Capítulo 41

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Erguemo-nos no chuveiro, Henrique e eu, enquanto a água escorria por nossos corpos. Após fechar a corrente, peguei uma toalha, enxugando-o. Logo em seguida, ele também pegou uma, fazendo o mesmo com meu corpo.

Enrolados, fomos até o meu quarto. Lá, emprestei-lhe um roupão de banho bem felpudo. Por mais que ficasse apertado e engraçado por conta do tamanho daquele rapaz, era a única vestimenta que eu tinha para oferecer-lhe.

Também vesti um roupão. Quando olhei para trás, Henrique estava já sentado em minha cama. Cabeça baixa. Mãos entre os joelhos. Não chorava mais, porém o seu olhar estava perdido, e a boca entreaberta.

Fiquei na frente dele. Ele não subiu o olhar.

– Você quer alguma coisa? – questionei.

– Você tem café?

– Só solúvel.

– Odeio café solúvel – suspirou. – Vou querer sem açúcar.

Pouco tempo depois, estava sentada ao seu lado, na beirada de minha cama. Cada um de nós com uma caneca de café. Ele levou o recipiente à boca, bebendo um gole. Fechou os olhos, provavelmente deixando o calor da bebida lhe aquecer o espírito. Respirou fundo, e eu pude ouvir o tremor em sua garganta.

Estávamos olhando para a frente, para o televisor desligado. No meu quarto, havia apenas um abajur ligado na cabeceira da cama. A luz era jogada em nossas costas, projetando nossas sombras e silhuetas escuras na tela da TV.

– Ele quase me matou – disse Henrique, rompendo o silêncio. – Ele me viu chegar em casa, deu um murro, me jogou no chão, me chutou na barriga.

Sua voz falhou. Podia ser pela dor. Física e emocional. Henrique decidiu conter, por hora, as suas emoções, e prosseguiu:

– Ele falou coisas pra mim. Disse que eu mataria a minha mãe, que eu iria acabar com a carreira dele, que ele não vai conseguir ser senador enquanto tiver um filho como eu. – Fechou os olhos, como estivesse revendo a cena. – Cecília tentou segurar Fernão. Aquele filho da puta empurrou a menina. Ela caiu no chão e quase não conseguiu se levantar.

Abriu os olhos, encarando-me antes de continuar.

– Ele me levou pra fora, esfregou minha cara na terra. Disse que se minha mãe morrer vão ser dois caixões. O meu e o dela.

O rapaz calou-se, encarando-me. Estranhamente, a tristeza dele começava a diminuir. Na verdade, esse sentimento estava se esvaindo daquele rapaz desde que havíamos saído de debaixo do chuveiro.

De fato, Henrique estava até calmo demais para alguém que havia acabado de levar uma surra espetacular. Com uma voz mansa, ele me disse:

– Eu não quero que minha mãe morra – sua face endureceu um pouco mais –, mas eu quero que Fernão morra. Eu vou matar Fernão e você vai me ajudar.

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