Capítulo 74 - Xadrez Atômico (parte 2)

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Fogo sempre foi o combustível que mantinha Dante alimentado. Ele não gostava das coisas calmas e passivas, para que chamassem a sua atenção precisavam ser intensas e calorosas. Seriam ainda melhores se pudessem queimar.

E Ian era uma chama acesa.

Ian estava constantemente queimando como se fizesse parte do Rio Flegetonte, não aquele que pertencia ao seu Inferno, mas ao rio de fogo com chamas eternas da Mitologia Grega. Mesmo em momentos de crise, onde a reação esperada era o recuo ou a fuga, Ian inflamava e alardeava tudo ao seu redor. Essa era a sua verdadeira natureza.

Mesmo sabendo disso, Dante não esperava a exposição em uma festa tão importante. Inicialmente ficou possesso de raiva, aquele ato lhe custaria muito caro, não só em dinheiro, lhe custaria algo muito mais valioso, a sua reputação e o seu orgulho.

Foram muitos anos construindo o seu patrimônio, porém, levou o dobro para construir a sua imagem. Dante vinha de uma família humilde e não demorou para entender que não bastava ter dinheiro para que os magnatas lhe respeitassem. Precisava de postura, não necessariamente de elegância. Era algo diferente. Precisava convergir da mesma forma que eles e só então seria visto como parte da elite.

Não queria ser conhecido como um criminoso, queria ser glorificado como um Deus! Afinal ele era um homem perfeito e merecia tudo, principalmente a devoção. Foi através da perda da família e do seu discurso em cima do luto que galgou lentamente até o topo. O homem solitário, que tinha perdido a mãe e o irmão em uma tragédia e simpatizou com o culpado, pois ele fez tudo em nome da moral e dos bons costumes.

Perdoou o homem que lhe tirara tudo, sua família, sua casa e todos os seus pertences. Não foi fácil encará-lo, afinal, foi o seu irmão que tinha corrompido o filho dele. Sentia-se igualmente culpado, pois mesmo com a sua indulgência, o culpado não aguentou o peso das próprias ações e tirou a própria vida.

Assim nasceu o seu discurso! "Protejam a sua família, pois as consequências de não o fazer podiam ser inimagináveis." E juntamente com o ódio velado, Dante vinculou a sua generosidade.

Montou um hospital especializado em queimados, onde além do tratamento os pacientes mais graves ainda recebiam suporte através de uma ONG. Sua instituição de caridade ajudava a restabelecer a autoestima dessas pessoas, auxiliando também com moradia provisória para aqueles que perderam seus lares, bolsas de estudos para jovens em período escolar e conduzindo ao mercado de trabalho aqueles que tiveram alguma sequela motora. Por isso, mesmo aqueles que discordavam do seu jeito tradicionalista, não podiam condená-lo plenamente.

Claro que era uma grande fachada para lavagem de dinheiro. Dante fazia o bem para aquelas pessoas na mesma proporção em que enchia os próprios bolsos. Mas graças a estrutura bem elaborada que criara no Inferno, onde todos os órgãos públicos e privados importantes na região estavam de alguma forma sob o seu poder, a sociedade nunca desconfiou de nada.

Sua ascensão era sua única prioridade.

Mesmo com a revelação de Ian, aqueles magnatas ainda permaneceriam insipientes. Dante não sairia inócuo das revelações feitas naquela noite, mas ainda poderia manipular a situação a seu favor. Com uma ameaça aqui e outra chantagem ali, faria que aceitassem Ian como seu marido e poderia desfilar com ele em plena luz do sol sem escondê-lo sob as vestes de Ivy.

Não precisaria mais fugir do seu desejo, não precisaria mais negar o quanto queria aquele coelhinho em sua vida. Visto que ele era perfeito! Assim como ele!

Apenas o seu par ideal seria capaz de enfrentá-lo como Ian fez. Sem armas, sem dinheiro e sem poder. Apenas com as mãos nuas, um sorriso sarcástico e palavras bem calculadas, o coelhinho foi capaz de dar um golpe certeiro e eficaz. Coisa que nem o Paraíso tinha sido capaz de fazer. Não sabia se tinha algum dedo de Mike nisso, só sabia que estava extremamente satisfeito.

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