2 - Centelha

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— Bom dia, Nico. — respondo com um sorrisão ao garoto que chegou na lanchonete, atrasado mais que eu, inclusive.

Nicolau é umas das poucas partes boas que existem na minha vida, ao contrário do que todos pensam e cochicham aqui em Santa Luzia, somos amigos, mais que isso, Nico para mim é como um irmão. Depois que ficamos apenas eu e meu padrasto, o apoio de Nico foi essencial para que eu não enlouquecesse, do seu jeito louco e totalmente reverso dos moradores dessa cidade totalmente católica, ele vive sua vida como um viajante com sede do novo e do inesperado.

— Salsichinha, como passou a noite? Terminou aquele livro que tinha me comentado? — ele diz tirando sua mochila dos ombros e tocando em cima do balcão, muito educado por sinal.

— Não me chama assim, cara de fuinha, e sim, terminei de ler ontem, por isso cheguei alguns minutinhos atrasada — respondo olhando por cima dos ombros e fazendo sinal pra bruxa velha, ele compreende e solta uma risada nasal, não seguro o riso e tento me recompor. Tudo com ele era piada, era fácil a risada, a conversa e conviver com Nico, e esse apelido que odeio é porque o nosso uniforme é todo vermelho, me chamando então de salsichinha, eu mereço.

— Sabe que é a garota mais linda daqui, até de pijama deve ser linda, e chega também, não se acostuma que eu sou difícil.

— Sei que você me ama e não assume, agora para de enrolação e vem me ajudar a montar os pedidos.

— Claro patroa, seu desejo é uma ordem.— Nico faz uma reverência e vai para o vestiário, é bobo, um palhaço mas é meu amigo, meu único amigo, aliás.

Ao contrário de mim, Nico ainda estudava, estava no seu último ano da escola, as garotas de lá se derretiam por ele, e com razão, já que ele é um poste de alto, tem um porte que digamos que seja agradável, não posso nem imaginar o que ele diria se me visse falando em voz alta elogios a ele. Seu cabelo castanho escuro sempre caindo na frente dos olhos, também castanhos, o deixava charmoso e contrastava com a pele clara. Digamos que mesmo que um ano mais novo que eu, no auge dos seus 18 anos, Nico já esbanjava charme. Quando digo que ele não combina com a cidade é porque sua vibe é cem por cento rebelde, parece aqueles garotos arrogantes mas o coração de Nico é enorme, pelo menos comigo sempre foi gentil.

Depois de organizar os pedidos, limpar e ficar nesse looping eterno, deu o horário de saída, estava exausta já que não dormi direito na última noite. Tem poucas pessoas que moram nesse fim de mundo, mas na hora de comer, credo, surge gente aos montes.

— Dona Lavínia, terminei de lavar os pratos, vou trocar de roupa, precisa de mais alguma coisa antes? — questiono enxugando as mãos e andando em direção a bruxa velha que estava sentada atrás do balcão fazendo suas palavras cruzadas, que paciência!

— Sim preciso, Lilith. Que você chegue no horário segunda feira. — a velha responde me olhando por cima daqueles óculos vermelhos de última geração.

— Claro, e mais uma vez desculpe por hoje — giro meus calcanhares e vou direto ao vestiário, chegando lá solto a respiração junto com a resposta que gostaria de dar a ela, se eu não quisesse ir embora desta cidade já teria me demitido a tempos.

Após alguns minutos divagando em meus pensamentos quantos salários tenho que ganhar pra vazar daqui, vou em direção ao armário, velho e enferrujado, o vestiário deveria se chamar despensa de produto de limpeza, porque que lugar minúsculo e insalubre.

— Credo, o que uma noite mal dormida não faz, estou insuportável hoje. — balbucio para mim enquanto pego minhas roupas.

— Hoje? Você está todos os dias garota.— me viro e vejo Nico escorado na porta com um pirulito na boca e dando aquele sorriso ladino pra mim.

O Pior de MimOnde histórias criam vida. Descubra agora