Capítulo 52

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Num único movimento, coloquei-me entre pai e filho, como o fizera tantas vezes. Ao ver-me, pude jurar que a pupila de Fernão se contraíra. Sem nem sequer piscar uma única vez, o governador tirou o calibre da arma da testa do filho e apontou para mim. Tornei-me seu alvo.

Frente a frente, duas pessoas capazes de tudo, e absolutamente tudo, para vencer. Quase duas forças da natureza, prestes a colidir para formar uma verdadeira catástrofe.

Entredentes, o pai de Henrique me questionou:

- Você... quem é você? Que demônio é você? De qual círculo do inferno você saiu, sua besta-fera maldita? - Escancarou a boca, berrando. - Você me roubou tudo! - Fraquejou a voz, descendo mais o revólver. - Você pegou a minha dignidade, roubou minha esposa, destruiu meu filho, quer pegar o meu dinheiro. Por que você fez tudo isso?

De pronto, não respondi. Sentia não ser o momento exato apropriado. Diante do meu silêncio, o pai de Henrique continuou:

- Por que você fez tudo isso comigo? Logo eu, que te amei tanto... eu te acolhi! Eu te protegi desse desgraçado quando ele quis te bater. O que você ganha destruindo a vida de um homem que te queria tão bem? É só pra fazer o mal pelo mal? É pela merda do dinheiro?

Tentando manter-me o mais calma possível, respondi:

- Não, nessa nossa história não se trata de mal ou bem. E também não, você não me ama. Jamais precisei de proteção, e você jamais quis me proteger. Você só me queria porque eu era namorada de teu filho. Queria mostrar pra Henrique que ele nunca vai poder ter algo bom, porque só você merecia uma moça de família como eu. - Não contive o sorriso. - Você só me via como uma menina do interior, ingênua e carente. E, principalmente, virgem. O alvo perfeito pra você bancar o machão e marcar território com tua rola.

Fernão tornou a erguer o revólver para minha fronte. Não me mexi. Não titubeei. O dedo encostava-se no gatilho, e a arma estava na iminência de disparar. Seu objetivo, contudo, parecia não necessariamente ser nos matar. De fato, naquela conversa, o governador parecia querer alguma coisa, algo para reparar o seu orgulho ferido.

- Então, era por esse motivo que você demorou tanto a dar a bocetinha para mim? - questionou Fernão, rindo. - Achava mesmo que tua virgindade é tão apetitosa ao ponto de eu te dar todo o meu dinheiro?

- Não. Enganar você era só uma forma de arranjar tempo, e planejar a armadilha perfeita. E, pelo visto, consegui.

Ele apertou-me o ombro, forçando-me para baixo. Queria fazer com que eu me ajoelhasse. Enquanto o fazia, Fernão advertia-me:

- Quer um conselho? Não jogue a vitória na cara de um inimigo que te aponta uma arma! - Fernão percebeu que Henrique tentou avançar. - Afasta, Henrique! Afasta ou eu estouro a cabeça dela.

Obedecendo ao pai, o rapaz deu alguns passos para trás. Após conseguir me fazer ajoelhar a sua frente, aquele senhor apontou a arma para o alto de minha cabeça, dizendo:

- Sou mais experiente e competente nesse jogo do que você. Eu sempre venço! Vou conseguir acabar com esse teu plano, e no final vou comemorar metendo muito em você, pra mostrar quem é que manda e qual é o teu lugar.

Respirei fundo, tentando acalmar meu peito pulsando com violência. Não consegui.

- Você realmente acha que, com tudo o que já aconteceu, você ainda tem como vencer? - eu indaguei. - Já consegui derrubar a rainha. Mais uma jogada e vou derrubar o rei.

Súbito movimento, porém intenso em sua execução. Quase não percebi o que havia me atingido. Somente após cair sobre tapete da sala foi que pude compreender. Fernão acertou meu rosto com a lateral da arma.

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