Quando saio do banho, vejo que Nico havia me ligado. Já estava anoitecendo então já deveria ter soltado da lanchonete. Passei a tarde adiantando trabalhos de Desenvolvimento Humano que precisaria entregar no fim da semana e organizei o quitinete.
Como não fazia muito tempo que estava aqui, ainda faltavam coisas para deixar do meu jeitinho, mas já haviam algumas plantas em cima da bancada da cozinha e da mesa que fazia divisa com o quarto. Perto da cama posicionei uma estante de livros e uma poltrona que ficava ao lado da janela que tinha a vista mais linda que já vi. A noite todas as luzes da cidade se apresentavam e conseguia ver o porto com a lua que refletia na água. Nico foi impecável com a escolha do local que eu ficaria provisóriamente, mesmo sendo apenas um cômodo, me sentia segura ali.
Me aninho na poltrona e busco pelo celular, retorno a chamada de Nico.
— Oi cara de fuinha. – digo quando a imagem de Nico aparece na tela, estava deitado em sua cama com o cabelo molhado.
— Posso ter essa cara, mas pelo menos sou cheiroso, recém sai do banho.
— Nunca neguei que você cheirava bem! – começamos a rir e depois de alguns segundos recuperei o folego, se não fosse ele eu já teria desistido de muita coisa.
— Como estão as coisas meu arco íris? Vivendo bem ainda sem mim?
— Viver eu tenho né, e estou bem porque você me ouve todos os dias, hahaha.
— Você acredita que estou na mesma situação? Mas a pergunta que não pode mais esperar, você virá para o meu aniversário?
— Simmmm, repito mil vezes sim já que você perguntou todos os dias isso. – No próximo final de semana será aniversário de Nico. Desde que vim pra Barletta não consegui visitá-lo e nem ele vir aqui, tudo estava realmente agitado, e eu também não sei como reagiria voltando naquela cidade com tantas lembranças.
— Hahaha, e vou perguntar até você estar em carne e osso na minha frente. – Nico vai fechando seu sorriso aos poucos, respira fundo e continua. — Você tem falado com Victor?
— Nã... não nos falamos a 1 semana, na última vez que liguei ele relutou em alongar a conversa, parecia que estava me evitando. — Victor soube da minha partida na noite anterior da viagem. Não queria que surgisse um estresse e talvez uma tentativa de impedir minha mudança. Pude notar a raiva que surgiu no seu olhar quando lhe dei a notícia, mas ele foi o mais gélido possível e simplesmente concordou e foi pro seu quarto.
Após alguns dias já estando aqui avisei que eu estava bem e pedi que cuidasse das coisas da mamãe, assim que conseguisse um lugar melhor traria para Barletta.
— Bom... você pediu que eu ficasse de olho nele e... ele mal sai de casa, vai trabalhar alguns dias sim e outros não. Sua barba cresceu e parece estar bem mal.
Ouço as palavras de Nico e uma angustia me bate, resquícios da velha Lilith aparecem. Sinto muito que minha partida esteja afetando Victor, mas depois de tudo que aconteceu comigo, não teria mais chances de continuar naquela casa, naquela cidade...
— Irei visitá-lo quando estiver ai sábado, vou tentar conversar com ele.— digo a Nico que concorda.
— Faça isso, acredito que ele precise mesmo... Mudando de assunto, tem visto as notícias aqui da cidade?
— Não consegui ficar muito no celular, estou me acostumando a rotina ainda, mas me diga, aconteceu algo?
— Sim, várias coisas... os desaparecimentos aumentaram e agora não ocorrem somente aqui em Santa Luzia, mas na cidade vizinha também... Estou pensando em ir embora, mas minha família quer manter a herança das terras, acho isso o cúmulo e... Lilith?
Meus pensamentos são cortados quando ouço meu nome. Nico falar dos desaparecimentos me fez entrar em um transe, lembrar daquela noite, lembrar do que eu sabia... lembrar dele!
— Ah, oi, estou aqui... Nossa, isso é horrível Nico, sabe que terá meu apoio se quiser vir morar aqui. Te lembro disso quase sempre.
— Eu sei Lili, mas tenho minha família... gostaria de levar todos comigo.
— Te entendo. Terá convencido eles até fim do ano.
— Tentarei, e vou insistir ainda mais porque já estará perto do seu aniversário, vou ficar grudado em você.
