Entre Ódio e Desejo

Capítulo 64: Davi

O murmúrio das vozes ao meu redor parecia distante, abafado como se eu estivesse debaixo d'água. Estava ali, sentada na sala da coordenação, mas minha mente flutuava longe, presa nas imagens do que acabara de acontecer. Milena e Vitória estavam ao meu lado, segurando minhas mãos com força, tentando me trazer de volta à realidade, mas eu não conseguia me concentrar em nada. Tudo era um borrão.

Então, a porta se abriu e Penha entrou apressada. Sua presença deveria ter trazido algum conforto, mas eu mal a percebi. Ela se aproximou, falando comigo, mas as palavras mal chegavam aos meus ouvidos. Algo sobre o Gabriel estar irritado, sobre ele querer entrar. O nome de Erick veio à tona na conversa, mas foi só quando ouvi "família" que minha mente deu um estalo. Família... Davi!

A lembrança do irmão de Erick me atingiu como um choque. Meus olhos se arregalaram e, num impulso, comecei a gritar, sem conseguir controlar a onda de pânico que me invadiu.

— Davi! Milena, o Davi! Meu Deus, o Davi! Quem vai contar pro Davi? Quem vai ficar com ele? Ele deve estar na escola... Como é que ele vai ficar sabendo? — As palavras saíam de forma desordenada, atropeladas pelo desespero que tomava conta de mim. Eu mal conseguia respirar, o ar parecia faltar enquanto a realidade desmoronava ao meu redor.

Milena, mesmo visivelmente abalada, tentou me acalmar. Ela segurou meus ombros com firmeza, sua voz baixa e serena tentando penetrar o caos que dominava minha mente.

— Calma, Raquel... Calma... Eu sei onde o Davi estuda. Vou até lá, vou buscar ele, tá? Vai dar tudo certo, amiga. A gente vai resolver isso. — Ela falava rápido, mas suas palavras eram como uma âncora, me puxando de volta à superfície, embora o pânico ainda batesse forte no peito.

Penha, que acompanhava tudo com um olhar preocupado, finalmente perguntou, confusa:

— Quem é Davi?

Milena, sem perder tempo, respondeu enquanto tentava me manter calma:

— Davi é o irmão do Erick. Ele é responsável por ele, o pai deles vive viajando. Erick é tudo pro Davi.

E foi então que outra onda de pânico me atingiu. E o pai de Erick? Eles já tinham conseguido falar com ele? Eu precisava saber, precisava de respostas, e me virei para o coordenador, que estava parado ao lado, observando toda a cena.

— E o pai dele? Já falaram com o pai do Erick? Ele sabe o que aconteceu? Onde ele está? — Minha voz soava estridente, carregada de ansiedade e medo.

O coordenador, que parecia lutar para manter a calma diante do meu desespero, respondeu com um tom firme, mas gentil:

— Já entramos em contato com o pai dele. Ele está em outro estado, mas assim que recebeu a notícia, ele se organizou para pegar o primeiro voo. Vai chegar o mais rápido possível.

— Mas e o Davi? Com quem ele vai ficar? Onde ele está agora? — Minha mente girava, cada pensamento levando a outro, todos centrados na preocupação insuportável com Davi. Eu não conseguia suportar a ideia de que ele pudesse estar sozinho, sem saber o que havia acontecido com o irmão.

Foi então que Milena, percebendo meu estado, se ofereceu:

— Coordenador, eu posso buscar o Davi. Eu sei onde ele estuda, conheço o caminho. Posso trazer ele pra cá, ele já conhece a Raquel, e ele me conhece também. Vai ser melhor pra ele ficar perto de pessoas conhecidas.

O coordenador assentiu, dizendo que iria escrever uma carta informando a escola de Davi, para que eles permitissem que ela troussesse ele. Meu corpo tremia, e Vitória, percebendo meu estado, me ofereceu um copo de água com açúcar. Bebi, sentindo o líquido gelado descer pela garganta, mas o alívio que eu esperava não veio. O desespero ainda estava lá, como uma fera presa dentro de mim, pronta para explodir a qualquer momento.