CAPÍTULO 74

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A primeira coisa que notei ali dentro foram os sapatos, depois a tiara e a caixa de joias e, por último, o vestido. Todas as peças que deveriam ter ido pelos ares junto com o departamento de polícia de Londres. Todas as peças que um dia foram da minha mãe. Dei três passos para trás, tropeçando e caindo sentada na cama. Eu achei que aquele jogo tinha acabado quando eu comecei a me afogar no fundo daquele mar, mas parece que ele só estava começando.

Olhei mais uma vez na direção do bilhete, que agora se encontrava ao lado da caixa com o pequeno anel nos pés da cama, sem precisar lê-lo para me lembrar das palavras: "Espero que esteja devidamente vestida para o nosso encontro."

Voltei o meu olhar para o closet com todas as peças que um dia levaram minha mãe para o altar e respirei fundo fechando os olhos por um segundo.

Eu sabia o que eu precisava fazer. Sabia qual era o jogo que ele queria jogar. Eu só tinha que decidir se queria ser um peão ou uma rainha no tabuleiro de xadrez...

Eu sabia que a porta de saída daquele quarto não seria aberta a menos que eu jogasse o jogo dele, então comecei a me despir. Primeiro a blusa, depois a calça. Olhei para o closet mais uma vez e peguei a caixa de joias. Parei por um instante na frente do espelho e observei espantada o corpo que costumava ser meu e agora não passava de um monte de pele e ossos, cheio de cicatrizes. Cicatrizes essas que me pareciam curadas há muito.

Olhei para o corte no braço, aquele último, que tinha sido feito pela bala que tinha me acertado de raspão enquanto fugíamos do FBI, e encontrei uma cicatriz seca e pequenas marcas de pontos aos lados. Aquele ferimento tinha sido limpo, costurado e curado. Curado!

Quanto tempo fazia desde o acidente de carro? Há quanto tempo esse homem estava me mantendo aqui? Mais uma vez, eu me encontrava com inúmeras perguntas e ninguém para respondê-las.

Virei minha atenção para a caixa de joias outra vez e comecei a me montar. Primeiro o colar e os brincos, depois a tiara no cabelo e os sapatos. Coloquei o vestido por baixo me atrapalhando um pouco com o fecho e por último o anel de noivado que ainda me aguardava no mesmo lugar. Não me admirei no espelho nem mesmo por um segundo. Aquele cenário já era doentio demais para que eu me desse ao luxo de tentar apreciar a minha imagem vestida de noiva.

Ouvi um clique vindo da porta no instante em que terminei de me vestir. Não precisava checar para saber que a porta tinha sido destrancada. Eu tinha certeza de que ele me observava de onde quer que ele estivesse.

Caminhei sorrateiramente na direção da saia deixando o farfalhar do vestido me acompanhar. Virei à direita assim que sai, descendo as escadas direto para o lugar que um dia foi a nossa sala de jantar. Eu sabia exatamente onde ele estaria, no jardim dos fundos, perto do lago, o cenário perfeito para uma cerimonia linda.

Então eu caminhei em sua direção. Caminhei para o meu destino, seja lá qual fosse. Caminhei para o altar que eu sabia que estaria montado do lado de fora com ele me esperando. O homem que eu passei a temer e odiar tão profundamente. O homem que me torturou e me machucou das formas mais sádicas. O homem que levou meus amigos a morte. O homem que eu achei ter sido uma mera alucinação. O homem que eu jamais achei que veria novamente.

Meu assassino.


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