— Ah por favor! Vou aguardar ansiosa hahaha.
Horas se passaram enquanto Nico e eu conversávamos, mesmo a rotina de ligação por vídeo se repetindo todos os dias, nosso assunto nunca morria. Nico era minha pessoa e ter ele longe me quebrava em pedaços. Nos despedimos e largo o celular para aproveitar a vista, o movimento das pessoas nas ruas havia diminuído, alguns carros passavam iluminando alguns pontos. Recosto-me na poltrona e vou sentindo minhas pálpebras pesarem. Fecho os olhos para relaxar um pouco e adormeço.
~Padre Hector Santini~
— Você é louco! Eu não fiz nada! Pelo amor de Deus, me solta, me tira daqui!!
Eu acho incrível como todos negam suas maldades, como todos suplicam e no momento de desespero, nem por um segundo se passa na cabeça deles o que fizeram, o porque estão recebendo esse castigo. Imploram pelo perdão de Deus, mas quem está aqui com a foice na mão, sou eu, então imploram meu perdão, e eu jamais darei...
Ela se debatia feito uma porca, gritava feito uma égua, mas isso só me dava mais raiva. Talvez se todos eles em vez do desespero me oferecessem o silêncio e a aceitação, eu daria uma morte mais rápida. Aurora... ah como eu gostei dela, aceitou seu fim, aceitou sua punição. Condenada a sentar ao lado do diabo no inferno.
Aquele confessionário não me traz apenas fiéis arrependidos, me traz mulas, corpos que eu tenho que destinar na caminhada do vale da morte. Sou o seu ceifeiro, seus perdões nunca chegarão, mas a justiça divina, sim.
Fito a moça morena que amarrei na minha sala de punição, gosto de variar com cada pecador. Suas mãos estão presas para cima enquanto seus pés mal encostam no chão, a dor em seus braços por sustentar todo seu peso deve estar insuportável, maravilha...
Saio de traz do seu corpo e entro no seu campo de visão, se seus gritos já estavam horríveis, depois de ver essa mascara novamente, eles pioraram. Aproximo uma mão do seu rosto e afasto uma mecha de seu cabelo liso que grudara na sua pele por causa do suor, gosto do silêncio, do suspense, como ficam apavorados esperando o que vai acontecer.
— Por favor! Eu faço o que você quiser... não me machuque, não me mat...
— O que eu quiser? – pergunto aguçando sua tentativa.
— Si... sim! Posso ser sua... me diga o que devo fazer! Eu faço!
Solto a gargalhada mais profunda e sincera que não dei a tempos, tudo ficou tão cinza depois que ela me deixou, tudo ficou tão mais macabro e quebrado do que já era...
— Suja! Eu jamais encostaria um dedo em você, que vergonha Morgana...
— Tenha piedade, por... por favor
— Piedade? Hummm... Quando você assumir o que fez para estar aqui, eu digo se terei piedade ou não.
— Mas... eu não fiz nada, eu não sei! – Seus olhos ferviam de tanto chorar, sua pele clara já estava com marcas vermelhas das queimaduras que lhe dei, seu corpo magro já não aguentaria por muito tempo.
— Já estamos aqui.... a o que? 28 horas? Já estou sem paciência, então vou te ajudar. – Tiro um canivete do bolso e seus olhos desesperados se fixam nele. Seguro seus cabelos e aproximo a ponta da faca para um de seus olhos. Seus gritos se intensificam e grito em resposta:
— Diga! Assuma o que fez! – Morgana apenas se debate e profere mais gritos e berros. Bufo em resposta e invisto. O canivete desliza facilmente por seu globo ocular, tiro e perfuro novamente, seus berros dão lugar ao silêncio, desmaiou.
— Fraca... nojenta! – cuspo em sua direção e vou tomar um café, nada tira o meu tédio, tudo está tedioso sem aqueles olhos de jabuticaba aqui.
☆ Está gostando? Deixe uma estrelinha! Grata pela ajuda. ☆
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Pior de Mim
Lãng mạn⸸Em uma cidade esquecida na Itália, Lilith vive sua vida no campo sem muitos devaneios. Com apenas um amigo fiel e um padrasto superprotetor, Lilith Bianchi oscila entre a excitação e o tédio, a rotina e o inesperado, já que nunca experimentou plena...