Capítulo 2

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CAPÍTULO 2

Acordei com a luz do dia penetrando pela janela com o banheiro tomado pelo branco do vapor. Abri a saída de água da banheira para deixar correr toda a água que caíra enquanto eu dormia e deixei encher novamente. Após fechar o chuveiro eu abri uma pequena fresta na porta para não tomar um golpe gelado de ar e não ficar sufocada com o vapor. Aproveitei a água quente na banheira e tomei um banho. Me arrepiei quando minha pele entrou em contato com a água. Pude sentir meus músculos relaxando e o formigamento do frio finalmente passando e sendo substituído por mais dor.

Não queria pensar na noite passada. Parecia um pesadelo sem fim. Apesar de me lembrar perfeitamente de tudo que aconteceu depois que acordei no meio da rua, tudo antes disso era um completo borrão. Não tenho ideia de como fui parar lá. Quem era aquele homem? Será que eu realmente tinha visto ele ou era alucinação minha? Minha mente rodava em meio a tantas perguntas sem respostas, mais uma vez... Afundei minha cabeça na água e me permiti relaxar por uns segundos até que me faltasse ar. Lavei meu cabelo e terminei o banho. Quando sai do banheiro enrolada na toalha em direção ao quarto já eram onze horas da manhã. Meus músculos ainda doíam. Fui para o closet e não demorei muito escolhendo uma roupa, peguei o primeiro conjunto de moletom que vi sentindo o macio quentinho na minha pele.

Antes de me vestir parei na frente do espelho para analisar o estrago que o frio tinha causado. Meus pés estavam rachados por causa do frio. Minhas mãos estavam queimadas assim como meu rosto. Minha pele estava vermelha e seca, dava para ver claramente as queimaduras de frio. Minha boca estava toda cortada e com pequenas peles soltas. Olhei meu corpo por completo. Meus joelhos estavam ralados e tinha um enorme roxo nas minhas costelas do lado direito do corpo. Eu não tinha me dado conta do quanto estava doendo até ver. Obviamente, eu estava sentindo tanta dor em todo meu corpo que nem imaginava o quanto estava machucada. MAS QUE CARALHO! Como foi que isso aconteceu? Aliás, como foi que tudo isso aconteceu? Parecia que eu tinha levado uma surra. Eu nem sei se isso era uma possibilidade!

Eu precisava me lembrar do que tinha acontecido no dia anterior! Precisava refazer meus passos.

Sai do closet depois de me vestir e fui em direção ao meu escritório, que ficava ao lado da sala no meu apartamento. Me sentei de frente para minha mesa, peguei papel e caneta e comecei a escrever:

oAcordei por volta das oito da manhã

oTomei meu café da manhã antes das nove

oTomei banho após o café da manhã

oSai de casa para atender o primeiro cliente do dia na cafeteria de sempre por volta de dez da manhã – cliente antigo

oO atendimento durou cerca de uma hora

oAlmocei na cafeteria

oAtendi o segundo cliente do dia por volta de uma da tarde - cliente novo

oEle me deu um chocolate de presente após o atendimento

oSai da cafeteria por volta de duas da tarde

oYoga no parque central às três da tarde

oVoltei para casa às cinco

oTomei banho e jantei antes das seis da tarde

oFui assistir um filme no sofá da sala...

Era isso. Eu não me lembrava de absolutamente nada após meu jantar. Não consigo lembrar o que jantei. Não sei qual era o filme. O que eu vesti após o banho? Todas minhas lembranças após meu segundo atendimento começaram a ficar um pouco embaralhadas a cada vez que eu me forçava a lembrar o meu dia.

Eu precisava parar. Precisava desligar minha mente e relaxar. Mas também precisava comer. Só após fazer a lista eu me dei conta de que fazia quase 15 horas que eu não comia nada, e eu simplesmente não sentia fome.

Guardei o papel e a caneta no bolso do moletom, para caso de eu lembrasse de algo eu anotar antes de ter a chance de esquecer, e fui em direção a cozinha para preparar algo para comer. Tinham algumas refeições congeladas no freezer eu só precisava colocar no micro-ondas e comer. Peguei a primeira refeição que vi e descongelei, sentei na bancada da cozinha para comer assim que ficou pronto. Me forcei a dar algumas garfadas, mas a comida não descia. Quanto mais eu forçava mais enjoada eu ficava. Recostei na cadeira e fitei o teto. Quanto tempo será que um corpo sobrevive sem comida? Eu não sabia, mas eu sabia que não conseguia ficar muito tempo sem água... Me levantei da cadeira indo em direção ao filtro sentindo todas as partes do meu corpo doer. Peguei o copo e ao lado dele achei a barra de chocolate que tinha ganhado no dia anterior. Estava aberta, o que significava que em algum momento do dia de ontem eu comi aquele chocolate, mas eu não lembrava quando. Peguei o papel e a caneta e coloquei no fim da lista:

CHOCOLATE*

Qual era mesmo o nome do cliente que tinha me dado o chocolate? Qual era o caso dele? Como ele me conheceu? Quem indicou meus serviços para ele? Eu sabia que tinha feito essas perguntas a ele pois faziam parte do meu protocolo de atendimento. Eu só tinha que olhar na pasta de atendimento que estava no meu escritório. Ou deveria estar...

Fui em direção ao escritório para pegar a pasta dos atendimentos de ontem. Olhei na minha bolsa, mas não estava lá. Olhei na pasta de documentos, nada. Olhei no armário onde arquivava todos os meus processos, não estava lá. Olhei em todas as gavetas da minha mesa, NADA!

-MAS QUE MERDA! – gritei para ninguém.

Pensei em procurar no meu quarto, mas quando sai do escritório me senti tonta, meu corpo estava desistindo de mim...

Fui para cozinha, peguei um copo grande de água e recostei no sofá. O plano era beber a água aos poucos para não vomitar, mas em menos de cinco minutos eu já tinha pegado no sono.

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