Inevitável

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- Eu não te disse que batia forte? Relembrou enquanto entravam juntos, pelas portas da fazenda, como se o tempo não tivesse passado. Bate tão forte que acelera até o meu. Sorriu, animada, após mais uma consulta de pré-natal.

Antônio On:
Irene cumpriu o que prometeu. Desde que o dia em que ela me disse que teríamos mais uma filha juntos, nos aproximamos bastante. É verdade, ela ainda não aceitou a minha proposta. Ainda não decidiu voltar a morar na fazenda para que eu pudesse ficar mais perto e ajudá-la em tudo com a gravidez. Mas, agora já me inclui nas decisões sobre a nossa menina. E estar junto dela, já me alivia.

- Dá uma adrenalina boa né. Indagou ao oferecer-lhe um pouco de suco. Toma, um refresco vai fazer bem, hoje tá calor demais, e nós estamos de pé desde cedo.
- Obrigada. Agradeceu, risonha.
- Eu não pude deixar de notar o quanto já cresceu. Encarou a barriga da mulher, como se pudesse ver além de sua pele.
- Já são 20 semanas. Alertou. Metade do tempo gestacional. Ela não demora a chegar. Se lembrou de repente de todas as ameaças que sofreu e a forte possibilidade de ter que encarar a morte, assim que a filha nascesse.
- Que foi? Tá se sentindo mal? Sua expressão mudou. Tá sentindo alguma coisa? Se levantou.

Irene On:
Eu queria poder dizer ao Antônio sobre as ameaças. Queria poder dividir com ele o quanto a minha vida corre risco. Queria pedir que acalmasse os meus pensamentos e me abraçasse como se seu abraço fosse um casulo, capaz de me livrar e me guardar diante de todas as armadilhas do mundo. Também queria poder dizer que nada disso me afeta. E que a minha terceira gravidez é um momento pleno na minha vida. Mas, eu não posso. Não posso porque, amo demais esse homem. Não posso porque permitir que ele saiba, é sentenciar que ele corra perigo, e eu preciso que ele fique a salvo.

- Sossega homem. Voltou de seu pensamento. Tá tudo bem.
- Você está me escondendo alguma coisa Irene? Às vezes fica distante...
- Claro que não Antônio. Disfarçou, ao mentir. Você acabou de voltar do médico comigo, viu como o coração da sua filha é forte. Lembrou. Ela vive, Antônio. O que eu posso estar escondendo de você ?

Antônio On:
Irene tem razão. O coração de nossa filha é forte. Ela vive. Vive mesmo depois de tudo o que passou no ventre da mãe, quando a mesma tentou tirar a própria vida, sem ao menos saber que ela existia. Nossa filha é forte porque tem o DNA dela. Irene é a própria força e ela sempre exalou isso. Mas, eu não posso deixar de notar sua expressão desolada e distante cada vez que faço planos para o futuro. Por um momento, é como se ela não quisesse mais existir. Ou, como se tivesse certeza que não fosse mais existir. Isso me apavora. Me apavora porque conhecendo essa mulher como eu conheço, eu sei que ela jamais me dirá o que está realmente acontecendo.

- De qualquer forma, eu só queria te lembrar sobre a proposta que te fiz. A encarou, sorridente, enquanto permitia que ela continuasse fugindo do assunto. Te chamei pra morar aqui comigo.
- Antônio, eu já disse que...
- Eu não vou negar Irene. Não vou negar o quanto eu queria que nós voltássemos a ficar juntos, como uma família de verdade. Não posso mentir, dizendo que não queria estar novamente casado com você, porque isso é tudo o que eu mais queria.
- Isso não vai acontecer. Alertou. Nós não podemos...
- Eu sei. Lamentou. Você já deixou isso muito claro. Mas, de qualquer forma... Se aproximou. Acredito que sempre seremos uma família. Principalmente agora, Irene. Tocou novamente sua barriga redonda. Você está sozinha naquela casa. Eu estou sozinho aqui. Nossa filha chega em breve e eu queria viver essa fase sendo mais presente. Pediu. Por favor. Eu sei que essa vai ser a minha última chance.
- Me desculpa. Se dispersou dos olhares do homem ao perceber o toque de seu celular. Preciso atender, deve ser a Petra querendo saber onde eu estou.
- Tudo bem. Compreendeu.

Irene On:
Antes que eu pudesse responder mais uma vez sobre o pedido, quase irresistível de Antônio, recebi uma ligação que me paralisou. Uma chamada direta de Damião, que fazia questão de dizer, em alto e bom som, do outro lado da linha, sobre a certeza de meu novo paradeiro. Damião falou em poucos e eternos segundos, sobre o quanto ansiava por meu sangue, entregando que sabia que eu estava com Antônio e que não iria adiantar dizer nada a ele. Afirmou o que eu pensava: Meu destino já estava traçado e ninguém seria capaz de me proteger dele. Nem mesmo o homem que eu amo.

- Quem era? Indagou, ao ver que a mulher desligou a chamada, e permaneceu em choque, após quase não responder a pessoa que falava do outro lado da linha.
- Foi engano. Tentou sorrir. Eu não quero abusar mas... Você pode pegar um copo d'água pra mim? Encarou o homem, enquanto tentava se desvencilhar dele para respirar um pouco.
- Claro. Correu. Eu já volto.

Irene On:
É de momentos assim que eu vou me lembrar quando estiver prestes a deixar esse mundo. Recém parida, sozinha, frágil e com medo, ainda vou me lembrar do amor que sinto por Antônio e agradecer por deixar a ele o maior presente que poderia deixar a alguém que amo tanto assim. Enquanto ele trazia a água, temperatura ambiente, como sempre soube que eu gosto, não pude deixar de encará-lo e decidir aceitar sua proposta. Sabia que me proteger não estava mais ao seu alcance. Sabia que morrer em 20 semanas seria inevitável. E exatamente por isso, decidi que valeria a pena estar com ele nos meus últimos momentos. Mesmo que estivéssemos assim. Separados e ligados por um único vínculo: A nossa filha, e eu sei que mesmo ainda dentro de mim, essa será a única chance que ela terá de nos sentir juntos.

- Eu aceito. A mulher resumiu, ao abandonar o copo vazio de vidro ao lado do sofá. Eu aceito voltar a morar aqui.
- Irene... Reagiu emocionado, antes de abraça-la. Eu nem sei o que dizer...
- Não precisa. Fechou os olhos, tentando aproveitar mais um pouco o abraço. A nossa filha merece. Lembrou. Nós temos que pensar no melhor pra ela. É o nosso dever.

Antorene: The After Onde histórias criam vida. Descubra agora