Solidão

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A prisão domiciliar foi o melhor acordo que Dr. Silvério, advogado de Antônio, conseguiu. E só conseguiu, depois de alegar que seu cliente tinha sérios problemas no coração. É verdade, alguns dos crimes cometidos por Antônio tinham direito a fiança. E esse dinheiro, o fez perder algumas boas fazendas de seu enorme patrimônio.
Alguns dos crimes cometidos, recaíram sobre Ramiro, que os executou. Mas, ele conseguiu um acordo com a polícia para estar livre, apesar de atender a tantos pedidos do ex patrão.
Mas a verdade é que, o rompimento com os filhos e a perda de sua antiga vida, enquanto Caio e Aline vivem felizes com o que conseguiram, é o castigo mais duro que ele poderia receber. Um castigo que vem acompanhado de algo que ele sempre temeu sentir, até mesmo durante as refeições: A Solidão.
Antônio já teve esse medo antes. Já esteve nessa situação. E mesmo que ainda tivesse Caio e Angelina morando com ele, quase não conseguia existir sem a ausência de Ágatha. Depressivo, sempre visitara o bar de Cândida, uma velha amiga, em busca de uma boa conversa e horas de amor pago. Até que, tudo mudou. Mudou com a chegada de alguém que pôde lhe oferecer mais do que ele achou que estivesse condenado a ter, para sempre.

[• Nova Primavera (MS), 1993. •]
- O que? O que eu tenho que ver Irene? Eu já te disse, preciso ir embora, amanhã cedo tem todas aquelas chatices da fazenda pra resolver e... Reagiu boquiaberto. Eu acho que já vi um negócio desses antes. Lembrou. Irene, você tá grávida?
- Acabei de descobrir. Revelou, amedrontada. Cândida me fez uma proposta. Mas, eu não acho que abortar um filho tenha a ver comigo. Se sentou sobre a cama, deixando o teste de lado. Eu ainda não sei o que eu vou fazer Antônio. Mas, eu...
- Como o que você vai fazer? O que nós vamos fazer não é? O filho é nosso. Ficou louca? Nós vamos lá pra casa, criar essa criança. Reagiu com firmeza.
- Como você sabe que o filho é seu? Indagou, surpresa. Eu nem te disse nada. Você sabe, eu sou uma mulher da vida e...
- Eu sei que você não tem mais clientes desde que eu entrei na sua vida. Raciocinou. Eu mesmo paguei uma fortuna a Cândida para que você fosse minha. Só minha. Eu disse pra ela que não queria outro homem rolando com você nessa cama aqui. Ela te obrigou a...
- Não. Balançou a cabeça. Obrigou não. Ninguém ousaria ir contra uma ordem sua né, você é Antônio La Selva, o homem mais temido de Nova Primavera e...
- Seu futuro marido. Surpreendeu.
- Você... Quase chorou. Você o quê?
- Você vai me dar o que eu nunca mais achei que teria de novo, Irene. Finalmente, eu tenho de novo, a chance de ter uma família de verdade. Uma esposa, meus filhos... Um lar.
- Você esqueceu que eu sou uma mulher da vida Antônio? Como é que você vai vender essa imagem de família perfeita? Todo mundo sabe que...
- Irene, de agora em diante, você é uma mulher respeitada. Será a minha esposa. Será a dona de tudo o que eu tenho. Expôs seu plano. Me dará mais filhos. E estará do meu lado, criando eles. Seu trabalho será cuidar da nossa casa, fazendo dela um lar de verdade. E eu te prometo que nada irá te faltar. Nunca mais. Tocou-lhe o rosto.
- Eu nem acredito. Chorou. Pensei que você fosse...
- Ahhh Irenee, já te falei, olha pra mim, eu sou um homem. Não sou esses moleques que vem aqui. Acabou. Chega de conversa. Eu vou avisar a Cândida que você não trabalha mais aqui.
- Eu vou arrumar as minhas coisas.
- Que coisas? A encarou. Minha querida, a Irene Pinheiro, não existe mais. Esquece tudo isso aí. Você vai comigo, vai comprar novas roupas e será uma nova mulher. A partir de hoje, você é Irene La Selva, a mãe do meu filho. Quase sorriu.

[• Nova Primavera (MS), 2023 •]
Irene nunca entendeu a reação daquele homem de poucas palavras, naquela noite. Jurou que ele diria que o filho não era dele e que ela teria que se virar sozinha. Já estava acostumada a ser sozinha. E mesmo que esse filho não fosse de Antônio, e sim de Ademir, como Cândida insistia em falar, ela não teria coragem de procurar o outro La Selva, afinal de contas, sua última ida até o bar não foi nada amigável e ele não aceitou bem a ideia de que já não era mais o predileto da moça misteriosa que havia chegado a pouco tempo na cidade e era cobiçada por todos os homens daquela extensão.
Antônio, por outro lado, foi alertado que poderia não ser o pai desse filho. Cândida, sua amiga, e dona do tal bar, de onde ele não saia mais, falou sobre um homem que procurava por Irene todas as noites, antes que ele chegasse e a tomasse para si. Mas, ele não quis mais ouvir. Nem mesmo, quis saber que homem era esse. Apenas estava pronto para fechar os olhos e os ouvidos frente a todas as críticas que receberia. Tudo tinha um preço, e ele estava disposto a pagar pelo seu, sem reclamar. A mulher com quem estava se encontrando por quase dois meses estava grávida. E havia sim, a forte possibilidade de que esse filho fosse seu. E se não era, agora seria. Porque depois de meses sofrendo por algo que fez dele um homem vazio e triste, ele tinha esperança de novo. E mesmo que ele jamais fosse capaz de admitir isso, a qualquer pessoa, sua família era a coisa mais importante que ele queria ter, pelo resto de sua vida.
- Ahh Irene, por onde será que anda você? Alcançou o controle da televisão, que ligara agora com uma frequência surpreendente. Já que, não tinha muito o que fazer, por tanto tempo. Onde será que você está? Voltou a questionar. Essa casa já não é a mesma sem você. Não é. Admitiu pra si mesmo. Ahhh, mas que droga, olha aí, olha aí esse noticiário cortando de novo o meu filme.

∆ MULHER É GRAVEMENTE FERIDA EM ACIDENTE, NA PISTA 347. O RESGATE ACONTECEU POR VOLTA DAS...∆

- A mulher sofre acidente e eu fico sem ver o meu filme. Essa é boa. Eu vou dormir. É só isso que dá pra fazer mesmo nessa casa. Deu de ombros enquanto subia as escadas.

Antorene: The After Onde histórias criam vida. Descubra agora