Insano

CAPÍTULO 82

Acho que no fim, essa história de que um filme da sua vida passa diante dos seus olhos quando você está prestes a morrer não passa de lorota. Eu não vi nada além da escuridão, mas eu ouvi. Sons familiares. Vozes familiares. Eu também sentir. Senti a dor, senti o arder e senti a pressão. E então, quando eu achei que a calmaria me atingiria de vez, o que recebi foi mais caos...

A primeira coisa que eu vi depois que Francis aceitou a minha barganha foi meu pai tentando se soltar das algemas a todo custo, seguido por Andy que fazia o sangue dos seus dedos escaparem com ainda mais facilidade enquanto forçava as mãos contra as algemas.

Jackson tentava reagir a todo custo. Forçava e forçava tentando manter a cabeça em pé. Andy mordia e grunhia contra a mordaça com cada vez mais força e eu podia juras que uma mancha de sangue começava a aparecer no pano dentro da sua boca. Fechei os olhos por fim.

Nada me garantia que Francis ia, de fato, aceitar aquilo. Nada me garantia que ele iria deixá-los vivos depois de me matar, mas eu tinha que tentar. Aquela era a última alternativa que eu tinha. Que nós tínhamos.

Comecei a me concentrar nos sons ao meu redor. Primeiro veio o clique da arma sendo engatilhada. Depois veio o ruido dos gritos abafados atras de nós. Por fim um assovio longo e agudo vindo ao longe. O assovio se repetiu três vezes antes do barulho do tiro sair da arma por fim. Então veio a voz, uma voz que eu conhecia ao fundo gritando "agora". Depois veio a dor. E por fim a queimação no braço.

No braço.

Não no coração.

Cai no chão por fim abrindo os olhos com o impacto. Como era possível que eu ainda estivesse viva?

Tudo aconteceu muito rápido a seguir, mas a sensação que eu tinha era de que tudo estava em câmera lenta. Primeiro eu vi Francis no chão segurando o ombro com uma mão e levantando a outra enquanto disparava tiros. Me encolhi no chão por um momento enquanto o barulho de troca de tiros aumentava, mas não me atrevi a fechar os olhos, se aquilo fosse um sonho, eu não queria acabasse, pois o que eu via era o FBI invadindo a casa e atirando contra Francis.

Rolei para o lado saindo do altar as pressas e indo em direção a Jackson, eu sabia que se ele ainda estivesse vivo era questões de segundos até que não estivesse mais. Mas Francis viu o que eu estava panejando e mirou na minha direção enquanto se escondia dos tiros dos policiais atrás do altar.

Tentei não olhar em sua direção enquanto abria a pequena caixa que estava sobre a mesa na frente de Jackson rezando para que nenhum tiro me acertasse. Dentro da caixa tinha uma pequena seringa, eu só podia esperar que aquilo fosse adrenalina ou qualquer outra coisa capaz de salvar Jackson de uma overdose. Tudo que eu sabia a respeito do líquido ali dentro era o que Francis tinha dito, que aquilo podia salvá-lo. Só mês restava confiar nas palavras de um assassino.

Tirei a seringa da pequena caixa e coloquei no braço de Jackson rezando para que não o matasse. Um. Dois. Três segundo e Jackson levantou a cabeça respirando fundo. Pude ver o quanto as suas pupilas estavam dilatadas, mas ele estava vivo.

Mais barulhos de tiros vinham em minha direção atras de mim e eu me encolhi, protegendo a cabeça com os braços enquanto tentava ir na direção de Andy, que olhava direto para meu pai.

Os tiros cessaram, por fim. Jackson respirava pesadamente e Andy passava os olhos na direção do meu pai para mim. Me virei a tempo de ver três agente do FBI segurando Francis. Eles tiraram a arma de sua mão o algemara. Um dos agentes chegou mais perto e deu um soco na cara dele antes de se virar para nós e um pude sentir uma parte do meu coração se esquentar quando vi que conhecia aquele rosto.

Era Sam.

Mas antes que eu pudesse sentir qualquer alívio em meu coração eu vi o sorriso no rosto de Francis. Não era um sorriso de quem tinha sido derrotado, não era o sorriso de quem tinha perdido. O sorriso em seu rosto era um sorriso de vitória e então eu entendi por que nenhum dos seus tiros tinha me acertado, porque não era em mim que ele mirava.

Era no meu pai.

Virei o rosto rapidamente olhando em sua direção me deparando com a cena que jamais saiu da minha mente.

Meu pai tinha sido baleado no pescoço e o sangue jorrava sem parar. Corri em sua direção e comecei a fazer pressão no seu ferimento enquanto gritava por socorro. Alguns agentes do FBI vieram na nossa direção com ferramentas nas mãos, soltando as algemas e deitando meu pai no chão. Eu continuava fazendo pressão enquanto ele se engasgava no próprio sangue tentando falar.

Pude ver ao fundo que mais e mais agentes chegavam e iam na direção de Andy e Jackson, soltando cada um deles e os deitando no chão enquanto a equipe médica chegava.

Olhei para meu pai mais uma vez, bem a tempo de ve-o tentar segurar meu rosto, ele não tinha forças para levantar os braços.

Me abaixei ainda mais, segurando uma de suas mãos em meu rosto enquanto as lágrimas rolavam e eu fazia pressão em seu pescoço com a outra mão. Eu sabia que seu fim era inevitável e sabia que não estava longe.

-Você precisa... preci... – Ele tentava falar, mas o sangue que escorria por sua boca e pescoço tornava ainda mais difícil – Precisa saber...

-Seja o que for, isso pode esperar! – Eu dizia desesperada – Agora precisamos achar ajuda para você... – Eu gritava por ajuda para ninguém em específico enquanto as lagrimas em meus olhos ficavam cada vez mais grossas em pesadas me impedindo de enxergar qualquer coisa.

Meu pai fez uma pequena pressão com a mão em meu rosto e eu fechei os olhos com força permitindo que as lagrimas rolassem

-Nós te amamos desde o momento que colocamos os olhos em você, Mel! – Ele disse por fim – Nós te amamos do início ao fim! Foi real... – Ele se engasgou mais uma vez enquanto fechava os olhos aos poucos – Cada gota do nosso amor foi real!

E assim, ele se foi.

Deixei que o choro pesado escapasse de minha garganta por fim. Eu gritei e chorei e fiquei de joelhos até ser levada por algum paramédico. Não sei ao certo quanto tempo tinha se passado, mas o sangue, antes quente e úmido do meu pai em minhas mãos, agora estava gélido e seco.

Francis tinha sido levado pelo FBI. Tinha acabado. Aquele pesadelo tinha acabado. Tanta dor e sofrimento e morte, tinham acabado.

Inúmeras sequelas e traumas iam perdurar pelo resto da vida, sim! Mas aquele pesadelo tinha, finalmente, chegado ao fim.