas ali.

Laila afundava o rosto no cangote de Eric em total consciência de que ninguém podia ver seus olhos.

Sam olhava para trás vez e outra para ver se Jon e Trisha estavam os seguindo. Ela tinha certeza de que, se não fosse por Ishan, Trisha teria desistido de continuar.

A chuva intensa que agora caía servia para chicotear-lhes a pele.

Não sabiam como aquela noite ia acabar para Luso, mas esperavam piamente não estar ali para descobrir.

O som do mar bravo no porto misturou-se com a chuva, mas era claro ao pé do ouvido deles.

Estavam quase lá.

Já tinham passado por tanto, agora estavam quase lá.

Foi quando viram as fardas.


Eric freou bruscamente, e ouviu o leve choramingo de Laila ao seu ouvido.

Eles fecharam as ruas, era tudo o que ele conseguia pensar. Os soldados fecharam as ruas para o porto, os metros finais para um destino que estava cada vez mais difícil de deslumbrar. Era como quebrar um copo com água na frente de um bando de sedentos.

Ele olhou para trás, para Samira, e viu um reflexo do próprio desespero estampado no rosto da mulher. Teve certeza do que já suspeitava; homens como aqueles ganhavam palco em seus pesadelos, e em um instinto protetor deu um passo para trás, empurrando-a contra a parede.

– Sami? – Benji chamou-a, olhando em seu rosto. Mas ela só olhava para Eric. O lábio inferior tremia, se não pelo frio da chuva, então pelo medo do que fariam a seguir.

Ela abriu a boca para propor: vamos nos separar.

Mas não conseguiu.

Em sua cabeça, se conseguisse uma distração grande o suficiente para que ela fosse o foco, os outros conseguiriam fugir. Chegar do lado de lá, mesmo que isso significasse que ela provavelmente não os viria mais.

Entretanto, a mão de Benji apertou ainda mais a dela, e ela achou tê-lo ouvido repetir: Sami?, quando olhou para os olhos do irmão mais novo, nus e vulneráveis, e percebeu que Benji crescera anos em meses. Tinha medo em seu rosto, é claro, mas parecia ter lido os pensamentos dela, e os reprovava com afinco. Perdeu-a uma vez, foi obrigado a deixá-la ir em outra, e não o faria de novo.

Quando não viam mais esperança a não ser recuar, o som inconfundível de metralhadoras disparando cortou a noite, a balbúrdia das ruas e a chuva torrencial.

A já caótica atmosfera transformou-se no inferno quando o povo começou a gritar e a recuar.

Eric colocou Andy do lado dos irmãos com rapidez indescritível, e voltou-se para os Sabino, colocando Laila dentro de um círculo e fechando-o ao envolver Samira com um braço. Eles se abaixaram, e logo atrás Jon fez o mesmo com Trisha, que cobriu Ishan instintivamente.

Olhos de CorvoOnde histórias criam vida. Descubra agora