Capítulo 53: Eu Sei Sobre a Carta

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Apenas as várias camadas poderiam esconder as olheiras de uma noite não dormida.
Cheguei na escola tentando me convencer de que tudo estava normal. Mas nada estava normal. O peso da carta de Erick ainda estava pendente sobre mim, como uma nuvem escura que me seguia por todos os cantos. Eu andava pelos corredores, tentava sorrir para as meninas, respondia as perguntas automáticas dos professores, mas, por dentro, eu estava em pedaços. A carta... só de pensar nela, sentia um misto de raiva e dor, como se tudo estivesse fora de controle. Na verdade, há muito tempo eu não sabia o que era estar no controle

Gabriel, sempre insistente, apareceu ao meu lado logo cedo, jogando charme, como se estivesse tentando distrair minha mente da tempestade que se formava dentro de mim. Foi muito difícil, mas eu fiz o que pude para disfarçar que estava confusa demais para dar atenção a ele ou a qualquer outra pessoa.

Após o intervalo, quando os corredores esvaziaram e o burburinho típico da escola começou a diminuir, eu me refugiei em um canto isolado, longe de todos, tentando encontrar algum tipo de paz em meio ao caos interno. Sentei-me no chão, encostada na parede fria, e fechei os olhos, tentando forçar meus pensamentos a se organizarem, a fazerem algum sentido.

Mas eles continuavam a correr, incontroláveis. A carta, as palavras de Erick, o jeito como ele me olhava... Como aquilo tudo poderia ser real? Como ele poderia amar alguém além de si mesmo? E eu, por que ainda me importava tanto? Por que, apesar de todo o ódio que eu já senti, ainda havia algo dentro de mim que reagia ao ouvir o nome dele?

Foi nesse momento, enquanto eu estava absorta em meus próprios pensamentos, que ouvi passos suaves se aproximando. Levantei os olhos e vi Milena parada à minha frente.

— Estava te procurando — disse ela, com um tom suave, mas direto, como se já soubesse o que estava acontecendo dentro de mim. — Eu sabia que você precisava falar com alguém.

Ela sentou ao meu lado, e eu senti uma onda de alívio ao ver sua expressão compreensiva. Não precisei dizer muito; Milena sempre conseguia ler o que eu estava sentindo.

— Eu descobri porque o Erick não fala mais comigo... — comecei, sem saber exatamente como continuar. — Ele tinha escrito uma carta... Causou uma confusão enorme dentro de mim. Eu nunca imaginei que o Erick pudesse escrever algo assim, que ele...

Milena me olhou com paciência, como se estivesse esperando eu terminar de expor todos os meus pensamentos antes de responder.

— Eu já sabia — ela finalmente disse, e sua voz não tinha um tom de surpresa, mas de certeza. — Vim aqui porque sabia que você tinha lido a carta e que isso estava mexendo com você.

Eu paralisei, confusa.

— Você leu a carta?

Milena balançou a cabeça, um sorriso triste surgindo em seus lábios.

— Não, eu não li. Erick escreveu aquela carta de última hora, e ele queria te entregar pessoalmente, mas percebeu que você estava muito zangada para receber. Então ele aproveitou que sua mochila estava aberta e colocou lá dentro. Ele achou que você fosse ler.

O que ela disse me deixou ainda mais confusa. Como ela sabia tudo isso? Como ela poderia saber o que Erick estava pensando?

— Como você sabe disso, Milena? — perguntei, minha voz saindo mais baixa do que eu pretendia.

Ela suspirou, parecendo cansada, mas ainda assim determinada a me dizer a verdade.

— Eu perdoei o Erick. Às vezes, a gente ainda se fala por mensagem. Ele me contou ontem à noite que você apareceu no vestiário e que falou sobre a carta. Ele não sabia o que pensar sobre o fato de você não ter lido, e eu também não quis perguntar sobre o que ele ainda sente por você. Mas ele me falou o que estava na carta, e eu sabia que você precisaria falar com alguém. Por isso vim aqui.

Fiquei em silêncio, digerindo tudo o que ela disse. Por um lado, fiquei aliviada por não ter sido pega de surpresa, mas por outro, a confusão em minha cabeça só aumentava. Eu sentia que estava presa em uma teia de emoções que não sabia como desfazer. E então, Milena, com sua paciência habitual, me olhou diretamente nos olhos e perguntou:

— E o que você vai fazer agora, Raquel?

Essa era a pergunta que eu vinha evitando o dia todo, mas que sabia que precisava responder. O que eu deveria fazer? Enfrentar Erick e confrontá-lo com tudo o que eu estava sentindo, ou continuar fugindo, tentando proteger meu coração de mais dor?

— Eu não sei — respondi honestamente, sentindo uma leve pontada de vergonha por ainda não ter uma resposta definitiva.

Milena segurou minha mão, apertando-a com gentileza.

— Você precisa falar com o Erick, Raquel. Independentemente do que for acontecer, você precisa conversar com ele. Só assim você vai encontrar paz, seja qual for o resultado.

Eu sabia que ela estava certa. Evitar a situação só prolongaria o sofrimento, mas a ideia de encarar Erick e admitir todos os meus sentimentos era assustadora. Ainda assim, talvez fosse a única maneira de encontrar alguma clareza no meio de todo esse caos.

Com a cabeça cheia de pensamentos e o coração pesado, decidi que falaria com Erick. Mas não sabia o que dizer, e isso me apavorava.

O que eu diria a ele? O que ele diria a mim? E, mais importante, o que isso significaria para nós três?

Essas perguntas continuariam a me atormentar até o momento em que eu finalmente decidisse agir.

Entre Ódio e DesejoOnde histórias criam vida. Descubra agora