Já era bem tarde. A noite avançava, e as primeiras horas da madrugada do domingo revelavam toda a tranquilidade no centro cidade. Estava sentada numa cadeira grande e acolchoada, quase como uma poltrona, na varanda do apartamento de Leona.
Já tinha me desfeito do vestido e dos sapatos da festa. Usava, naquele momento, um roupão de banho para proteger-me da brisa da madrugada. Recostei a minha cabeça no espaldar fofo do assento.
Em uma de minhas mãos, havia uma grande caneca de café com leite e canela. De vez em quando, levava o líquido cremoso aos lábios, enquanto observava o horizonte urbano. Sempre gostei de refletir encarando o infinito. Olhar para algo longínquo ajuda-me a acalmar os pensamentos, possibilitando-me arrumar as minhas ideias.
Obviamente, a minha aventura na festa de aniversário de Maria Cecília não foi totalmente planejada. Jamais poderia ter imaginado, por exemplo, que Henrique estaria arrumando mais uma transa para a noite com uma garota. De qualquer modo, algo assim não era tão improvável.
Por outro lado, não poderia ter previsto a irmã cheia de ciúmes e birra que o rapaz possuía, e como isso poderia me ser útil.
Apesar de sempre tentar me antecipar, conto também com o improviso. E foi todo o meu jogo de cintura que me fez seduzir Henrique e usar a sua irmã para empatar a consumação da nossa transa.
Provoquei aquele cara da maneira certa, agora. Afinal, quem o privou da minha virgindade, dessa vez, não fora eu, sim a garota de voz fina e anasalada.
Sorri com o canto da boca ao lembrar-me da única real surpresa da noite. Fernão Alencar, o governador do estado. Claro, era o aniversário da filha dele, obviamente estaria ali. Não poderia ter previsto, porém, que nossos olhares tivessem aquele magnetismo.
Um bipe de meu celular tirou-me da mente a imagem daqueles olhos vívidos do governador do estado. Ergui o meu aparelho na altura de minha visão. Era uma mensagem de Henrique, falando que no próximo final de semana ele queria me levar para o sítio da sua família, porém dessa vez faria tudo certo.
Ainda olhando fixamente para a mensagem, sorvi mais um gole de meu café cremoso com canela. Deixei que o líquido quente descesse por minha garganta e exalasse seu calor para o meu peito. Com uma mão, digitei a resposta, confirmando que sairia com ele.
Pelo visto, ao me levar de novo para aquele lugar tão afastado, ele queria ter certeza de que eu não teria escapatória. Realmente, após incitá-lo tanto, não havia mais com o quê barganhar. Também, o rapaz de certo iria me descartar após obter o seu troféu tão cobiçado.
Dei um longo suspiro enquanto tomava mais outro gole de café. O aroma da canela acalentava minhas narinas, enquanto meus olhos estendiam-se para o horizonte. Avistava ao longe a constelação urbana de luzes perdidas entre a escuridão de concreto, com uma profusão de prédios entre os rios, pontes e beira-mar.
Imaginava quantas histórias, quantas pessoas, quantos amores e ódios deveriam transitar no meio daquelas estrelas metropolitanas. E eu, apenas mais uma, prosseguindo com minha jornada tão jovem. Sim, meu destino poderia ser tão incerto quanto os demais, contudo não estaria disposta a aceita-lo passivamente.
Minhas atitudes dos próximos dias seriam decisivas para continuar meu caminho. Não haveria espaço para dúvidas ou medos. Era apenas tempo de agir.
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Cobiça
Bí ẩn / Giật gânUma vilã como protagonista. Jovem, bonita e de origem humilde, Pilar é a típica garota do interior que almeja tentar a vida na capital. Debaixo dessa máscara de moça sonhadora, porém, esconde-se uma psicopata totalmente desprovida de moral ou culpa...