7 Semanas

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Por algum tempo, o silêncio pairou em todo o quarto. A notícia recaiu sobre a cabeça de Irene como se fosse um vaso de louça. A mulher, que estava aparentemente bem depois do grave acidente, agora parecia mais confusa que nunca. Gravidez? A essa altura de sua vida? Como isso era possível? Foi casada por tantos anos com Antônio e jamais engravidou novamente, e agora, simplesmente estava à espera de um filho. Um filho inesperado. Como o primeiro que teve.

[• Nova Primavera (MS), 1993, 10h37 •]
- Você tem certeza que isso é um positivo, Cândida? Reagiu incrédula.
- É. É sim. Confirmou. Não tem como estar errado, olha aí, dois riscos. Dois riscos fortes. Tá explicado agora toda aquela frescura que você teve pra comer e essa sua enjoação do perfume dos machos. Quase gritou.
- Shiu... Reagiu. Fala baixo. Quer que todo mundo saiba?
- Ué Irene, o que é que tem? Todo mundo vai saber mesmo... Meu amor, se tem uma coisa que não dá pra esconder é isso. A tal da gravidez.
- Meu Deus do céu, o que eu vou fazer agora? Como é que eu vou cuidar dessa criança?
- Como cuidar? Ei boneca, você acha mesmo que isso nunca aconteceu com as meninas daqui?
- Elas não usam camisinha? Reagiu curiosa.
- As vezes são descuidadas, como você.
- Eu não estou habituada com essas coisas Cândida. Quase gritou. Mas fala pra mim. Que jeito vocês dão?
- Como, que jeito? O bom e velho chá de canela minha filha, é infalível. Três dias no máximo e tudo já estará resolvido.
- Chá de canela? Mas, canela é abor... Não. Não Cândida. Abortar não. Não dá. Eu não consigo. Isso não, de jeito nenhum.
- E você acha o quê? Que o pai dessa criança vai assumir você? Se é que você sabe quem ele é né.
- É claro que eu sei quem ele é. É o Antônio. Desde que ele me escolheu, eu não fico com mais ninguém.
- É? E o Ademir? Como você pode garantir que esse filho não é dele Irene? Olha pra mim. Tocou o queixo da jovem de dezenove anos com o dedo indicador, a fazendo olhar para ela. Pela força dessa lista, não tem como esse filho ser do Antônio. Trouxe clareza, antes da sair do quarto, deixando a moça ainda mais desesperada.

[• Nova Primavera (MS), 2023 •]
- Irene?! Irene?! Chamou insistente. Você está bem? Quer um calmante?
- Eu não quero calmante nenhum. Reagiu, desesperada. Eu não quero me acalmar. Gritou. Quero que vocês me digam que tudo isso não passa de um engano. Ou uma brincadeira sem graça. Isso não pode estar acontecendo. Não pode.
- Nós ainda não fizemos os exames de imagem, mas temos certeza da gravidez.
- Como vocês tem tanta certeza? Indagou, um pouco mais calma.
- Nós ouvimos os batimentos do seu bebê. Revelou. E caso permita, podemos realizar os novos exames agora mesmo.
A mulher não teve mais argumentos para sustentar a tal discussão. Apenas assentiu com a cabeça.
- Você vai sentir um pouco gelado. Avisou.
- Eu sei perfeitamente o que eu vou sentir, doutor. Por favor, vamos logo com isso. O senhor vai perceber que tudo não passou de um terrível engano e...
- Aqui está. Aqui está o seu bebê.
Mostrou um pequeno feto, quase sem forma, perfeitamente instalado em seu ventre. Agarrado ao cordão umbilical, lutando por sua vida. Aparentemente saudável, mesmo depois de correr tanto perigo, dentro de uma mãe que havia acabado de tentar contra a própria vida.
- Você está na 7° semana de gestação. E foi realmente um milagre ele ter sobrevivido a queda. Avisou.
- 7 semanas. Cochichou consigo mesma. Um filho. Um filho do Antônio. Refletiu.

[• Nova Primavera (MS), 1993, 23h12 •]
- Você já vai? Conseguiu relaxar um pouco? O encarou vestir a roupa, depois de mais uma noite juntos.
- Vou. Eu preciso descansar. Tive um dia daqueles. Cadê? Cadê o meu colete?
- Ali. Ali no banheiro. Apontou. O seu filho melhorou da febre? Ontem você disse que não veio me ver porque precisou levá-lo até o hospital. Observou as unhas vermelhas, enquanto lembrava de Caio, o filho do agricultor. Irmão ou primo do filho que esperava.
- Melhorou sim. Está bem melhor. O médico disse que foi uma tal de uma virose que pegou ele em cheio. Angelina está cuidando da medicação e logo logo ele estará novo em folha.
- Você parece ser um bom pai. Elogiou enquanto o ajudava a vestir o colete.
- Eu faço o que posso. Sabe que, eu sempre quis ter família grande? Filhos...
- Sei. Você já me disse isso.
- É. Eu disse. Mas, com a perda da minha esposa, eu já entendi que muito provavelmente terei só o Caio. Mas, e você? Tô te sentindo um pouco ansiosa, o que que foi?
- E se outra mulher te desse um filho Antônio? Você não o assumiria?
- Vão parar com esse assunto? Selinhou sua boca. Que conversa é essa? Claro que eu assumiria o meu filho. Eu sou homem Irene. Lembrou. Não existe filho meu jogado pelo mundo afora. Não do meu conhecimento.
- Antônio?! Eu não posso deixar que você vá embora sem que veja isso. Alcançou a fita simples, guardada a sete chaves, dentro de uma caixa secreta de seu guarda roupa de madeira.

[• Nova Primavera(MS), 2023 •]
- Eu não acredito que isso está acontecendo comigo. Encarou a imagem que tinha nas mãos. Eu não acredito.

Antorene: The After Onde histórias criam vida. Descubra agora