Capítulo 16

2.5K 309 42
                                    

O sol ergueu-se num belo domingo de manhã. Já estava em casa desde a madrugada. Ainda elétrica por tudo o que aconteceu nas últimas horas, não conseguia dormir. Estava sentada na cama, ouvindo os pássaros cantarem nas árvores da minha rua. Em minha mão, uma xícara de café com leite e canela. Na outra, olhava o saldo da minha conta bancária no meu celular.

O garoto e programa não custou muito caro. Claro, tive que pagar um bônus por sua viagem e por aceitar ser filmado, isso depois de ter prometido que não mostraria a face do rapaz.

Não foi muito difícil convence-lo a participar do meu plano, pois sujeitos como ele estão acostumados a serem usados para satisfazer os desejos secretos e sórdidos que muitas pessoas ditas "normais" escondem dos mais próximos. Logo, a situação não lhe assustou.

Também não foi caro subornar o caseiro. Na verdade, esse havia sido o meu menor gasto. Dei-lhe um agradinho, dizendo que um entregador traria uma encomenda de presente para Henrique. Pedi ao homem que não dissesse nada ao patrão e deixasse o moreno entrar na casa.

O caseiro concordou, todavia estava visível em sua face a decepção por ver uma moça tão bonita e pura com eu rastejar mais vez para tentar agradar um rapaz mimado como Henrique. Se o empregado soubesse a verdade de minhas intenções, provavelmente faria esse favor para mim de graça.

Havia ainda a passagem de ônibus intermunicipal para que o garoto de programa chegasse em Gravatá, assim como o táxi da rodoviária até o sítio da família Alencar. Esse mesmo táxi nos esperou para voltarmos a Recife.

Somando todos esses gastos, eu havia dispendido uma quantia suficiente para pagar todas as minhas despesas de um mês inteiro.

É, o dinheiro da casa da minha mãe não duraria muito. Felizmente, o que eu fiz não foi de fato um gasto, sim um investimento. Se tudo desse certo, preocupações como contas de água, luz e supermercado em breve desapareceriam da minha vida.

Faltava, no entanto, um último passo. Esse, exigia um pouco mais de cuidado. Esperei até as onze horas da manhã, horário que o centro de compras da cidade estaria aberto em dia de domingo.

Em algum prédio comercial daquela área, encontraria algum estabelecimento com acesso à internet, como uma lan house.

No horário certo, preparei-me. Vesti um short de corrida de Leona e uma camisa de manga longa preta. Escondi o meu cabelo com um boné e coloquei uns óculos escuros. No meu braço, coloquei uma braçadeira com o celular.

Saí de casa como se fosse fazer uma corrida, exercitando-me. Não estava preocupada com Henrique, pois certamente ele estaria dormindo ainda com os efeitos da mistura de álcool e os remédios antidepressivos da minha mãe morta. Inclusive, coloquei-o deitado de lado, para evitar que algum vômito o matasse asfixiado. Afinal, eu o queria bem vivo.

Continuei correndo, até chegar ao centro da cidade. Nem todas as casas de comércio estavam abertas. Para a minha felicidade, no entanto, consegui achar uma lan house disponível. Entrei, ainda ofegante pelo exercício, solicitando um computador.

Na semana que havia antecedido o meu último encontro com Henrique, pesquisei muito sobre anonimato na rede digital. Anotei todas as instruções que consegui entender.

Desse modo, descobri que todo computador conectado tem um endereço próprio, chamado de protocolo de internet, ou IP. Logo, se eu tentasse salvar esse vídeo em meu apartamento, poderia ser facilmente rastreada.

Ainda, havia um modo de fazer tudo isso em casa, com uma espécie de conexão oculta. Eu até tinha tentado da primeira vez, porém o site de cadastro de e-mail começou a dar problemas com aquele tipo de conexão.

Como nunca fui uma expert em computação, escolhi optar pela saída mais fácil. Decidi, portanto, usar uma máquina pública, e era esse o motivo do meu disfarce de corredora.

Precisava também salvar esse vídeo num e-mail. Obviamente, não usaria o meu próprio. Havia tentado criar um com dados falsos, alguns dias atrás, porém a página pedia informações pessoais, como um CPF.

Em minhas pesquisas, descobri que outras páginas maliciosas da internet poderiam gerar esse número de identificação a partir de cálculos matemático. Usei essa ferramenta naquela lan house, e também lancei mão de nome e endereços falsos, criando uma conta de e-mail onde salvei o vídeo de Henrique colocando sua bunda para comer um mandiocão.

Felizmente, havia achado um aplicativo para editar vídeos direto do celular que conseguia funcionar em um aparelho mais antigo como o meu. Nesse programa, havia até um recurso para colocar uma carinha sorridente amarela sobre o rosto de Geraldo, o garoto de programa. Guardei mais de uma versão no meu e-mail falso, para diferentes ocasiões.

Mais alguns preparos e estava tudo pronto. Levantei, paguei as duas horas que havia ficado lá e retornei para minha morada.Não sei se era pela corrida, ou por minha vida finalmente começar a andar, comecei a ser tomada por uma grande felicidade. No meio da calçada, abri os braços e sorri, sentindo a brisa bater em minha face.

Estava acontecendo.

CobiçaOnde histórias criam vida. Descubra agora