O punhal de dor

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A tempestade ficava cada vez mais forte e os trovões ecoavam no céu nublado. Anahí agarrou Alfonso e o levou para debaixo de uma espécie de coreto abandonado onde pudessem se proteger. Ele não demonstrou a surpresa de existir um lugar assim no meio daquele bosque assustador. Mas vindo dela, ela sabia que a mulher devia conhecer tudo ali muito bem.

Os dois permaneceram em silêncio a maior parte do tempo, ainda inertes em seus devaneios.

Ela não conseguia encara-lo nem por um segundo sequer.

Recostando-se em uma das colunas, a vampira cruzou os braços, confusa com tudo que havia ocorrido. Ela apertou os olhos assim que sentiu a respiração dele próximo ao seu corpo.

As mãos de Alfonso foram para os ombros dela, retomando o contato.

Anahí: Não devia ter se arriscado... - articulou ainda de costas.

Alfonso: Não me importo. Eu sabia que não me faria mal algum.

Anahí: Sim, eu podia fazer. Não deve confiar em mim, Alfonso. Nem eu mesma confio - aquelas palavras a fizeram baixar a vista. Derrotada.

As mãos dele apanharam seu queixo, fazendo os olhares se cruzarem.

A íris em tom de rubi já não permanecia mais ali, e sim, o azul berrante e comovente que ele estava acostumado a apreciar.

Alfonso: Eu não sei explicar o porquê, mas desde a primeira vez em que te vi não consegui esquecer seus olhos, e nem você – explicou afetuoso.

Anahí: Mas deve esquecer – rebateu afastando as mãos dele com amargura - Eu posso te matar.

Alfonso: Não vou esquecer - voltando a segurar o rosto dela, mas agora com as duas mãos, ele a fitou confiante - Eu sei que não vai me matar e sei também que sente alguma coisa por mim... Posso ver nos seus olhos.

Anahí não sabia o que dizer. "Como negar o óbvio?" Ela se abominava por sentir vontade de tomar aquele sangue, o sangue do homem que ela queria ter por perto.

Seus olhos se cerraram pelo medo que sentiu.

Alfonso tocou os lábios lentamente sobre a testa fria de Anahí, pensando no quanto ela precisava ser cuidada. Aquela mulher letal parecia tão assombrada e oprimida. Distante do que ele mesmo temia.

Eu sei que precisa de mim.

Os beijos delicados dele desceram por aquele rosto hesitante, fazendo lágrimas desabarem dos seus olhos azuis como se cada uma fosse um punhal a penetrar seu peito. Ele foi em direção à boca dela, quando novamente a fez sua.

Alfonso mordeu suavemente a parte inferior dos lábios macios de Anahí, o que estimulou seus nervos, provocando-lhe arrepios por toda parte. Ela gemeu, abrindo sua boca para corresponder.

Os dois pareciam ter uma dependência inexplicável. Seus corpos úmidos grudavam com os movimentos, enquanto a língua de Anahí o penetrava discretamente, cheia de vontade.

A coluna agora apoiava os dois que já tinham esquecido a tempestade. Anahí estava empolgada com o beijo, e com o desejo mútuo, mas foi então que ela sentiu suas presas surgirem, e isso a fez recuar rápida, com as mãos na boca.

Ele a observou sem entender, até interpretar o que os olhos dela transmitiam.

Estavam vermelhos outra vez.

Anahí: Você percebe o risco que está correndo? É melhor irmos embora.

Alfonso: Eu posso tentar te ajudar... A controlar... - ela riu falso com o canto da boca, descrente de tal inocência.

Anahí: Me ajudar? Você seria a última pessoa que poderia conseguir me ajudar.

Alfonso: Porque não tentamos, se der errado eu te deixo em paz.

Anahí: Eu já disse que não. Não insista.

Alfonso: Então me explica porque não quer dar uma chance a você mesma? - Anahí já alterada e bufante, disse em voz alta, o que pareceu deixar Alfonso sem falas.

Anahí: Será que não enxerga a vontade que eu sinto de te matar toda vez que está próximo de mim?! Eu não consigo controlar a vontade de sugar até a última gota de você. Não consigo!

Ela estava sem forças para discutir a sua condição. Anahí não conseguiu esconder as lágrimas esgotadas. Alfonso a fitava firmemente, buscando descobrir uma resposta nos seus olhos, ou nos seus lábios.

Alfonso: Então porque não me matou? Eu estou bem aqui. Vulnerável e exposto a você - ele falava sério, sem expressão de receio ou covardia.

Anahí: Eu não quero te machucar, é por isso. Não imagina como é difícil controlar... Eu sinto muito, Alfonso, mas não podemos. Isso seria muito perigoso.

Alfonso: Eu quero correr esse risco! - persistiu reaproximando-se dela, mas a vampira recuou.

Anahí: Mas eu não estou disposta a correr. Por favor, entenda – decidida a encerrar a conversa, ela se virou e novamente o deixou sozinho.

Alfonso nem sequer conseguiu ver o momento em que ela sumiu no meio da noite, entre as árvores e o campo.

Anahí era veloz, quase invisível quando queria.

Andando desinquieto, ele esmurrou a coluna que antes segurava os dois, inconformado com a rejeição. Sentia raiva de si mesmo.

Como pôde se apaixonar por uma vampira... "e vampiros... existem?" Tinha sido informação demais para um dia só.

Ele começou a pensar no que faria com o que acabara de saber, mas uma coisa era certa. Não ia dizer nada a ninguém... Não podia dizer.

****

Anahí chegou em casa, nervosa, se trancando no quarto. Mal terminou de fechar a porta quando se jogou na cama. "Como isso pôde acontecer". Ela não sabia o que fazer. Para os humanos, se apaixonar era simples, mas os mesmos sentimentos e moções nela eram ampliados dez vezes ou mais.

O vampirismo tinha seus vários prós e contras. E isso, não era nada bom no momento.


Supernatural Love (Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora