O relógio já marcava quase dez da noite. Aquela, portanto, não era mais hora de uma moça decente estar fora de casa. Resolvi, então, despedir-me de meus sogros. Logo depois, já estávamos, Henrique e eu, no carro do rapaz, dirigindo no bairro planejado da Reserva do Paiva.
Ele, como sempre, prosseguia calado, sem olhar para mim. Estávamos atravessando o pedágio outra vez, quando resolvi quebrar aquele silêncio.
– Obrigada por ter me apresentado pros teus pais. – Novamente, ele permanecia sério. – Só que eu acho que a noite ainda não acabou.
Esperei uns segundos para ver se havia causado alguma curiosidade. Na verdade, eu o senti ligeiramente tenso. Foram ameaças, agressões e chantagens demais entre nós para que qualquer proposta minha soasse como algo minimamente convidativo.
– Pode relaxar – disse eu –, não vai acontecer nada demais. Eu só queria te levar pra um lugar bem legal pra agradecer.
O rapaz continuava mudo, misto de raiva e total desconfiança. Peguei o meu celular e abri o aplicativo de mapas. Selecionei o endereço previamente guardado e o aparelho começou a ditar as instruções para Henrique do caminho a ser seguido. Voltei-me para o rapaz e pedi:
– Você pode seguir o caminho do meu celular?
Henrique permaneceu quieto, dirigindo e olhando fixo para frente. Dei um suspiro, um pouco impaciente, e falei:
– Não se preocupe, não vai acontecer nada com você. E a gente possui um trato, você se lembra?
Nesse momento, meu namorado por chantagem rompeu o silêncio:
– O acordo era te apresentar pros meus pais como minha namorada. Eu não vou fazer mais nada.
– Sim, você me apresentou pra eles, obrigada. Agora, eu só estou querendo agradecer. Por favor, Henrique, já passamos por isso. Será que eu vou ter que repetir "faça o que estou pedindo, porque eu tenho um vídeo seu sentando na macaxeira"?
Henrique pisou com tudo no acelerado. A fúria tomou o lugar do receio, enquanto o rapaz grunhia para mim:
– Certo! Eu vou pra onde você tá pedindo!
***
O aplicativo de mapas orientou Henrique para um local um pouco mais distante do que o caminho para a minha casa. Aos poucos, a raiva do rapaz voltou a dar lugar à desconfiança.
Quando a voz no aparelho falou "Você chegou ao seu destino", o loiro bronzeado parecia mais confuso ainda. Ele se inclinou um pouco para frente, como se não estivesse acreditando no que estava vendo.
Estávamos na entrada de um motel.
Talvez pela primeira vez naquela noite, Henrique encarou-me diretamente, com a confusão estampada no rosto. Sorri para ele e pedi que solicitasse um quarto para nós. Ainda sem muita reação, ele pediu uma suíte.
O carro estacionou na garagem do apartamento. Meu namorado não desceu logo, sequer havia soltado o cinto de segurança. Estava hesitando, bem tenso.
– Por favor, telefone pra sua mãe e avise que já me deixou em casa, mas que você vai sair pra espairecer um pouco.
Henrique me olhou, confuso. Justifiquei:
– Não quero que a sua mãe pense que vamos dormir juntos e transar.
– Eu nunca aviso quando vou dormir fora de casa.
– Mas também nunca trouxe uma namorada pra casa. Sempre tem a primeira vez pra tudo.
Dessa vez, ele não se opôs muito a um pedido meu, pois era bem simples. Depois disso, descemos do veículo.
Entramos no quarto, e ele era tão amplo e moderno quanto nas fotos. O melhor motel da cidade, como eu havia pesquisado na internet.
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Cobiça
Mystery / ThrillerUma vilã como protagonista. Jovem, bonita e de origem humilde, Pilar é a típica garota do interior que almeja tentar a vida na capital. Debaixo dessa máscara de moça sonhadora, porém, esconde-se uma psicopata totalmente desprovida de moral ou culpa...